Abstenções acendem debate nas presidenciais cabo-verdianas
4 de outubro de 2016Depois de Jorge Carlos Fonseca, a abstenção foi a grande vencedora destas eleições presidenciais. Dos mais de 361 mil eleitores, votaram apenas 127.121, números que colocam a abstenção nos 64,3% - a mais alta taxa de todas as eleições democráticas realizadas em Cabo Verde, desde 1991.
Segundo os dados provisórios, quando estavam apuradas 96,6% das 1.265 mesas, houve 1.596 votos brancos e 1.105 votos nulos.
O Presidente Jorge Carlos Fonseca foi reeleito com 74% dos votos, vencendo nos 10 círculos eleitorais no país e nos três na diáspora. O estreante Albertino Graça, reitor da Universidade do Mindelo, foi o segundo candidato mais votado, averbando 28.068 votos (22,5%); e o combatente da liberdade da pátria Joaquim Monteiro ficou na terceira e última posição, com 4.275 votos (3,4%).
Numa primeira reação, o Presidente reeleito, Jorge Carlos Fonseca, afirmou que a elevada taxa de abstenção não tira brilho à sua vitória.
"Nas democracias amadurecidas, altas taxas de participação normalmente só acontecem em períodos de ruptura política. Veja, por exemplo, o que se passa em Portugal e nos Estado Unidos, qual é a percentagem dos americanos que participam na eleição do Presidente. O Presidente americano terá menos legitimidade por causa disso?," ponderou.
Fonseca defendeu ainda que sua vitória respeita as regras e os procedimentos democráticos. "Quem ganhas as eleições é quem tem a maioria de votos validamente expressos nas urnas, e eu tive uma percentagem próxima de 3/4 dos votos expressos nas urnas. Por isso, tenho que estar muito satisfeito e muitoalegre com todas as condições para ser Presidente de todos os cabo-verdianos como fui durante cinco anos," declarou o Presidente reeleito em Cabo Verde.
Abstenção histórica
Já o candidato estreante Albertino Graça entende que a alta taxa de abstenção tira legitimidade a Jorge Carlos Fonseca.
"Nós estamos a falar de menos de 30% dos eleitores deste país. Na minha opinião, com menos de 30% [de afluência] dos eleitores, deveríamos repetir as eleições. Portanto, deverá ser objeto de estudo. Um score muito baixo, inferior a 30%, não confere legitimidade a um Presidente da República. De acordo com a Constituição, o Presidente da República é Presidente de todos os cabo-verdianos. Mais de 70% dos cabo-verdianos não votaram no agora Presidente da República, isto é preocupante," avalia.
Joaquim Jaime Monteiro considera que "quem vai sair a perder é o povo cabo-verdiano".
Em entrevista à Rádio de Cabo Verde, o cientista político cabo-verdiano João Silvestre Alvarenga disse que o fato do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), o principal partido da oposição, não ter apoiando nenhum dos candidatos contribuiu para a elevada abstenção.
"Quando o PAICV deixa de apoiar um candidato e Jorge Carlos Fonseca vai praticamente sozinho para a disputa, o eleitor, de uma forma geral, vai pensar que o candidato incumbente já estaria reeleito e o peso do seu voto pouco iria acrescentar para o resultado eleitoral. Então, ele prefere ficar em casa que se deslocar a uma assembleia de voto e votar," ponderou.
Avaliações do pleito
O chefe da missão de observação eleitoral da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), Thomas Boni Yayi, considera que as eleições foram livres e transparentes, mas aconselhou a adoção de reformas para incentivar maior participação dos cidadãos.
“Com o objetivo de melhorar as eleições futuras, a missão recomenda a adoção de reformas para suscitar uma maior participação dos cidadãos. Isso poderia ser feito com o envolvimento da sociedade civil no processo eleitoral, através de campanhas de sensibilização. Também deve-se considerar a possibilidade de organizar eleições gerais - ou seja, presidenciais, legislativas e municipais - num único dia, para reduzir os custos da organização e provocar maior mobilização. Recomendamos igualmente a introdução do voto electrónico,” disse Boni Yayi.
Também o chefe da missão de observadores da União Africana, o antigo Presidente da Guiné-Bissau, Serifo Nhamadjo, considerou que as eleições foram livres e justas.
"No cômputo geral, as eleições decorreram muito tranquilas. A participação foi um pouco baixa. O processo em si decorreu na normalidade. Não houve nenhuma situação que pudesse indiciar alguma fricção," pontuou Nhamadjo.
A tomada de posse do Presidente eleito deverá acontecer a 20 de outubro próximo, dia em que Jorge Carlos Fonseca completa 66 anos de idade.