Angola: "O futuro não se apresenta tão seguro assim"
27 de novembro de 2018O recente pronunciamento do ex-Presidente de Angola, sobre os 15 mil milhões de dólares que terá deixado nos cofres do país aquando da sua saída, aconteceu num momento singular: o atual Presidente João Lourenço estava de visita a Portugal, onde provavelmente obteria um sinal positivo de Lisboa para a colaboração no repatriamento de capitais angolanos.
Também o prazo para o fim do repatriamento pacífico de capitais está a chegar ao fim em Angola, termina a 22 de dezembro de 2018, e foi aprovada a Lei de Repatriamento Coercivo de capitais. Para além de que José Eduardo dos Santos, visivelmente debilitado, estava acompanhado de poderosos generais da sua confiança durante a conferência de imprensa.
Estarão José Eduardos dos Santos (JES) e os seus generais mais próximos a sentir-se acuados? O analista angolano Agostinho Sikato não tem dúvidas: "De facto sim, estão a sentir-se [acuados]. E esta é uma resposta direta que dão ao Presidente João Lourenço de que o futuro não se apresenta tão seguro assim."
O que significa a abertura de Portugal para JES e seus próximos?
No concernente a visita a Portugal, que simbolizou o degelo nas relações entre Luanda e Lisboa, o analista angolano David Kissadila lembra que o país foi a porta de entrada dos capitais ilícitos angolanos para o mundo globalizado.
Para kissadila as intenções de José Eduardo dos Santos e dos seus acólitos são "justamente para inviabilizar as intenções do Presidente João Lourenço. Há dez anos que Angola e Portugal tinham um relacionamento azedo e João Lourenço coloca ponto final a isso para encontrar os apoios necessários que lhe possam abrir os caminhos para resgatar os dinheiros."
Visados passarão por cima da Lei de Repatriamento Coercivo de capitais?
No que se refere ao repatriamento de capitais Agostinho Sikato lembra entretanto que nenhum deles o fez até agora e não acredita que o farão com o vigoramento da Lei de Repatriamento Coercivo de Capitais.
Para o analista político a lei ora aprovada não passa de letra morta, para além de que, na sua opinião, não há em Angola moral por parte dos procuradores e juízes para fazerem justiça.
E Sikatu acrescenta que os visados estarão relativamente relaxados, pois do ponto de vista do direito internacional haverá mais complexidade em repatriar o dinheiro: "Acho que este grupo está a jogar com as decisões do João Lourenço. O que vai haver depois? Se João Lourenço apertar um pouco mais o cinto significa que terá de perseguir um por um, mandar para a cadeia um por um, e isso resultará em eleições antecipadas."
E o analista acredita que "é uma vingança total que estão a fazer com João Lourenço, que é desproporcional, para alguém, por exemplo, que declarou combater a corrupção exatamente para o bem do Estado. João Lourenço está a ser desafiado por todos."
Há condições para um golpe em Angola?
2019 poderá ser um ano de surpresas, pois uma crise política sem precedentes pode estar já a ser incubada. O facto de José Eduardo dos Santos ter dado a conferência de imprensa ladeado de generais influentes, com posturas de estadista segundo Sikato, e na ausência do Presidente da República também é mal interpretado.
Há condições para que um golpe de Estado aconteça em Angola? Agostinho Sikato defende que "do ponto de vista da análise estratégica nenhuma hipótese é afastada. Mas do ponto de vista real neste momento ainda, na escala de um a dez, poderíamos colocar apenas a três. Mas neste momento não há condições para um possível golpe de Estado.
E numa escala de um a dez qual é o apoio que João Lourenço tem da ala castrense? O analista responde: "A ala castrense também esta dividia ao meio: os que se beneficiaram de forma direta, é o grupo que detém o poder, uma minoria, e os que não se beneficiaram, que são a maioria, De um a dez João Lourenço deve beneficiar-se pelo menos com uma margem de oito."
Risco de desestabilização
Apesar de minimizar as chances de uma golpe de Estado, Sikato sublinha o poder que os acólitos de José Eduardo dos Santos têm: o económico. O analista não descarta cenários maus caso eles saiam prejudicados nesta guerra.
"O temor de muita gente é de uma possível ou criação de algum caos social ou político, porque se este grupo decidir fechar as empresas que têm vão criar um caos social. Significa que teremos muita gente fora do trabalho. Se este grupo se sentir encurralado, por exemplo, é capaz de pagar alguns fanáticos e pobres para criar instabilidade", acredita Sikato.
Mas o analista David Kissadila acredita que se fará sentir a mão pesada de João Lourenço. O Presidente poderá usar todos os instrumentos ao seu dispor para travar o grupo. E frisa: "Acho que a guerra está mesmo aberta que não haverá nenhum recuo. Basta ver os pronunciamentos do Presidente João Lourenço, como por exemplo dos marimbondos."