Conselheiro do Presidente guineense detido no Brasil
20 de novembro de 2019Um conselheiro do Presidente guineense, José Mário Vaz, foi detido junto com mais três pessoas esta terça-feira (19.11) no estado brasileiro da Bahia, por suspeitas de organização criminosa. As autoridades brasileiras investigam suposta falsificação de documentos para posse ilegal de terras.
Segundo a decisão do juiz Og Fernandes, do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), "o plano criminoso parece ter sido idealizado por Adailton Maturino dos Santos", o conselheiro do chefe de Estado guineense, e está sustentado na "atuação de advogados e funcionários do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia".
Estes atuavam num "gigantesco processo de 'grilagem' na região do oeste baiano, com o uso de laranjas [testas-de-ferro] e empresas para dissimulação dos ganhos ilicitamente auferidos". A 'grilagem' é, no Brasil, a falsificação de documentos para ilegalmente tomar posse de terras devolutas ou de terceiros. O magistrado judicial diz ainda, citando o Ministério Público (MP) brasileiro na sua decisão, datada de 30 de outubro último, que a área territorial alvo de 'grilagem' supera os 800 mil hectares.
Além de Maturino dos Santos, foram igualmente detidos os advogados Antônio Roque do Nascimento Neves e Márcio Duarte Miranda, além de Geciane Souza Maturino dos Santos, também ela advogada e mulher do conselheiro do chefe de Estado.
"Falsos cargos"
Segundo informação dada à Lusa pela Embaixada da Guiné-Bissau no Brasil no mês passado, Adailton Maturino dos Santos é diplomata e conselheiro especial do Presidente da República daquele país africano, José Mário Vaz.
Contudo, o magistrado Og Fernandes nega que o guineense exerça cargos diplomáticos no país sul-americano. Maturino dos Santos "apresenta-se falsamente como cônsul da Guiné-Bissau, como juiz aposentado e como mediador, além de ser apontado como juiz arbitral pela esposa sem que, na verdade, tenha exercido ou possua qualificação profissional para exercer qualquer dessas funções e cargos", frisou o juiz.
"O Ministério das Relações Exteriores do Brasil informa que o Governo brasileiro não autorizou, em qualquer momento, a designação de Adailton e Geciane como agentes diplomáticos ou consulares da Guiné-Bissau, sendo falsas as informações enviadas pela embaixada" do país africano, acrescentou o tribunal, que cita o executivo do Brasil.
Segundo a assessoria de imprensa do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau, recentemente a Presidência daquele país africano pediu a atribuição de um passaporte diplomático a Adailton Maturino dos Santos, na qualidade de "Conselheiro de Estado". Porém, o pedido foi negado pela própria ministra dos Negócios Estrangeiros guineense.
Movimentações bancárias
O STJ analisou também as movimentações bancárias de Adailton Maturino dos Santos, tendo concluído que o guineense tem cerca de 15,5 milhões de reais (3,34 milhões de euros) sem origem ou destino definidos. O tribunal diz ainda que o casal guineense "tem tentado promover a transferência de variados veículos de alto luxo para a Embaixada da Guiné-Bissau, com o claro intuito de blindagem [proteção] patrimonial".
"Como já está amplamente demonstrado, são gravíssimos os delitos apurados neste inquérito, de entre eles, corrupção passiva e ativa, formação de organização criminosa, e até mesmo possíveis assassinatos, delitos estes que se alongam no tempo e comprometem a credibilidade do poder judiciário, assim como o direito à propriedade privada", indicou o juiz, justificando a medida de prisão temporária pelo prazo de cinco dias.
O esquema de 'grilagem' de terras investigado pela Polícia Federal e pelo MP, alegadamente liderado pelo guineense, levou também ao afastamento de quatro desembargadores do Tribunal de Justiça baiano e dois juízes da primeira instância. Entre os desembargadores afastados, está o presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, Gesivaldo Nascimento Britto.
Os investigadores suspeitam que os seis juízes e desembargadores integrem uma organização criminosa composta por advogados e produtores rurais que atuavam na venda de decisões para legitimar a venda ilícita de terras no oeste do estado da Bahia.