Egito: Partidos islâmicos arrancam 3ª fase das eleições com vantagem
3 de janeiro de 2012A última etapa das eleições legislativas no Egito teve início nesta terça-feira (03/02), com 14 milhões dos eleitores de nove províncias a serem chamados às urnas nas próximas 48 horas para eleger os últimos deputados da Assembleia do Povo (Câmara Baixa). A eleição, iniciada a 28 de novembro, é a primeira desde a queda do presidente Hosni Mubarak, em fevereiro de 2011.
Os eleitores de algumas províncias do Alto e Médio Egito, com uma forte população cristã copta, são também chamados às urnas, num clima marcado nos últimos meses pelo agudizar das tensões com a população muçulmana.
Durante o dia, as assembleias de voto registaram uma forte afluência às urnas particularmente na província do Sinai e nas regiões rurais onde o desejo de democracia é muito forte.
Entusiasmo e esperança
"Espero que em breve tenhamos finalmente a liberdade e a paz. Queremos somente uma vida normal", disse um dos eleitores egípcios que aguardava pacientemente a hora de votar na longa fila de uma das assembleias eleitorais.
"Até fevereiro espero que a composição do parlamento esteja concluída", disse outro eleitor. "Durante muito tempo – acrescentou – tentamos com os liberais e os comunistas, mas eles arruinaram o nosso país. Agora parece que muitos escolhem os partidos islâmicos, mas, se eles não tiverem um bom desempenho, também serão retirados do poder."
Nesta terceira e última fase das eleições legislativas egípcias, os eleitores votam, nomeadamente na província do Sinai, região instável que faz fronteira com Israel e a faixa de Gaza e conhecida por importantes zonas turísticas, como Sharm el-Sheik.
Os resultados das duas primeiras fases, realizadas em novembro e dezembro, indicam uma predominância das formações islâmicas – Irmandade Muçulmana e salafistas – que conseguiram em conjunto cerca de 65% dos votos.
Somente dois terços dos assentos parlamentares são atribuídos às listas partidárias e uma terceira aos candidatos independentes.
Muçulmanos dão mote para a mudança
A Irmandade Muçulmana mostra-se consciente desta oportunidade histórica e já se posiciona como o partido do arco governativo.
Um dos seus candidatos, Mohammed el-Biltagi, sublinha que a nova câmara legislativa "é uma consequência da revolução" competindo-lhe "revogar as leis" do regime Mubarak e terminar "com o julgamento dos civis pelos tribunais militares."
"Quando falamos de justiça social, o papel do Parlamento será, por exemplo, discutir e aprovar os salários mínimo e máximo", adiantou el-Biltagi.
A eleição dos deputados à Assembleia do Povo deverá ser seguida, a partir de 29 de janeiro, da eleição da Choura, a câmara alta consultiva do Parlamento, até 22 de fevereiro.
Terminado o processo eleitoral, o Parlamento deverá proceder à designação de uma comissão encarregada de redigir uma nova Constituição, tarefa que muitos observadores classificam como uma "etapa-chave" da fase de transição pós-Mubarak.
O Egito deverá conhecer ainda antes dos finais de junho uma eleição presidencial, após a qual os militares prometeram entregar as rédeas do país a um poder civil.
Questões ainda em aberto
Esta última fase eleitoral no Egito coincidiu com uma nova audiência do processo do ex-Presidente Hosni Mubarak, detido preventivamente num hospital militar do Cairo, dedicada a tomar conhecimento dos fundamentos da acusação ao antigo homem forte do Egito.
Mubarak é acusado dos crimes de corrupção e de ter ordenado a morte de centenas de manifestantes durante a revolta popular contra o seu governo.
O escrutínio eleitoral desenrola-se num contexto político de grande tensão que, nos dois últimos meses, se caracterizou pela violenta repressão contra manifestantes e dissidentes do regime, principalmente no Cairo, ordenada pelo Conselho Superior Militar que transitoriamente governa o país.
O clima político agravou-se na semana passada com a investigação, ordenada pelas autoridades egípcias, às instalações de várias organizações não governamentais egípcias e estrangeiras, entre elas a Fundação Konrad-Adenauer, controlada pela CDU, maior partido da coligação que governa a Alemanha.
Berlim pressiona
O ministério alemão dos Negócios Estrangeiros anunciou nesta terça-feira ter enviado um emissário ao Egito, Volkmar Wenzel, após a ação das autoridades egípcias que provocou grande indignação em Berlim.
A partir de quarta-feira (04/02), Wenzel, um alto funcionário do MNE alemão, debaterá a situação com o MNE egípcio para esclarecer as acusações das autoridades egípcias sobre alegados "financiamentos estrangeiros ilegais" praticados pela fundação alemã.
Na última sexta-feira (30/12/2011), o governo alemão convocou o embaixador do Egito em Berlim para lhe comunicar que considerava "inaceitável" a investigação levada a cabo contra a Konrad-Adenauer Stifftung.
Autor: António Rocha
Edição: Pedro Varanda de Castro/Bettina Riffel