Cabo Verde: A liberdade de imprensa está a retroceder?
3 de maio de 2023Em Cabo Verde, a precariedade laboral dos jornalistas e a falta de autonomia financeira dos órgãos de comunicação social são apontadas como as principais ameaças à liberdade de imprensa, no país, que é visto como modelo de democracia em África.
Em 2022, dois jornalistas e as respetivas empresas para as quais trabalhavam, foram constituídos arguidos pelo Ministério Público. Já em fevereiro deste ano, o jornalista Geremias Furtado, também Presidente da Associação Sindical dos Jornalistas de Cabo Verde, AJOC, foi demitido após criticar a gestão da agência nacional de notícias, Inforpress.
Em declarações à DW, o responsável da AJOC sublinha que esses acontecimentos fragilizam a liberdade de imprensa no país.
"O facto de Cabo Verde ter caído do vigésimo sétimo para o trigésimo sexto lugar no ranking internacional da liberdade de imprensa em 2022, é um sinal preocupante para a saúde da liberdade de imprensa e da democracia em Cabo Verde. Isso mostra que, em comparação com outros países, a situação da liberdade de imprensa no país pode estar a piorar", disse.
Liberdade estagnada
Para o investigador e professor de Comunicação na Universidade de Cabo Verde , Silvino Évora, a liberdade de imprensa no país está estagnada. Aponta como causa, a falta de autonomia financeira dos órgãos de comunicação social que, muitas vezes, ficam atrelados à publicidade de empresas e aos apoios do Estado.
"De entre todas as questões, as que eu acho que são mais preocupantes a nível da garantia da liberdade de imprensa em Cabo Verde, tem a ver, sobretudo, com as questões económicas (...), porque ela é algo permanente. Ou seja, o défice da economia da comunicação e o défice da capacidade do mercado responder aos desafios das empresas de comunicação é uma coisa estrutural", disse.
Independência financeira
Silvino Évora frisa que para que haja liberdade de imprensa, é preciso haver independência financeira dos meios de comunicação.
"É um problema, porque, quando não se tem autonomia financeira, muito dificilmente se consegue garantir uma liberdade de imprensa plena como, efetivamente, a Constituição da República institui", considerou.
A falta de autonomia financeira dos órgão de comunicação social também preocupa a AJOC que acrescenta a precariedade laboral de muitos jornalistas como outra séria ameaça à liberdade de imprensa.
"A falta de estabilidade financeira e de condições de trabalho adequadas pode levar à dependência dos meios de comunicação social em relação às fontes de financiamento externos, como as empresas privadas ou governamentais. Isso, no nosso ponto de vista, pode resultar em conflitos de interesse e uma maior vulnerabilidade dos meios de comunicação à pressão política e económica", disse.
A AJOC diz que tem trabalhado para conscientizar as pessoas sobre a liberdade de imprensa e defender os direitos dos jornalistas no país. Para o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, que se assinala a 3 de maio, a associação sindical tem agendada uma conferência na cidade da Praia, para assinalar a data.