Angolanos no estrangeiro ansiosos por votar
30 de dezembro de 2016Por força da legislação angolana, os cidadãos na diáspora podem exercer o direito de voto nas eleições gerais previstas para agosto de 2017 apenas se se deslocarem a Angola. Pelo que apurou a DW, há cidadãos angolanos, incluindo estudantes, que se deslocaram ao país neste período de férias natalícias para ali se recensearem, uma vez que não o podem fazer em Portugal.
Essa é também uma oportunidade para os cidadãos nacionais, maiores de 18 anos, fazerem a sua declaração de prova de vida, segundo informou Rosa Almeida, representante em Portugal do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).
"Em 1992, nas últimas eleições, muitas pessoas deslocaram-se daqui para Luanda, nas suas férias e também fizeram as suas inscrições, têm cartões de eleitores. Têm familiares em Angola e vão fazer cumprir o seu direito de cidadania. Por isso, teremos de trabalhar e sensibilizar essas pessoas para irem a Angola na altura de votação e fazerem a sua prova presencial, para confirmarmos realmente quantas pessoas somos e quantas morreram", explicou.
Além dos estudantes, há o caso particular dos doentes em tratamento em Portugal, acrescenta Almeida. "Temos doentes que têm já o seu recenseamento anterior. De que maneira poderão ir até Angola fazer o recenseamento? Talvez façam a prova de vida aqui mediante um documento médico que prove que estejam cá doentes. Assim, poderão resolver ou indicar o Consulado ou a Embaixada onde as pessoas poderão fazer o seu recenseamento."
O artigo 143 da Constituição angolana, relativo ao sistema eleitoral, diz que "os deputados são eleitos por sufrágio universal, livre, igual, direto, secreto e periódico pelos cidadãos nacionais maiores de dezoito anos de idade residentes no território nacional, considerando-se igualmente como tal os cidadãos angolanos residentes no estrangeiro por razões de serviço, estudo, doença ou similares."
Votação no exterior
Domingos da Silva Costa, angolano há cerca de 20 anos em Portugal, considera que o recenseamento na diáspora traria mais receitas para os cofres do Estado, particularmente para as Embaixadas e Consulados, pois, segundo ele, "obrigava a uma descentralização informática e obrigava os angolanos residentes na diáspora a atualizarem as suas certidões de nascimento e os bilhetes de identidade. Seriam receitas para as missões consulares e para o Ministério das Relações Exteriores", disse em entrevista à DW.
Costa acredita que votar no estrangeiro dependerá da revisão, no futuro, da Constituição angolana. No entanto, diz que faz sentido regressar e votar no país: "Pode ser uma estratégia do Governo porque precisa que os seus filhos, os quadros angolanos, voltem a casa; precisa de pessoas para o desenvolvimento angolano. O país precisa de médicos, enfermeiros, engenheiros, e nós, que estamos na diáspora, não podemos só fazer críticas. Também temos que dar o nosso contributo."
Já Pedro Lopes, coordenador da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), lamenta o facto do executivo angolano e o partido no poder não considerarem relevante o voto dos angolanos no exterior.
Segundo ele, "a Constituição [de Angola] parece definir dois estatutos, mas não. Todos nós somos angolanos, quer aqueles que vivem lá como nós que vivemos cá, no exterior. Portanto, tem de haver um estatuto único para os angolanos, tanto os que residem lá como os que residem no exterior."
A terceira maior força política no Parlamento sustenta que ainda há um amplo trabalho de sensibilização e mobilização a fazer junto da comunidade angolana na diáspora e diz ser preciso "continuar a bater nesta tecla."
Alterar a legislação
Jorge Silva, do Bloco Democrático, um partido sem assento parlamentar, liderado por Justino Pinto de Andrade, insiste na necessidade de uma alteração na legislação atual que "passe por uma organização da diáspora".
Os angolanos a viver no estrangeiros têm de "se impor, têm de pressionar e manifestar claramente que têm vontade de exercer os direitos cívicos que lhes são vetados por esta Constituição. Têm de pressionar no sentido de se fazer uma alteração da Constituição, para que ela possa exercer os seus direitos. Agora, há toda uma série de condicionantes que levam também a diáspora a estar nessa letargia de nada fazer."
Segundo Silva, a dispersão e a falta de motivação entre os angolanos radicados no estrangeiro explicam a ausência de maior pressão a partir do exterior.
"Nós vemos que, noutros países, como por exemplo na África do Sul, o movimento da diáspora para pressionar nesse sentido é muito maior", afirma, "porque os problemas e as condicionantes nesse país, por proximidade a Angola e por outros fatores, permitem que haja realmente um movimento mais forte a pressionar nesse sentido."
O membro do Bloco Democrático explica que, na Alemanha, por exemplo, há uma comunidade mais esclarecida e atuante, exercendo, por isso, uma pressão maior. Em relação ao resto da Europa, há uma diáspora "dispersa", que "ainda não despertou para esse problema".
Na sua perspetiva, a situação interna de Angola releva para segundo plano o voto da diáspora. "Porque surgem outras coisas muito mais importantes. Nós vimos que a diáspora esteve muito mais preocupada em bater-se pela libertação dos jovens [ativistas] que estiveram presos, pelo respeito dos Direitos Humanos. E passa grande parte do ano nessas lutas, porque é muito mais importante defender a vida dessas pessoas, em risco iminente, do que propriamente o voto [da diáspora]”.
Não foi possível obter uma reação do representante da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o principal partido da oposição.