Dívidas ocultas: Advogado na mira da Ordem por violar sigilo
9 de dezembro de 2021A Ordem dos Advogados de Moçambique, assistente do Ministério Público no julgamento das dívidas ocultas, em Moçambique, requereu na terça-feira (07.12) ao tribunal a extração de certidões que contêm alegadas violações de sigilo profissional do advogado e declarante Imran Issa.
Na qualidade de declarante, Issa teria exposto conversas sigilosas em sede de tribunal que teve em tempos com os réus Ângela Leão e Fabião Mabunda sobre o recebimento de subornos do grupo Privinvest, envolvido nas dívidas ocultas.
"É do entendimento do assistente que se justifica que seja ordenada a extração de certidões das declarações prestadas pelo ilustre colega doutor Imran Issa e consequente remessa ao Concelho Jurisdicional da Ordem para os efeitos julgados pertinentes", afirmou o advogado Filipe Sitoe, em representação da Ordem dos Avogados, em sede de tribunal.
Segundo a imprensa moçambicana, Imran Issa solicitou autorização à Ordem dos Advogados, a 29 de setembro, para cessar a obrigação de sigilo profissional relativamente aos ex-constituintes - uma lista que inclui também António Carlos do Rosário, antigo diretor da inteligência económica da secreta moçambicana, que o advogado disse ter tido contacto com o Presidente Filipe Nyusi na prisão, durante o seu depoimento em tribunal. A Ordem, diz a imprensa, concedeu autorização no mesmo dia em que Issa apresentou o pedido.
Issa "em nome da verdade"
Perante o requerimento da OAM ao tribunal, o declarante Imra Issa afirmou que fez o pedido "em nome da verdade" e que se a ordem viu erro nisso pode retirar-lhe a carteira profissional. "Se a ordem dos advogados me quer retirar ou penalizar por esta questão, tenho problemas nenhuns. Eu vim aqui apenas esclarecer a verdade", garantiu.
"Por que estão a dificultar, qual é o problema? Eu vim aqui para esclarecer, se há alguma ilegalidade que estão a verificar, não tem problema nenhum. Punem o advogado, estou disponível, para mim há questões mais importantes. Se eu estou a violar os estatutos, penalizem o advogado, não estou preocupado", frisou.
O juiz da causa, Efigénio Batista, indeferiu o pedido da Ordem.
"Esta é uma prerrogativa que existe no código de processo penal. Havendo matérias de natureza sigilosa da pessoa, em virtude do seu ofício, não o pode fazer de forma livre. Não devem ser interrogados ou trazer essa situação de resguardo por conta da profissão. Ele [Imran Issa] tinha a obrigação de comunicar à ordem e solicitar essa autorização", explicou o advogado Job Fazenda, comentando o caso na STV, parceira da DW.
Sem margem de manobra
Segundo Fazenda, quando declarações de réus são expostas por um advogado, o cliente sente-se desconfortável. E Issa já foi defensor de um dos réus considerados "cérebros" do escândalo das dívidas ocultas, António Carlos do Rosário. O causídico denunciou ameaças que terá recebido.
"Alguém que foi indiciado pelo tribunal para prestar informações, em princípio, não tem o campo de manobra que têm os réus. O réu pode chegar lá, ficar calado e não responder às perguntas e os declarantes já não têm estas prerrogativas", considerou Fazenda.
O tribunal de Maputo prossegue com a audição de declarantes e nesta quinta-feira (09.12() deverá ouvir a antiga vice-ministra das Finanças Isaltina Lucas.