Decisão de anulação do congresso da UNITA "é política"
7 de outubro de 2021Na última terça-feira, (05.10), a imprensa angolana noticiou que o Tribunal Constitucional (TC) teria anulado o XIII congresso da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) que elegeu Adalberto Costa Júnior como líder do partido em substituição de Isaías Samakuva.
A decisão foi conformada esta quinta-feira, (07.10) pelo próprio TC por meio da publicação do acórdão na sua página oficial. O aval dá razão a um grupo de militantes da UNITA que requereu a nulidade do congresso invocando várias irregularidades.
Recorde-se que a notícia foi avançada no mesmo dia em que Adalberto Costa Júnior foi anunciado como líder da Frente Patriótica Unida (FPU).
Em entrevista à DW África momentos antes da publicação do acórdão , o jornalista angolano, José Gama, afirma que a decisão do TC é política, uma vez que a maior parte do coletivo de juízes do TC é constituido por membros do partido governamental, nomeados pelo presidente do MPLA, João Lourenço.
DW África: Ao se noticiar a decisão do Tribunal Constitucional (TC) no mesmo dia em que Adalberto Costa Júnior foi anunciado como líder da Frente Patriótica Unida (FPU), podemos dizer que foi uma espécie de "balão de ensaio"?
José Gama (JG): O que podemos perceber é que aconteceram alguns dados que mostraram alguma intranquilidade por parte do governo de MPLA em relação a Adalberto Costa Júnior. Desde que foi eleito presidente da UNITA, o partido passou a ter uma certa popularidade e o que nós estamos a observar é o uso, por parte do MPLA, dos tribunais, para neutralizar o adversário político. Recentemente foi nomeada para presidente deste mesmo tribunal uma senhora que saiu, há pouco tempo, do bureau político do MPLA.
DW África: Estamos perante um caso de politização da Justiça para beneficiar o MPLA?
JG: Exatamente. Basta olharmos para o Tribunal Constitucional de Angola. É constituído por onze juízes e sete deles são indivíduos que sairam da bancada parlamentar do MPLA ou que foram nomeados pelo Presidente João Lourenço, também ele presidente do MPLA. Portanto, temos um tribunal totalmente politizado porque, em condições normais, o tribunal não iria aceitar este pedido de impugnação e deveria ter chamado também a UNITA para ouvir a sua versão de forma a haver contraditório.
DW África: Neste caso a impugnação apresentada pelos militantes da UNITA contra o congresso que elegeu Adalberto Costa Júnio, pode ser considerada expediente para o MPLA?
JG: Sim, porque quem paga o advogado para tratar este assunto foi um general do MPLA, o general Ferreira Tavares. E esses que fizeram o pedido de impugnação nem sequer estão mais na UNITA. Já deram entrevistas à Televisão Pública de Angola a dizer que já não se reveem na UNITA, nem no presidente da UNITA e que têm agora um novo presidente, um novo partido. Ficou claro que esses estavam a ser instrumentalizados pelo MPLA.
DW África: Adalberto Costa Júnior foi presidente da UNITA por dois anos, o que significa que a sua eleição terá sido chancelada pelo Ao emitir uma decisão que revoga a anterior o TC entra em auto-contradição?
JG: Claramente. É o Tribunal a desautorizar-se. Nota-se claramente que se trata de uma decisão política. Basta vez que dos onze juízes que formam o TC, quatro deles faltaram no dia da votação. Nota-se que há um desconforto dos próprios juízes nessa decisão.
DW África: E pode ser por esta razão que o TC ainda não emitiu um acordão oficial?
JG: Exatamente. Porque os outros quatro juízes faltaram no dia em que iriam fazer o anúncio de anulação final deste congresso.
DW África: Como é que a UNITA se "desdobra" agora nesta situação?
JG: Os dados que nós temos é que o tribunal vai ordenar que a UNITA volte ao figurino de 2019 e Isaías Samakuva volta à presidência do partido. O que a UNITA deve fazer é convocar um novo congresso e Samakuva deve aproveitar essa oportunidade para nomear automaticamente Adalberto Costa Júnior para vice-presidente do partido.