Fraca presença do Estado facilitou presença de insurgentes
19 de junho de 2020O investigador Sérgio Chichava, do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) explica que "são indivíduos estrangeiros que teriam vindo para Moçambique e que, fugindo da ofensiva das tropas congolesas e das Nações Unidas, (...) teriam entrado em Moçambique e escolhido Cabo Delgado porque demonstra umas similitudes com o leste da República Democrática do Congo, ou seja, uma zona rica em recursos minerais e uma zona de fraca presença do Estado".
O investigador moçambicano falava durante uma conferência virtual intitulada "A Dimensão Interna e Externa do 'Al-Shabab'".
Chichava acrescentou que a província "tem sido usada como porta de entrada por vários migrantes ilegais" e que "alguns estudos indicavam que em Cabo Delgado entravam, por dia, cerca de 500 pessoas" oriundas de países próximos de Moçambique -- incluindo dos Grandes Lagos.
Para o investigador, Cabo Delgado assumiu-se como "um local propício" para o Al-Shabab se instalar. "Havia já indivíduos moçambicanos que estavam lá a defender um Islão radical", vincou. Chichava apontou ainda que há relatos de que muitos dos integrantes do grupo islâmico na região são da Tanzânia, "mas não quer dizer que a Tanzânia seja a base do Al-Shabab".
Criação de uma sociedade regida pela sharia?
Eric Morier-Genoud, investigador da Queen's University Belfast, considerou que o grupo islâmico é uma seita que pretende instituir "uma sociedade regida pela 'sharia'.
"A ideia de uma seita é que é um grupo de religiosos que sai da sua cidade e decide distanciar-se do Estado e da sociedade para construir uma sociedade deles -- uma contra sociedade com as regras deles --, e os Al-Shabab correspondem exatamente a essa definição sociológica", afirmou o investigador.
Para Chichava, apesar de ter uma origem interna, o grupo armado está a desenvolver uma forma de internacionalização.
"Embora tenha uma origem interna, aos poucos estamos a ver uma evolução da internacionalização. Se olharmos para o Al-Shabab, vemos que é composto também por indivíduos estrangeiros", apontando que há presença de cidadãos de Burundi, Uganda e Tanzânia.
Os ataques armados começaram em outubro de 2017 e desde o início de 2020 são classificados pelas autoridades moçambicanas e internacionais como uma ameaça terrorista. Em dois anos e meio de conflito estima-se que já tenham morrido aproximadamente 600 pessoas e que cerca de 200 mil já tenham sido afetadas, sendo obrigadas a procurar refúgio em lugares mais seguros.