Autoridades guineenses admitem: combate ao narcotráfico só é possível com ajuda internacional
27 de outubro de 2014As Nações Unidas consideram que falar do crime organizado e do tráfico de droga “de forma franca” pode ajudar a mudar a imagem da Guiné-Bissau junto dos parceiros da comunidade internacional que aguardam por estratégias claras do país.
A ideia foi defendida por Marco Carminagni, representante adjunto do secretário-geral das Nações Unidas na Guiné-Bissau, e por Pierre Lapaque, representante da Agência das Nações Unidas para as Drogas e Crime (UNODC) para a África Ocidental.
A reunião visa encontrar estratégias de abordagem coordenada da comunidade internacional com as novas autoridades guineenses para o combate à droga e ao crime organizado.
Primeiro-ministro quer reforçar instâncias do Estado
A DW África abordou recentemente o assunto com o primeiro-ministro da Guiné-Bissau, Domingos Simões Pereira, durante uma entrevista exclusiva que teve lugar em Bissau.
"O narcotráfico não existe apenas na Guiné-Bissau, mas sim em toda a sub-região", declarou o chefe do Governo, salientando que "o grande problema é a fragilidade do Estado. Se o Estado é frágil, se o Estado não cumpre o seu papel, passa a ser um espaço privilegiado para a instalação do narcotráfico.
Por isso, Simões Pereira defende que "é preciso haver estratégias para confrontar o mundo do crime. Se o Estado for forte, se o Estado chegar a todo o território, se o Estado cumprir a sua missão, o narcotráfico vai encontrar menos espaço e o Estado vai ter mais capacidade de o combater.”
Ministra admite que polícia está desestruturada
A DW África falou também com a ministra da justiça, Carmelita Pires, uma mulher que tentou combater decididamente o crime organizado e os traficantes de cocaína, já no Governo antes do golpe militar de abril de 2012.
Na altura foi ameaçada por pessoas ligadas ao crime organizado. Depois do golpe, Carmelita Pires viu-se obrigada a abandonar o país. Quando voltou ao Ministério foi visitar todos os serviços.
"Vimos que a polícia está desestruturada, a polícia está de novo sem meios idóneos e adequados, com falta de dignidade, mas mais uma vez estamos aqui e é-nos lançado este desafio", afirma a ministra. "Esperemos que desta vez seja efetivamente por quatro anos e que näo tenhamos que funcionar como bombeiros para apagar fogos. Interessa-nos trabalhar durante quatro anos. Há muita vontade neste governo de mudar as coisas para melhor.”
A DW África pode constatar em Bissau que a Polícia Judiciária praticamente não funciona. O país continua também sem uma única prisão capaz de receber prisioneiros de alto risco. Os meios disponíveis no Orçamento do Estado são praticamente inexistentes.
À ministra da Justiça resta esperar pelo apoio internacional. Carmelita Pires desabafa: “Nós estamos em crer que a comunidade internacional e os nossos parceiros mais uma vez serão sensíveis a esta problemática e estarão aptos a vir em nosso apoio para que possamos estabelecer programas claros de combate ao crime organizado e para que, a médio prazo, possamos dar sinais claros.”
UNODC pronta a mediar apoio internacional
O apoio internacional poderá ser coordenado e mediado pela UNODC, a Agência das Nações Unidas para as Drogas e Crime. O representante desta agência para a África Ocidental, Pierre Lapaque, já visitou várias vezes a Guiné-Bissau e participa também na reunião que decorre na capital guineense.
Em conversa com a DW África, o funcionário da ONU e ex-agente da Interpol, sem rodeios, descreve as debilidades da Guiné-Bissau: “Eu diria que a Guiné-Bissau é, infelizmente, e há já bastante tempo, um país débil, um país com muitas dificuldades. Um país em que as instâncias que lutam contra o crime transnacional encaram muitas dificuldades em trabalhar. Refiro-me à justiça, à polícia judiciária e às alfândegas, entre outras instâncias."
Para Pierre Lapaque, "trata-se também de um país com um considerável nível de corrupção. Outro problema da Guiné-Bissau é que certas instâncias do Estado, em particular as Forças Armadas, nem todas as Forças Armadas, mas uma parte das Forças Armadas, estiveram direta ou indiretamente implicados no tráfico da droga.”
Sublinhando a disponibilidade de “vários parceiros internacionais” em apoiar as medidas do Governo para o combate à droga, Pierre Lapaque reforçou a necessidade da reunião que encerra esta segunda-feira ser transparente, verdadeira e clara sem levar em conta as diferenças partidárias entre os intervenientes do lado guineense.