Angola: Oposição questiona registo eleitoral na diáspora
19 de fevereiro de 2022O registo eleitoral oficioso em Portugal, com vista às eleições gerais deste ano em Angola, começou mal. É a primeira constatação de Edgar Kapapelo, representante em Portugal da Juventude da UNITA (JURA), que critica o facto de não se ter realizado antes do início do processo um trabalho de sensibilização dos cidadãos angolanos.
Será a primeira vez, depois de 47 anos após a independência, que os angolanos na diáspora vão votar nas eleições gerais (legislativas e presidenciais) previstas para agosto deste ano, mas ainda sem data marcada.
"Existem vários constrangimentos. Temos muitas perguntas que não são respondidas", afirmou Kapapelo, que falou à DW no âmbito de um encontro ocorrido este sábado (19.02), num hotel de Lisboa, com a presença de representantes da Frente Patriótica Unida Patriótica (FPU), a qual congrega a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o Bloco Democrático e o Partido do Renascimento Angola - Juntos por Angola - Servir Angola (PRA-JA).
Problemas com o Bilhete de Identidade
Para fazer o registo eleitoral basta usar o Bilhete de Identidade (BI). Mas o representante da UNITA levanta problemas relacionados com o referido documento, nomeadamente em Portugal.
Cerca de 70 por cento de angolanos aqui radicados não têm este documento, cujo processo de renovação não tem mais de um ano. "O processo é muito moroso", lamentou, acrescentando que "há pessoas que solicitaram o BI em novembro e dezembro e ainda não o têm".
"Tendo em conta que o registo encerra no dia 31 de março deste ano, achamos que é um pouco inconcebível", o tempo de demora na obtenção do BI. "Não se pode estar a tratar um direito fundamental como se fosse um favor", adiantou, lamentando a falta de comunicação entre a missão consular e os cidadãos angolanos. Muitos ainda não sabem do ato em curso na diáspora, referiu.
"Nós continuamos a verificar filas para tratar bilhete de identidade e do passaporte [entre outros], mas o [posto para o] registo oficioso está literalmente vazio todos os dias", afirmou Edgar Kapapelo.
Dificuldade de mobilidade
Associado a isso, outro "problema grave" prende-se com o facto de se ter circunscrito o registo eleitoral a Lisboa e Porto. O representante da JURA fala de dificuldade de mobilidade dos angolanos que vivem distantes dos postos de registo que funcionam nos Consulados de Lisboa e do Porto.
Para Edgar Kapapelo, "há uma clara intenção de se inviabilizar o processo na diáspora". Além disso, denunciou, "não existem representantes dos partidos da oposição a acompanhar o processo e, como tal" – referiu – "a probabilidade de fraude é maior". Neste contexto, sugeriu a criação de brigadas móveis, tal se fez aquando dos processos de emissão de passaportes, para permitir que mais angolanos possam recensear-se.
A FPU anunciou que vai criar meios alternativos de sensibilização para mobilizar mais concidadãos desinformados.
Prazo do registo eleitoral
Além da falta de comunicação, Manuel Dias dos Santos, que falou com a DW em nome do Bloco Democrático, levantou a questão temporal de realização do registo eleitoral, que em Portugal não teve início na data anunciada. "Como [o processo] não iniciou no dia 1 de fevereiro, mostra-se necessário e urgente rever o prazo dos três meses tendo em conta esse facto", advertiu.
Dias dos Santos pediu "uma melhor comunicação" e "maior proximidade" entre o Consulado e a comunidade, porque, como acrescentou, "está em causa uma questão de cidadania plena" de modo a que os angolanos a residir no estrangeiro possam participar nas próximas eleições. "É o que conta", sublinhou. "Porque depois a decisão em quem se vota é exclusiva dos atores políticos que se registam".
O representante do Bloco Democrático pediu mais abertura por parte do Consulado e da Embaixada para "um diálogo permanente", que vise eliminar os constrangimentos, contra aquilo a que chamou de "luandanização das decisões".
Santana Lopes, representante do PRA-JA, reforçou a importância deste encontro, criticando "os atos de manobra" dos serviços consulares, "que não têm interesse em divulgar informação" para que os angolanos informados "possam exercer o seu direito de cidadania".
Pediu, em consonância com o apelo lançado por outras intervenções, que cada angolano seja um agente de fiscalização, independentemente da sua cor político-partidária. "Cada um de nós aqui é um agente fiscalizador", rematou contra a fraude que, na sua opinião, "está institucionalizada" em Angola. "Não daremos tréguas aos regime do MPLA", afirmou perante a audiência.
Mais flexibilidade
Franco Marcolino Nhane, deputado da UNITA, partido que lidera a Frente Patriótica Unida, disse à DW que, nessa qualidade não pode ficar indiferente às preocupações levantadas no encontro. Afirmou que, tal como o que acontece no país, "há uma tendência para se dificultar o registo dos angolanos na diáspora". Preocupa ao deputado algumas manobras que têm a ver com os documentos que os angolanos têm de reunir para efetivar o seu registo.
Por outro lado, disse que "devia haver flexibilidade por parte do Consulado no atendimento aos cidadãos, tendo em conta a dinâmica de vida que os angolanos levam na diáspora".
De passagem por Lisboa, Nhane pede que tudo seja feito, incluindo registos aos fins de semana, para facilitar a participação dos angolanos, "porque está aqui em causa o exercício de um direito fundamental".
Considera que "o tempo é muito curto para corrigir as falhas do processo" até as eleições previstas para o mês de agosto deste ano. Mas, perante as inquietações apresentadas, assumiu que vai trabalhar com os promotores do encontro com vista a se produzir um memorando que vai apresentar ao Consulado Geral de Angola em Portugal para obter esclarecimentos.
O deputado e os demais angolanos presentes no encontro lamentaram a ausência do Embaixador de Angola e de representantes do Consulado Geral, previamente convidados com o objetivo de esclarecer os angolanos sobre a forma como estão a decorrer os trabalhos do registo eleitoral.