Mali: Mercenários russos preocupam Alemanha e França
17 de setembro de 2021Há indícios que o Governo do Mali está a discutir uma operação paramilitar com a força mercenária russa "Wagner". As autoridades do Mali e da Rússia estarão prestes a assinar um acordo para esse efeito. O fato foi revelado pela agência de notícias Reuters no início da semana, causando polémica nos meios diplomáticos europeus.
A reação de Bamako foi imediata: o Governo quer expandir suas relações para garantir a segurança do país, mas ainda nada foi assinado com a Wagner, disse um porta-voz do Ministério da Defesa do país.
Não apenas vários milhares de soldados franceses estão estacionados no Mali, mas também 1.000 soldados do Exército alemão [Bundeswehr] estão no país para combater os extremistas islâmicos.
O Mali e a Rússia já trabalharam juntos no passado: em 1961, após a retirada de França, o primeiro Presidente do Mali, Modibo Keita, recorreu, entre outros, à antiga União Soviética com o pedido de treinar e equipar o Exército do Mali. Essa cooperação militar continuou até o início da década de 1990.
"A maior parte dos militares no poder no Mali foi treinada na Rússia e é próxima do Kremlin", disse o analista Mahamadou Konaté à DW. "Devemos ter cuidado para não enviar esses mercenários à ação, também por causa do risco de que eles possam cometer violações massivas dos direitos humanos", adverte.
Tropas alemãs no Mali
Já estão a chegar em França sinais sobre uma possível retirada das tropas do Mali. O envolvimento da empresa privada russa Wagner no Mali seria "incompatível" com a manutenção de uma força francesa, de acordo com o ministro das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian. O Ministério das Relações Exteriores da Alemanha também expressou grande preocupação.
A ministra da Defesa da Alemanha, Annegret Kramp-Karrenbauer, escreveu no Twitter que tais acordos entre Mali e Rússia contradiriam "tudo o que Alemanha, França, UE e ONU fizeram no Mali por oito anos", e ameaçou indiretamente retirar as tropas do país.
"O interesse da Rússia em novas vendas de armas é obviamente grande", disse à DW Christoph Hoffmann, membro do Parlamento alemão que representa o Partido Democrático Liberal da Alemanha (FDP).
O político acrescentou que o Governo alemão deve agora manter contactos intensivos com o Mali para resolver esta situação e que a Alemanha não deve continuar envolvida na missão da UE se houver um compromisso real do grupo Wagner. Katja Keul, membro do Partido Verde, também considera isso "fora de questão".
Denis Tull, da Fundação para Ciência e Política de Berlim, também expressou preocupação, dizendo que se a parceria com Mali for confirmada, será uma "aposta considerável". Quando a República Centro-Africana (RCA) chamou mercenários russos do grupo Wagner para ajudar em 2018, Paris imediatamente suspendeu suas atividades no país, explica.
Segundo o investigador, as atuais negociações do Governo do Mali com a Rússia também podem ser uma tentativa de aumentar a pressão - poucas semanas antes da cúpula África-França marcada para outubro - e de mostrar à França que outras alianças também são possíveis.
Em Bamako, Thomas Schiller, chefe da Fundação Konrad Adenauer, pediu um diálogo entre os países envolvidos. Ao mesmo tempo, porém, enfatizou que o Mali e outros países africanos são Estados soberanos. "Não é nosso trabalho dizer aos africanos o que é bom para eles. Cabe a eles definir isso e reformar seu sistema político e seu exército", disse Schiller à DW.
Kremlin nega envio de mercenários
O chefe da Fundação Konrad Adenauer disse que não estava surpreso: há muito tempo há rumores de um maior envolvimento da Rússia no Mali, especialmente na área de treinamento de segurança para as forças armadas, possivelmente também por meio de entrega de armas. O problema, diz Thomas Schiller, é que essas alegações nunca foram verificadas.
A agência de notícias Reuters relatou um acordo para enviar até mil mercenários russos ao Mali. Quando a DW abordou o Kremlin para confirmação, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, negou a informação.
Alguns sites russos informaram que mais de 1.200 mercenários russos já estavam no Mali. No entanto, essas plataformas de mídia são consideradas duvidosas e, de acordo com a investigação da DW, aparentemente são controladas por Yevgeny Prigozhin - um confidente próximo de Vladimir Putin - que supostamente chefia o grupo Wagner.
Crimes de guerra
Especialistas das Nações Unidas acusam os mercenários russos de cometer crimes de guerra na República Centro-Africana, num relatório apresentado ao Conselho de Segurança da ONU.
Em julho, uma investigação do "The Sentry" - um grupo de ativistas que investiga fluxos de dinheiro relacionados a atrocidades - e também da emissora internacional CNN - revelou possíveis crimes de guerra cometidos pelos mercenários na RCA.
O grupo russo também atua na Líbia e na Síria, onde também é acusado de graves violações dos direitos humanos.