Cartoonistas de lápis em riste contra ataque a jornal
8 de janeiro de 2015Depois de ouvir a notícia do ataque aos escritórios do jornal francês Charlie Hebdo, o cartoonista angolano Sérgio Piçarra pegou no lápis e desenhou uma nova caricatura: um homem encapuzado a cortar ao meio, com um sabre, um lápis que sangra.
O colaborador do site de notícias Rede Angola diz que o ataque, em que morreram 12 pessoas, é um duro golpe contra a liberdade de expressão.
"Estou ainda chocado com toda esta situação", diz em entrevista à DW África. "Nada fazia exatamente prever que as coisas chegassem a este ponto, embora já tivessem havido sinais de perseguição e violência em relação ao jornal."
O semanário satírico francês é conhecido pela sua linha editorial "politicamente incorreta" e que várias vezes feriu susceptibilidades. Por exemplo, quando o jornal decidiu publicar uma caricatura que já saíra na Dinamarca em que o profeta Maomé aparecia com um turbante-bomba. O desenho despoletou a ira de alguns setores da comunidade muçulmana em França.
Ainda assim, concorde-se ou não com a linha editorial do jornal, nada dá o direito de tirar a vida a uma pessoa, sublinha Sérgio Piçarra: "É necessário que a liberdade seja preservada, gostemos ou não."
O cartoonista angolano diz estar bastante consternado com o ataque, até porque tem havido "outras situações". Na África do Sul, o conhecido cartoonista Zapiro "tem enfrentado uma série de processos judiciais movidos pelo próprio Presidente do país. E também eu vivo num país com alguns problemas de liberdade de expressão e onde também já houve um jornalista assassinado, além de outras situações", diz.
Cartoons multiplicam-se
Piçarra não foi o único a pegar no lápis ou na caneta em revolta contra o ataque em Paris. Em jornais e na internet, cartoonistas e jornalistas do mundo inteiro têm prestado homenagem às vítimas e à publicação francesa. Seja publicando mais cartoons ou condenando o sucedido em editoriais.
O jornal norte-americano "New York Times" publicou, por exemplo, um cartoon de Patrick Chappatte onde se lê: "Sem humor estamos todos mortos."
Por seu lado, o diário berlinense B.Z. publicou uma série de capas do semanário francês Charlie Hebdo.
O cartoonista queniano Gado divulgou na internet o desenho de uma grande mão, em que o dedo do meio é um lápis.
Em vez de calar a imprensa, o ataque aos escritórios do jornal francês parece dar aos cartoonistas e jornalistas ainda mais força para continuar a fazer o seu trabalho, refere Emildo Sambo, chefe de redação do jornal moçambicano A Verdade.
"Para mim, este foi um plano hediondo de ataque à liberdade de expressão e comunicação que, de certa forma, fracassou. Amanhã, as pessoas que acreditam neste tipo de comunicação satírica estarão de novo na rua com as suas publicações", afirma Sambo. "Acredito que os jornalistas não se vão deixar vencer pelo medo."
Reações
Entretanto, em comunicado, o Governo cabo-verdiano juntou-se ao coro internacional de condenação ao ataque em Paris que "consubstancia um atentado vil ao Estado de Direito e à liberdade de imprensa".
A Liga Guineense dos Direitos Humanos também condenou "sem reservas" o ataque contra o jornal francês. Numa nota divulgada à imprensa, a Liga diz que "aqueles que cegamente alimentam o obscurantismo e a intolerância religiosa conseguiram calar as vozes incómodas do semanário Charlie Hebdo, mas não vão conseguir minar a conquista secular da liberdade de imprensa no mundo".