Acordo extrajudicial entre Moçambique e bancos é "racional"
12 de julho de 2024O novo acordo prevê a redução da "exposição do Estado" de 1,4 mil milhões de dólares para 220 milhões de dólares. Porém, o Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD) considera que o acordo prejudica o Estado e protege líderes da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), o partido no poder.
Em entrevista à DW África, Borges Nhamirre, investigador do Centro de Integridadde Pública (CIP), faz uma avaliação diferente e considera que o Estado moçambicano fez bem em assinar os tais acordos. Diz ainda que a estratégia do Governo funcionou bem desde início do processo há cinco anos.
DW África: Acha que a sentença em Londres vai ditar a derrota do Estado moçambicano?
Borges Nhamirre (BN): Esse caso começou há muito tempo, Moçambique iniciou o processo em 2019. Muita coisa mudou desde lá. Desde então, o número dos réus que eram demandados por Moçambique reduziu-se devido aos acordos entre Moçambique e o Credit Suisse, significa que o Credit Suisse e as suas filiais saíram do processo. Então, já reduziu o número de réus, mas também a morte de Iskander Safa [dono da Privinvest] não o afasta, porque o seu património vai responder por si, tratando-se de um caso civil de responsabilidade civil. O acordo do VTB não afeta muito o processo porque Moçambique não tinha iniciado nenhum processo contra o VTB. Tinha acontecido que o VTB havia iniciado um processo contra Moçambique. Então, esse processo também deixa de existir. Neste momento, em termos técnicos, significa que, a sentença que for anunciada pelo Tribunal, há-de decidir a relação do Moçambique versus Privinvest, mais os três antigos colaboradores do Credit Suisse.
DW África: Ou seja, não há grande impacto dos acordos entre o governo moçambicano e os bancos neste processo?
BN: Não. O principal impacto é a saída de três réus, que são os bancos do grupo Credit Suisse, essencialmente, mais nada. Porque, ao todo, era um processo com 12 réus, dos quais Moçambique exigia uma indemnização. Então, com a saída do Credit Suisse, baixa o número de réus, mas também baixa o valor que Moçambique estava a exigir.
DW África: Organizações não-governamentais (ONG) de Moçambique entendem que acordos extrajudiciais protegem a FRELIMO, o partido no poder. A ser verdade, como proteger os interesses do Estado moçambicano?
BN: Tecnicamente, esses acordos são muito bons para Moçambique, porque significa que Moçambique deixa de estar em default, deixa de ser incumpridor. Tecnicamente, teoricamente, significa que Moçambique volta a ter acesso ao mercado internacional de capitais. É verdade que os acordos não são suficientes. Mas penso que é um bom acordo. Com relação aos dirigentes da FRELIMO, não eram réus lá naquele processo em Londres. Os conhecidos que são réus, são réus no processo nos Estados Unidos da América, que também não são, necessariamente, dirigentes da FRELIMO, tirando o Manuel Chang, são pessoas que ocuparam cargos relevantes do Estado.
Então, eu penso que essa afirmação faz muito sentido para a advocacia, mas, do ponto de vista técnico, a maldade dos acordos não está, necessariamente, aí. Penso que nós podemos dizer que esses acordos foram maus para Moçambique, porque Moçambique tem de pagar dinheiro, tem de pagar cerca de 366 milhões de dólares para alcançar esses acordos. Mas, ainda assim, se compararmos com o caso da dívida da Ematúm, que não teve acordo, Moçambique tem que pagar muito mais.
DW África: Ou seja, também concorda que valeu a pena tanto investimento nessa ação de Londres, sendo que agora o governo chega a acordos extrajudiciais com aqueles a quem acusavam?
BN: Se Moçambique não tivesse iniciado este processo em 2019, esses acordos não teriam sido alcançados. Então, esses não são acordos voluntários: as partes sentiram-se obrigadas a entrar em acordo - refiro-me aos bancos, porque estavam em processo no tribunal. Nesse aspecto, foi muito racional a decisão de Moçambique de iniciar o processo para forçar que entrassem em acordo.