Covid-19: Prostitutas denunciam maus tratos da polícia
16 de junho de 2020Segundo as mulheres entrevistadas pela DW África, quando os polícias escalam as suas residências, arrombam as portas recolhendo-as para a esquadra mais próxima. Só escapa quem tiver dinheiro para lhes oferecer.
Os polícias têm afugentado os clientes e por isso as trabalhadoras do sexo têm estado a passar fome. Por causa das dificuldades financeiras que elas enfrentam, as autoridades pedem maior colaboração com essa camada social para se determinar o horário de trabalho e de recolha.
Isabel S. conta que os polícias "costumam perseguir e recolhem [os nossos pertences]. Eles falam que, se não queremos dormir nas celas, temos que tirar 'dinheiro de refresco'. Alguns [polícias] costumam abrir portas à força e levar dinheiro. Outros, levam as mulheres até as esquinas, fazem sexo, não dão nada, e devolvem-nos", conta.
A trabalhadora do sexo diz ainda que os polícias costumam chegar por volta das 17h, impondo restrições ao trabalho. " [...] às 17 horas ou 18 horas, já estão aqui a nos proibir, e quando entramos, rompem a porta e nos batem lá dentro de casa", desabafa.
Covid-19: Movimento reduzido
As mulheres contam que o movimento reduziu-se de forma significativa numa altura da pandemia da Covid-19 e, por isso, a vida tornou-se difícil para elas. "Não há movimentação, pois quando os homens veem a presença policial, fogem. Ninguém vem mais. Imagina, eles chegam às 19 horas e você tem apenas 50 meticais. Tiras o valor e entregas, temendo ir à esquadra. Que vantagem você vai ter?", questiona uma das mulheres em Chimoio.
Cristina L., outra prostituta, relata que quando os polícias chegaram, ela dormia com a filha. Ordenaram que abrisse a porta, mas ela negou. Os homens então partiram porta. Ao entrarem, disseram-lhe que fosse até a esquadra. "Quando chegam aqui, pegam-te e dizem: 'dorme aqui' e te dão chambocos".
Luís J., um dos jovens que frequenta aquelas esquinas, foi abordado pela nossa reportagem. Ele condenou a atitude da polícia e pediu a intervenção das instituições competentes para solucionar o sofrimento das trabalhadoras.
"Quando [os polícias] encontram as mulheres com um homem, levam o homem que estiver com ela para fora e batem nele. Esse comportamento é negativo, pois muita gente vive disso” – condenou.
Moisés Fome Niparange é o proprietário de uma das casas arrendadas pelas prostitutas e disse que a polícia tem "triturado" as trabalhadoras do sexo, algo que não se pode fazer. "Na minha casa, já entraram e arrancaram telemóveis e dinheiro de uma das minhas clientes", relata.
Papel da polícia é fiscalizar
O poprietário argumenta ainda que "a polícia tem que desempenhar o seu papel de fiscalizar. Quando deixa de fazer isso e passa a entrar nos quartos, levar telefones e dinheiro, já não é a lei. Será isso o que falou o Presidente da República? Os polícias estão a trabalhar muito mal mesmo", desabafou.
O chefe do departamento de Relações Públicas no comando provincial da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Manica, Mário Arnaça, congratulou a coragem das trabalhadoras do sexo em denunciar os comportamentos desviantes dos polícias.
Arnaça disse que os problemas enfrentados por essas mulheres serão solucionados a curto prazo. "Recebemos a reclamação e vamos tomar medidas severas contra os agentes que fazem serviços à margem da lei".
Segundo o membro da PRM, a polícia vai aumentar esforços no sentido de observar o cumprimento das medidas de prevenção contra a Covid-19. "A presença policial neste local vai ser crucial para observar se as medidas de prevenção contra a Covid-19 estão a ser cumpridas. Não havendo o cumprimento, a polícia terá que agir", explicou.
"Vamos apertar o cerco - tolerância zero contra o incumprimento das medidas de prevenção da Covid-19. O erro de um é fatal para todos", disse a fonte policial.
Há dias, a polícia anunciou ter desmantelado mais de 70 prostíbulo e dispersou dezenas de prostitutas que operavam em vários pontos da província. Entretanto, disse que durante a operação nenhuma trabalhadora do sexo foi detida em virtude de não terem oferecido resistência, e por não terem desobedecido as ordens de dispersão.