Angola: Novo Governo, problemas antigos
2 de outubro de 2017A DW África conversou com o analista e jornalista luso-angolano Orlando Castro sobre as expetativas em relação ao novo Governo em Angola. Podem-se esperar mudanças no que diz respeito ao combate à corrupção, melhorias das condições de vida das populações conforme prometeu João Lourenço durante a caça ao voto? Angola daqui para frente: continuidade ou ruptura? Leia a entrevista.
DW África: João Lourenço nomeou 32 ministro para o seu Governo quando tinha prometido que não teria um Governo tão grande. Este é um sinal de que o seu Executivo será despesista?
Orlando Castro (OC): Naturalmente que vamos ter um Governo despesista, porque isso está um bocado no próprio ADN do MPLA. E João Lourenço já não está a cumprir com o que prometeu na campanha eleitoral, que era ter um Governo mais curto e também não está a cumprir com o que referiu no seu discurso de posse, em que também voltou a falar num Governo mais curto. Portanto, vamos ter um Governo, que como utiliza dinheiro do erário público, do povo e que apesar da crise não custa assim tanto a ganhar, vamos ter um Governo mais despesista, um Governo mais vocacionado para obras de fachada do que, de facto, para a tomada de decisões estruturais de fundo.
DW África: João Lourenço está em condições de cumprir com o que prometeu? Por exemplo, na melhoria das condições de vida para a população e combate à corrupção tomando em conta que tem mostrado uma espécie de continuidade em relação às políticas do anterior Governo?
OC: Ele não está em condições de tomar essas medidas e nem de cumprir com o que prometeu, porque desde logo é um Governo de continuidade. Alguns dos ministros transitam de um lado para o outro, e portanto, João Lourenço mesmo que quisesse, o que tenho sérias dúvidas, não vai conseguir cumprir o que prometeu. Em relação à corrupção isto é mais ou menos como prometer que se vai cuidar das galinhas e depois por a raposa dentro do galinheiro a cuidar das galinhas. Uma forma de dar sinal de que estariam interessados em combater a corrupção seria não entrar em litígio com Portugal no caso Manuel Vicente (ex-vice-Presidente de Angola). Se Vicente não deve não tem o que temer, o que é da política é da política e o que é da justiça é da justiça. E se eles dissessem que o Manuel Vicente vai defender-se em tribunal nós começaríamos a creditar que, de facto, o regime queria rejuvenescer-se, mas não me parece que isso venha a acontecer nos tempos mais próximos.
DW África: João Lourenço e alguma ala do MPLA teriam força suficiente e coragem para tentar mudar a direção do partido, tirando, por exemplo, José Eduardo dos Santos da liderança do MPLA, para que Lourenço possa ter a oportunidade de governar plenamente o país?
OC: José Eduardo dos Santos disse que ficaria na política ativa até 2018, a ser verdade ele deixará a liderança do MPLA em 2018. E se isso acontecer é natural que se notem alguns laivos de alteração na política de João Lourenço. Mas o problema todo está em que o núcleo duro do MPLA é o núcleo a que pertence também João Lourenço. Ou seja, com José Eduardo dos Santos a liderar o MPLA ou o João Lourenço a liderar a situação básica de Angola vai manter-se, porque não há um rompimento, não há uma clivagem com a filosofia do próprio partido que continua a funcionar numa tese de democracia com um partido único. Isto é, Angola é formalmente uma democracia, tem partidos, mas o partido dominante continua a funcionar como se fosse um partido único. E as pessoas que estão ligadas à José Eduardo dos Santos, ou que eventualmente venham a estar ligadas à João Lourenço comungam todas desses mesmos princípios. Portanto, é extremamente difícil fazer qualquer ruptura com o sistema.