Moçambique detém pessoas por parecerem muçulmanas, dizem EUA
3 de junho de 2022"Numa tentativa de controlar a situação [em Cabo Delgado] e conter a violência, a polícia continuou a prática de deter arbitrariamente alguns indivíduos porque pareciam muçulmanos pela sua roupa ou barba, segundo organizações islâmicas nacionais e outros relatos nos 'media'", pode ler-se no relatório anual sobre liberdade religiosa no mundo, divulgado pelo Departamento de Estado.
No relatório relativo a 2021, lançado na quinta-feira (02.06), o departamento liderado pelo chefe da diplomacia dos Estados Unidos, Antony Blinken, denuncia perseguições contra minorias religiosas na China, Afeganistão, Birmânia e Arábia Saudita.
No capítulo dedicado a Moçambique, o Departamento de Estado lembra que os ataques de grupos extremistas, em particular o grupo Estado Islâmico em Moçambique (ISIS-M), continuaram ao longo do ano passado contra forças governamentais e populações na província de Cabo Delgado, no norte do país.
Insurgência e reposta do Governo
A província de Cabo Delgado é aterrorizada desde 2017 por rebeldes armados, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.
Organizações não-governamentais, órgãos de comunicação social e organizações de direitos humanos criticam fortemente a resposta do Governo a este conflito, que consideram exacerbar os ressentimentos existentes entre populações historicamente marginalizadas de maioria islâmica, sublinha o relatório.
Além disso, alguns responsáveis governamentais, observadores e administradores de campos de deslocados notam que, como os ataques extremistas ocorrem em zonas de maioria muçulmana, muitas das vítimas são muçulmanas.
Apesar de os combatentes do ISIS-M dizerem que atacam sobretudo cristãos e aldeias cristãs, os relatos do terreno contam que na prática eles fazem pouca distinção entre as vítimas, visando tanto comunidades muçulmanas como cristãs.
O relatório recorda que o ISIS-M prometeu publicamente fidelidade ao grupo terrorista Estado Islâmico em junho de 2019 e desde então reivindicou mais de 30 ataques.
Radicalização
Segundo analistas, refere o documento, jovens rapazes que regressam do estrangeiro após estudarem o islão e que seguem uma forma mais austera da religião do que aquela que é praticada em Moçambique contribuem para a radicalização da juventude.
Segundo dados do instituto de estatística moçambicanos, referidos no relatório, 27% dos 30,9 milhões de habitantes do país são católicos, 19% são muçulmanos, 17% evangélicos ou cristãos pentecostais, 16% cristãos sionistas, 2% anglicanos e menos de 5% judeus, hindus e Baha'i. Os restantes 14% não se identificam com qualquer religião.
Uma percentagem significativa da população adere a crenças indígenas sincréticas, uma categoria não incluída nas estatísticas governamentais, caracterizada por uma combinação de práticas tradicionais africanas e aspetos do cristianismo ou do islamismo.
Devido à fraca fiabilidade dos censos, os líderes muçulmanos alegam que a sua comunidade, concentrada no norte do país, representa 25 a 30% da população moçambicana, sublinha o relatório.