Certidões em memória das vítimas dos conflitos políticos
1 de junho de 2021O momento é de muita emoção por parte dos parentes que nunca chegaram a realizar o velório dos seus entes queridos, desaparecidos durante os acontecimentos trágicos do 27 de maio e da guerra civil em Angola.
Dezenas de pessoas têm acorrido ao Pavilhão Multiusos do Kilamba, em Luanda, onde estão a ser emitidas as certidões de óbito. O processo começou na segunda-feira (31.05) e é encabeçado pela Comissão de Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos (CIVICOP).
"Perdi os meus tios. A minha avó teve 16 filhos e morreram 14 irmãos do meu falecido pai. Morreram durante os conflitos armados e no 27 de maio", conta Edna Domingos.
Edna, sobrinha do político Nito Alves, a figura central do caso 27 de maio, diz que a família recebeu com agrado, na semana passada, o pedido de desculpas públicas do Presidente João Lourenço pelo ocorrido em 1977.
"Já era tempo de um pedido de desculpas, porque morreu muita gente inocente. A minha mãe lembra-se de quando foram buscar pessoas inocentes na Sagrada Família e as puseram naqueles camiões... Eu tinha dois anos. A minha família foi posta viva dentro de um buraco na Santana", recorda.
Edna já recebeu a certidão de óbito dos tios. Estas certidões ajudarão algumas famílias a obter pensões, para o sustento das viúvas das vítimas dos conflitos políticos ou dos filhos órfãos.
Governo recusa indemnizações
Em 1999, na guerra civil, Isabel Santos perdeu o marido, Antoninho Armando Simão, ex-financeiro da polícia nacional. Ela espera agora que o Ministério do Interior preste apoio à sua família.
"O papel não resolve problemas. Estávamos atrás deste certificado, agora esperamos que o Ministério do Interior faça a sua parte."
Falando à imprensa na cerimónia de entrega das certidões, na segunda-feira, o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos e coordenador da CIVICOP, Francisco Queiroz, disse que indemnizações às famílias das vítimas estão fora de questão. Segundo o governante, o Governo vai entregar as ossadas dos falecidos e vai ajudar a pagar as urnas para os funerais.
"Essa é uma matéria que desde o início do trabalho da CIVICOP ficou esclarecida e nunca houve mais nenhuma referência sobre isso", frisou Queiroz. "Estamos a falar em honrar a memória dessas pessoas. Isso não se faz com dinheiro. O dinheiro só iria desprestigiar a memória das pessoas que faleceram e introduzir aqui um fator que não corresponde ao espírito daquilo que se está fazer."
Ainda não foi estipulada uma data para o término do processo de emissão das certidões de óbito.