Barragem Mphanda Nkuwa: Megaprojeto à custa das comunidades?
13 de dezembro de 2023O Governo Moçambique assinou hoje (13.12) um acordo de parceria para implementar o megaprojeto da Hidroelétrica de Mphanda Nkuwa. Com o custo de 4,6 mil milhões de euros, a barragem terá numa primeira fase capacidade de até 1.500 megawatts e será a segunda maior do país, depois de Cahora Bassa (HCB), que tem uma capacidade de 2.070 megawatts.
Mas a construção desta barragem tem sido alvo de denúncias de violações de direitos humanos e sócio-ambientais. Ativistas relatam que as comunidades não foram consultadas antes da construção da barragem. Os ambientalistas alertam também para o risco do deslocamento de comunidades inteiras, a destruição dos meios de subsistência de quem vive nos arredores do projeto e graves impactos ambientais nas espécies do rio Zambeze.
Ameaças
Além disso, alguns membros das comunidades locais afetadas pela construção da barragem relatam ameaças, intimidações e detenções arbitrárias de opositores ao projeto. Estariam a ser intimidados para não saírem das comunidades sem "autorização do governo" para participarem em reuniões que alertam sobre os seus direitos e os impactos da hidroelétrica.
A ONG Justiça Ambiental divulgou hoje, através de um vídeo no YouTube, algumas dessas denúncias. Um morador da província de Tete, distrito de Marara, conta no vídeo que foi a Maputo para participar numa reunião, mas quando voltou para casa, recebeu "uma notificação do comando policial do distrito de Marara".
"Foi estranho, porque temos o direito de ir a qualquer reunião", relatou.
Encontros em Maputo
Segundo a Justiça Ambiental, que acompanha há anos as diferentes fases do projeto, as comunidades locais começaram a sofrer intimidações em 2022 por participarem nos encontros promovidos pela organização ambiental, na zona da hidroelétrica e em Maputo.
A equipa da ONG também relata que foi intimidada para não fornecer informações aos residentes sobre os impactos das barragens. Érica Mendes, a coordenadora da área de impunidade corporativa e direitos humanos da Justiça Ambiental, diz que "líderes locais têm reportado que receberam orientações do governo – a que chamam 'ordens superiores' – para não permitir que a Justiça Ambiental se reúna na área".
"E nós fizemos já uma série de denúncias e queixas – na procuradoria distrital, da província e nacional, e ao nível de promotor de justiça, mas não tivemos resposta formal sobre o assunto", explicou.
"Nunca tive conhecimento"
A DW contactou o administrador local de Marara, na região de Tete. Cláudio Hoda disse "nunca ter tido conhecimento" de que moradores estivessem a ser intimidados e garantiu que o megaprojeto "é bom" para a comunidade.
"É mentira o que está acontecer. Se alguma comunidade sofreu alguma intimidação por parte do governo, quem é este governo que intimidou? Nós, como governo, não confirmamos esta intimidação. A população não registou, em nenhum canto, esta intimidação", afirmou.
Entretanto, segundo o mesmo vídeo divulgado hoje no YouTube pela Justiça Ambiental, até mesmo uma música, cantada em Nyungwe, e produzida por uma moradora da província de Tete, que expressa as suas preocupações com a construção da barragem, terá sido proibida.
A música, que foi tema de grande discussão no distrito, diz que os moradores locais não querem sair das suas comunidades por causa do megaprojeto. Além disso, a autora diz que algumas pessoas estão a ser acusados de serem membros do maior partido da oposição no país, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO).