Amnistia denuncia ameaças à liberdade em Angola e Moçambique
24 de abril de 2024Um relatório divulgado esta quarta-feira (24.04) pela Aministia Internacional (AI) e o Relatório dos Direitos Humanos elaborado anualmente pelos Estados Unidos da América, afirmam que há várias restrições à liderdade, muitas vezes provocada pela violência policial.
A nível lusófono, Angola, Moçambique e Guiné-Bissau são mencionados não pelos melhores motivos.
Angola com "progresso limitado"
No ano passado, "houve um progresso limitado na situação dos direitos humanos após um ano de turbulência em torno das eleições gerais de 2022", salienta a Amnistia Internacional num relatório divulgado hoje.
A organização não-governamental (ONG) de defesa dos Direitos Humanos destaca, pela negativa, o uso de força excessiva ou desnecessária para travar "o direito de reunião pacífica", que conduziu, na maioria dos casos, a prisões arbitrárias.
"Pelo menos cinco manifestantes e um transeunte foram mortos ilegalmente, incluindo pelo menos duas crianças", lembra a organização, referindo-se aos protestos de mototaxistas que tiveram lugar em junho, no Huambo, devido à subida de preço da gasolina e que foram reprimidos com violência.
Angola é um dos países da região africana a par de Etiópia, Quénia, Mali, Moçambique, Senegal e Somália, onde a Amnistia Internacional identificou repressão de dissidentes e uso de força excessiva para dispersar manifestantes.
O direito à liberdade de associação também foi ameaçado, diz a Amnistia, citando o projeto de lei das ONG, já aprovado no Parlamento, que, segundo estas organizações, poderá limitar o direito à liberdade de associação e dar ao executivo poderes excessivos para interferir nas suas atividades.
A Amnistia aponta também violações aos direitos económicos, sociais e culturais, focando a disputa dos professores com o executivo, reivindicando melhores salários.
"Abusos militares" em Moçambique
A Amnistia Internacionalaponta "abusos" dos militares contra civis em Moçambique e repressão dos direitos à liberdade de expressão, de reunião pacífica e de associação em 2023, acusando a polícia de "não proteger" a população dos criminosos.
"Os direitos à liberdade de expressão, de reunião pacífica e de associação foram reprimidos. A polícia utilizou munições reais contra membros e apoiantes da oposição durante o período eleitoral, matando manifestantes e transeuntes. Centenas foram detidos arbitrariamente", lê-se no relatório.
Além disso, refere, a polícia "não conseguiu proteger as pessoas de sequestros cometidos por criminosos".
A organização recorda que o Governo moçambicano criou neste período a Comissão Interministerial para os Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário, mas "continuaram a ocorrer violações significativas dos direitos humanos", motivadas nomeadamente "pelo conflito na província de Cabo Delgado".
Sobre as consequências dos ataques terroristas no norte de Moçambique, o relatório afirma que o grupo armado Al-Shabaab, as Forças de Defesa e Segurança (FDS) moçambicanas e a Missão da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral em Moçambique (SAMIM) "cometeram crimes de guerra contra civis".
"No dia 24 de julho, um elemento das FDS violou uma rapariga de 17 anos no distrito de Nangade. Também em julho, um elemento da SAMIM disparou e feriu um homem em Ingoane, distrito de Mucojo. As autoridades não conseguiram abrir investigações sobre ambos os casos", aponta a Amnistia Internacional.
Refere que as forças de segurança moçambicanas "submeteram pessoas, incluindo manifestantes, a detenções arbitrárias", elencando vários casos ocorridos em 2023.
Guiné-Bissau sem "mudanças significativas"
De acordo com um outro relatório, divulgado ontem pelos Estados Unidos, a Guiné-Bissau continuou a registar, em 2023, casos de violação dos Direitos Humanos, como tortura, falta de independência do poder judicial ou corrupção governamental.
O relatório norte-americano aponta "relatos credíveis de tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante por parte do Governo, condições prisionais duras e com risco de vida, problemas graves com a independência do poder judicial, corrupção governamental grave, ampla violência baseada no género, incluindo violência doméstica ou por parceiro íntimo, violência sexual, casamento infantil, precoce e forçado, mutilação/corte genital feminino, e tráfico de pessoas, incluindo trabalho forçado".
O documento não faz referência à dissolução do Parlamento e demissão do Governo de maioria PAI-Terra Ranka, em dezembro de 2023, por decisão do Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, sem que tenham passado os 12 meses previstos na Constituição, depois das eleições legislativas.
O Departamento de Defesa dos EUA refere que estas eleições nacionais, realizadas em junho de 2023, e ganhas pela coligação liderada pelo PAIGC, "foram amplamente consideradas justas e livres de abusos e irregularidades".
O relatório americano conclui ainda que o Governo guineense "em geral respeitava" a liberdade de imprensa e que "não restringiu nem interrompeu o acesso à Internet, nem censurou o conteúdo online, nem proibiu manifestações", no ano em análise de 2023. No início de 2024, o governo de iniciativa presidencial proibiu todo o tipo de manifestações na Guiné-Bissau, medida que continua a vigorar.
Criticar governos em África continua a ser "perigoso"
A Amnistia Internacional afirmou hoje que as críticas aos governos em muitos países africanos traduzem-se em "repressões brutais daqueles que protestam contra os excessos".
"As repressões brutais contra aqueles que protestavam contra os excessos, os fracassos ou as alegações de corrupção do Governo eram generalizadas e visavam sobretudo jornalistas, defensores dos Direitos Humanos, ativistas e líderes e membros da oposição", descreve.
A perpetuação de conflitos armados e os efeitos das alterações climáticas "deslocaram milhões de pessoas das suas casas e, no entanto, as autoridades de vários países não cumpriram as suas obrigações de proteção dos refugiados e dos requerentes de asilo".
A discriminação baseada no género e a violência contra as mulheres e as raparigas "continuaram enraizadas" e os "ataques homofóbicos e a repressão dos direitos das pessoas LGBTI aumentaram em toda a região", sintetiza.
"Os governos africanos permaneceram em grande parte indiferentes aos apelos para que combatessem a impunidade, permitindo assim que esta florescesse e alimentando o ciclo de violações e abusos, bem como o desrespeito pelo Estado de Direito", acusa a Amnistia Internacional.