Cabo Delgado: Empresa ruandesa vai entrar no negócio do gás?
7 de março de 2022De acordo com a plataforma Africa Intelligence, "a construtora ruandesa NPD juntou-se, à última da hora, à lista de empresas que concorrem para a realização de trabalhos preparatórios no projeto de gás em Moçambique". A NPD, vista como próxima do Presidente do Ruanda, Paul Kagame, é uma das maiores construtoras do país, destacando-se em obras de grande vulto como barragens, estradas e pontes.
Reagindo ao anúncio, o diretor da organização não-governamental Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), Adriano Nuvunga, comenta: "Já estamos a ver os ruandeses, que disseram inicialmente que vinham para aqui ajudar, mas já se estão a começar a beneficiar [do negócio do gás]".
Interesses económicos por detrás da solidariedade
Desde a entrada das tropas ruandesas em Cabo Delgado, em meados de 2021, para ajudar Moçambique a combater a insurgência, que não se conhece o acordo assinado entre Maputo e Kigali para o feito. Aliás, nem o Parlamento moçambicano foi ouvido a respeito, o que causou contestação.
Por isso, a atuação, considerada pouco transparente, é frequentemente criticada por diversos setores da sociedade. Para o académico João Feijó, "a prova dos nove" em relação a certa suspeita já é visível: "Esta pode ser uma notícia que fundamenta a ideia de que a motivação ruandesa para intervir em Cabo Delgado não está relacionada com um dever pan-africanista e de solidariedade para com Moçambique, como vinha sendo apregoado", considera.
Segundo Feijó, esta pode ser "uma decisão enquadrada numa estratégia económica de entrada no negócio do gás e de aproveitamento de empreitadas que vão surgir depois da implementação da Total".
As movimentações da TotalEnergies
O Africa Intelligence afirma ainda que "a gigante francesa TotalEnergies tem uma dívida a pagar ao Ruanda pelo seu papel no restabelecimento da segurança na província de Cabo Delgado", algo há muito apontado por vários setores, porém nunca confirmado por nenhum dos governos e nem mesmo pela Total.
Na senda do adágio popular "não há almoços de graça", Feijó sublinha que as relações internacionais são movidas por interesses. "Mais tarde ou mais cedo, iríamos perceber a relação económica que existe nesta estratégia ruandesa, e começamos agora a ver", afirma.
A Total, que exige garantias de segurança para voltar a operar em Cabo Delgado, lugar que abandonou em 2021 devido à escalada dos ataques insurgentes, tem consolidado cada vez mais as suas relações com o Ruanda. Em finais de janeiro assinou um memorando de entendimento com Kigali para o desenvolvimento de projetos no setor energético.
Será esta uma oportunidade para que Kigali continue a obter os pagamentos pela sua intervenção armada em Cabo Delgado?
Enquanto a resposta não surge, outros receios vão surgindo em Moçambique, como por exemplo, de que Maputo passe a curvar-se a Kigali devido a uma suposta dívida pela intervenção militar ruandesa, cujos resultados têm sido bastante elogiados.