Afonso Dhlakama regressa a Maputo
4 de setembro de 2014Afonso Dhlakama aterrou por volta das 18h20 desta quinta-feira (4.09) no Aeroporto Internacional de Maputo, cinco anos após ter abandonado a capital moçambicana, no quadro da crise política e militar que assolou o país durante cerca de um ano e meio.
Acompanhado por alguns quadros do movimento e diplomatas estrangeiros acreditados na capital moçambicana, Dhlakama foi recebido por centenas de militantes do partido que, desde o final da manhã, começaram a afluir ao aeroporto da capital moçambicana, trajando camisolas com uma imagem estampada já antiga de Dhlakama e brandindo bandeiras da RENAMO, gerando um incomum ambiente de festa na infraestrutura aeroportuária.
Além dos membros da RENAMO, dezenas de jornalistas, incluindo alguns estrangeiros, aguardavam a chegada de Afonso Dhlakama, que não respondeu, contudo, a nenhuma pergunta colocada pela comunicação social.
"Hoje é um dia de alegria muito importante e é uma festa à chegada do nosso líder, que tanto tempo esteve no mato a sacrificar-se por nós. Hoje é o nosso dia", disse à agência Lusa António Castigo, um jovem militante da RENAMO.
Promessas antes da partida para a capital
Dhlakama chegou a Maputo após ter presidido a um comício na cidade de Chimoio, capital da província de Manica, centro de Moçambique, de onde embarcou para a capital do país, depois de uma viagem de carro do refúgio onde vivia desde outubro do ano passado, após o seu acampamento em Satunjira, província de Sofala, na região centro, ter sido tomado pelo exército.
No seu reaparecimento público, em Chimoio, Afonso Dhlakama assegurou que a sua ausência, por um ano e meio em parte incerta, serviu para tornar Moçambique mais "pacífico e democrático" e "rejuvenescer o multipartidarismo". O líder da RENAMO garantiu mais uma vez que vai cumprir o acordo de cessar-fogo e prometeu ir às eleições “para lutar contra a má gestão do país".
Dhlakama dispensou o carro protocolar enviado pelo governo para o acompanhar de Satundjira ao aeródromo de Chimoio, optando por uma viatura particular todo-o-terreno. O líder da RENAMO também manteve a sua guarda, fortemente armada, que o escoltou em simultâneo com a força governamental, juntamente com a delegação de embaixadores que negociou a sua viagem a Maputo.
O líder da RENAMO não anunciou se vai fixar residência na capital moçambicana, assegurando apenas que vai escolher uma das três casas disponíveis, sendo uma em Maputo (sul), a segunda em Nampula (norte) e a terceira em Satunjira (Gorongosa, sul), deixando em aberto a possibilidade de regressar às encostas da serra da Gorongosa.
Na capital provincial de Manica, Afonso Dhlakama apanhou uma avioneta da Moçambique Expressos (Mex), operada pela companhia de bandeira nacional, fretada e mantida desde quarta-feira no aeródromo, junto com a sua guarda, a maioria mulheres, e a delegação de embaixadores. Os elementos da sua segurança foram desarmados no aeródromo, e as armas e munições empacotadas em caixas de madeira, seladas pela Polícia moçambicana.
Encontro entre Dhlakama e Guebuza confirmado pelo Governo
A viagem de Afonso Dhlakama a Maputo tem no horizonte um encontro com o Presidente moçambicano, que deverá ter lugar na sexta-feira (5.09), no edifício da Presidência da República. Esta quinta-feira, o porta-voz do Presidente moçambicano confirmou a reunião entre Armando Guebuza e Afonso Dhlakama.
Edson Macuácua, que falava durante uma conferência de imprensa, adiantou que, durante a reunião, o chefe de Estado moçambicano e o líder do principal partido da oposição deverão ratificar o acordo assinado pelas delegações negociais da RENAMO e do Governo moçambicano, com vista à cessação das hostilidades militares, que eclodiram no país há cerca de um ano e meio.
No entanto, cidadãos ouvidos pela DW África consideram que esta tensão militar, que causou vários mortos, feridos e danos materiais avultados, podia ter sido evitada. “As exigências eram legítimas, visto que o Estado está partidarizado. Mas o Governo é o Governo, nem sempre tem de ceder facilmente”, afirma um cidadão moçambicano. Uma outra moçambicana considera que “quando alguém quer paz, vai atrás”. “O nosso Presidente, de acordo com o que disse Dhlakama, queria conversar. Podia ter retirado as Forças Armadas para que ele viesse conversar”, conclui.
Lições para o futuro
Para o analista Egídio Vaz há lições a tirar desta tensão militar. “A guerrilha não tem necessariamente em vista o alcance do poder político, mas sim o objetivo de forçar as negociações”, afirma, acrescentando que “era possível negociar e chegar ao entendimento há dois anos, sem recorrer à via armada”.
Fernando Gonçalves, outro analista, considera que Afonso Dhlakama vai continuar a ter um papel importante no processo politico do país, uma vez que “é o líder do segundo maior partido com representação parlamentar em Moçambique e há um papel histórico que não se pode negar”. “Não podemos descurar o facto de que a paz e a tranquilidade dependem muito da atitude de Dhlakama em relação a tudo isso”, conclui.
Egídio Vaz, por sua vez, pensa que “é importante buscar o papel de Afonso Dhlakama em tempo de paz, para que ele seja útil mas também alargar os mecanismos de diálogo e a busca de consenso”. Na última década, diz o analista, cometeu-se um erro: “o fechamento ao diálogo e a concentração para a construção de uma agenda que não era inclusiva”.
Dlakhama foi o último candidato às presidenciais de 15 de outubro a aparecer publicamente na campanha eleitoral, que entrou no quinto dia esta quinta-feira. O analista Fernando Gonçalves considera, no entanto, que este facto poderá ter um lado positivo, sublinhando “o efeito de Dhlakama surgir neste momento, rompendo com todo o suspense que se tinha gerado no seio dos moçambicanos”.