Eleições na Guiné-Bissau: "Queremos um Governo competente"
9 de junho de 2023O ativista dos direitos humanos Bubacar Turé diz, em entrevista à DW, que a receita para um mandato de sucesso do próximo Executivo é muito simples: será necessário nomear governantes competentes, recusar clientelismos e resolver problemas urgentes no país como a crise de insegurança alimentar, estimulando a economia.
Depois da vitória da coligação PAI - Terra Ranka nas eleições legislativas de domingo (04.06) com maioria absoluta, será agora fundamental "arregaçar as mangas" e promover o desenvolvimento do país, comenta Turé.
Mas o líder da coligação, Domingos Simões Pereira, não deverá tornar-se primeiro-ministro, refere o ativista: "Simões Pereira tem um projeto presidencial".
Por outro lado, o próximo primeiro-ministro terá de saber gerir muito bem a relação com o chefe de Estado, Umaro Sissoco Embaló, para que não se torne um "mero ajudante de campo", afirma Turé.
DW África: Como explica esta vitória expressiva do PAI - Terra Ranka?
Bubacar Turé (BT): Nestas eleições legislativas, o povo rejeitou claramente o retrocesso no Estado de Direito e nos indicadores democráticos. Foi por isso que, com a publicação dos resultados eleitorais, o povo saiu em massa às ruas de Bissau para comemorar uma espécie de liberdade. O que aconteceu ontem foi algo inédito no país.
DW África: Quais os principais desafios para o Parlamento e para o próximo Governo na Guiné-Bissau?
BT: Há desafios imensos. Estamos a atravessar um período de grave crise de insegurança alimentar. As nossas comunidades estão a passar fome, porque não há compradores para a castanha de caju, o principal produto que sustenta as famílias, sobretudo neste período. É um produto estratégico, que alavanca a economia. Por isso, o próximo Governo tem de arregaçar as mangas de imediato e priorizar a resolução dessa questão. Tem de tentar encontrar compradores para esse produto e, com isso, evitar uma catástrofe no país.
DW África: O que esperam os guineenses do novo Governo?
BT: Com a situação difícil, para não dizer caótica, em que a Guiné-Bissau se encontra neste momento, o país espera um Governo competente, que não acomode os interesses de clientelas político-partidárias. Terá de ser composto por pessoas competentes, sérias e visionárias, comprometidas com o interesse nacional, para poder estar à altura de resolver os problemas críticos com que o país se depara.
Mas há um obstáculo evidente: o relacionamento institucional com o Presidente da República, que tem uma certa aversão ao princípio fundamental de separação de poderes. Sendo assim, o próximo primeiro-ministro terá de ser alguém com habilidades políticas para criar pontes e saber dialogar com o Presidente da República. Deverá tentar criar "barreiras" para diminuir as pretensões que temos observado até aqui de querer reduzir o primeiro-ministro a mero ajudante de campo do chefe de Estado, violando as normas constitucionais.
DW África: Perante o atrito entre Domingos Simões Pereira e o atual Presidente da República, acha que ele deveria ser indicado ao cargo de primeiro-ministro?
BT: Creio que nunca esteve no horizonte de Domingos Simões Pereira a ambição de, nesta fase, ser primeiro-ministro da Guiné-Bissau. Domingos Simões Pereira tem um projeto presidencial e creio que a coligação tem figuras competentes no seu seio que poderão estar à altura de assumir essas funções.