Análise: As contradições dos EUA com África
19 de fevereiro de 2020No último dia de vista a países africanos, o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, fez um discurso político na Comissão Económica das Nações Unidas para África antes de voar para a Arábia Saudita.
"Os países devem ter cuidado com os regimes autoritários e os seus promessas vazias", disse Pompeo em seu discurso em Adis Abeba, na Etiópia. "Eles criam corrupção, dependência e instabilidade, não prosperidade, soberania e progresso", completou.
Na terça-feira (18.02), secretário de Estado encorajou a cooperação entre Etiópia, Sudão e Egito para um acordo sobre a barragem do Nilo Azul - que provocou uma crise diplomática de anos entre Cairo e Adis Abeba – mas advertiu que um acordo pode levar meses. "A nossa missão não é impor uma solução. É fazer com que os três países se unam em torno de uma solução que eles reconheçam e atenda as suas preocupações", disse.
A Etiópia diz que o projeto hidroelétrico é crucial para o seu desenvolvimento económico, mas o Egito considera que a barragem afetará o fluxo do Nilo, a sua principal fonte de água doce. O Governo etíope espera que a barragem do Nilo Azul torne o país no maior exportador de energia de África, produzindo mais de 6 mil megawatts.
Os EUA e a crise no Sahel
Os EUA estão atualmente a discutir cortes militares na região do Sahel, na África Ocidental. O analista de segurança do Gana Vladimir Antwi-Danso lembra que se está a tornar cada vez mais difícil sufocar a rebelião na área. "Os EUA perderam uma série de tropas no Níger e no Mali e perceberam que talvez esteja na hora de reorientar e reconstruir a sua relação com África", opina Antwi-Danso.
No final da sua estadia no Senegal, primeira paragem da sua viagem por África, Pompeu disse que os EUA trabalham para definir os recursos militares necessários para combater o aumento da violência extremista na África Ocidental.
Antwi-Danso diz, entretanto, que aumentar a presença militar norte-americana não é do interesse de África.
"A maioria dos problemas que estamos a ter no que diz respeito à segurança deve-se à política dos EUA em matéria de defesa em África. Expulsar e matar o ditador líbio Muammar Kadhafi, por exemplo, desencadeou eventos violentos em toda a zona do Sahel. Eles estão a criar problemas de tal forma que a maioria dos países africanos não sabe o que fazer. Quanto maior a presença dos EUA, maiores as rebeliões ou o terrorismo", diz.
O contrapeso chinês
Já na passagem por Angola, Pompeo não conteve os elogios à recente campanha anticorrupção de Luanda. Antwi-Danso afirma, no entanto, que este pode não ter sido o ponto mais importante para o norte-americano e sim os recursos naturais do país.
"Angola é um país rico e se os EUA América ganharem Angola, estarão a ganhar um enorme país com enormes recursos. Para os EUA, Angola seria também um país estratégico para contrariar a influência da China", avalia.
O porta-voz do Departamento de Estado Morgan Ortagus confirmou que Pompeo e o Presidente João Lourenço discutiram o papel de Pequim em África. A China seria também uma das razões pelas quais Pompeo esteve na Etiópia.
"A Etiópia é a porta de entrada para o Corno de África. Se os Estados Unidos conseguirem se firmar na Etiópia, poderão também combater a influência da China na região", diz o analista ganense.
Os EUA perderam o status de principal parceiro comercial de África para a China há dez anos. Num esforço para fortalecer os laços económicos, Pompeo também se reuniu com líderes e empresários dos países que visitou.
Sem ganha-ganha
O secretário de Estado pareceu decidido a promover o programa americano "Prosper Africa" - concebido pelo ex-conselheiro de segurança John Bolton.
"As relações económicas de exploração, por causa do petróleo ou de outras matérias-primas, não são corretas, tanto com a China como com os EUA. Precisamos de uma relação económica que ajude a tirar a África do marasmo da pobreza e da estagnação. Então, o mundo será mais pacífico", adverte Antwi-Danso.
Há algumas semanas, a Nigéria, Eritreia, Sudão e Tanzânia juntaram-se à Líbia e Somália na lista de países cujos nacionais estão na sua maioria impedidos de entrar nos EUA por alegadas razões de segurança.