Angola: Ativistas detidos "discriminados" e "intimidados"
28 de setembro de 2023O advogado dos ativistas angolanos condenados após um protesto contra limitações para mototaxistas em Luanda, Zola Bambi, denuncia uma situação preocupante: as autoridades estão a impedir que os ativistas recebam alimentos de familiares.
Contrariando alegações de greve de fome, o advogado afirma que os detidos estão, por isso, sem comer há vários dias.
Adolfo Campos, Gilson da Silva Moreira "Tanaice Neutro", Hermenegildo André "Gildo das Ruas" e Abraão Pedro Santos "Pensador ou Filho da Revolução" foram condenados a dois anos e cinco meses de prisão na semana passada.
Em entrevista à DW, Zola Bambi condena a situação "desastrosa, caótica e a regredir" dos direitos humanos em Angola.
DW África: O advogado referiu que os ativistas não estão em greve de fome, mas estão a ser impedidos de receber alimentação dos seus familiares. Pode explicar por que razão as autoridades estão a proibir essa alimentação?
Zola Bambi (ZB): Explicação plausível não temos. Acreditamos que é um tratamento diferenciado ou discriminatório que começou desde o momento da detenção dos ativistas. Temos tido este grande problema: quando acontecem detenções derivadas de manifestações, há uma certa pressão para se falar sempre de 'ordens superiores', essa linguagem continua. Isso, de certo modo, põe em causa o posicionamento das próprias autoridades ou dos agentes, mesmo querendo fazer bem o seu trabalho. São pressionados e aí surgem as violações dos direitos.
O problema não é apenas a alimentação - um deles, o Adolfo Campos, durante a detenção, foi até ameaçado com uma pistola na cabeça e obrigado a assinar um documento. São sinais bem claros de que já havia intenção de fazer qualquer coisa para os levar ao extremo. Houve mesmo um impedimento [da alimentação através dos familiares] de forma a castigá-los, chegar a um objetivo.
DW África: Que medidas legais estão a ser tomadas pela defesa dos ativistas para garantir os seus direitos e a sua libertação? Quais são os próximos passos?
ZB: Já foi feita a tramitação para o recurso dos quatro condenados. Ainda hoje (28.09) estivemos no tribunal. E há algo que ainda não percebemos: até ao momento, já lá vão 10 dias, não nos entregaram a cópia da sentença. Sem isso, não podemos fundamentar devidamente, com precisão e com todos os elementos do Direito a favor dos nossos constituintes. É esta razão que está a impedir a entrega do recurso, mas a tramitação foi feita.
DW África: Como avalia a situação dos direitos humanos e das liberdades civis em Angola, especialmente no que diz respeito à liberdade de expressão e manifestação?
ZB: Posso dizer que é desastrosa, caótica e a regredir. Não podíamos prever que estaríamos a passar por isto, neste momento, depois das promessas eleitorais e dos tempos que atravessamos. Que estejam pessoas presas por uma questão de opinião numa democracia, que tenham sido submetidas a uma pena elevada sem razões que a justifiquem, de forma simplesmente intimidatória.
Este é um processo político, que visa intimidar os ativistas, os jornalistas e as pessoas que expressam sensibilidades contrárias ao regime no poder. Quando temos esses indícios, não podemos falar de direitos humanos.
DW África: Gostaria de transmitir alguma mensagem às autoridades angolanas em relação ao caso dos ativistas e às condições da detenção?
ZB: Este processo já começou muito mal, mas [peço que] que decorra conforme as garantias das normas nacionais, com transparência, lisura e, sobretudo, que se cumpra a realização da justiça e não a busca de interesses inconfessos e a tentativa de calar vozes contestatórias.