EUA reduzem presença militar em África
23 de novembro de 2018Quando o número um do exército norte-americano para África falou ao Congresso, em março deste ano, quase suplicou aos membros do Capitólio para que o país mantivesse o compromisso com o continente.
"A longo prazo, os interesses dos EUA em África beneficiarão de nações estáveis e eficazes, Governos responsáveis, exércitos bem treinados e disciplinados e economias em crescimento", disse o General Thomas Waldhauser. "Os EUA têm de continuar em África".
Mas o Governo norte-americano parece estar a ir por um caminho diferente, pelo menos em parte. Na semana passada, o Pentágono anunciou que vai reduzir a sua presença militar em África em cerca de 10% nos próximos anos. Atualmente, os EUA têm cerca de 7 mil e 200 soldados e funcionários do exército no continente.
Novas prioridades
"A estratégia de defesa nacional foi reescrita em 2017 e com ela surge a mudança do foco militar para países como a China, a Rússia e outros", disse Candice Tresch, porta-voz do Pentágono, em entrevista à DW. "Neste sentido, o secretário da defesa ordenou uma revisão do número de unidades que combatem, atualmente, organizações terroristas em África", explicou.
No novo documento sobre a defesa norte-americana, publicado em janeiro, o combate ao terrorismo, que é o foco da maioria das missões militares norte-americanas em África, continua a ser considerado importante. Mas não é a prioridade. Com a nova estratégia, todos os comandos regionais dos EUA vão pesar a possibilidade de cortes.
O Pentágono tenta desvalorizar os efeitos das reduções propostas no continente africano: "Continuaremos a trabalhar para combater organizações extremistas violentas. Trata-se apenas de mudar o foco", garantiu Tresch.
A porta-voz do Pentágono recusou adiantar onde é que terão lugar as reduções. Os Estados Unidos mantêm uma base militar no Djibuti, mas têm forças a operar em vários países, incluindo a Somália, a Nigéria e o Níger.
Segundo a agência de notícias Reuters, a redução será feira nos próximos três anos e deverá incluir países como o Quénia, Camarões e Mali.
Mas além da redução do número de soldados em África, os EUA aparentam estar também a mudar de tática. Em setembro, o New York Times avançou que o país estava a considerar retirar todas as suas unidades anti-terrorismo do continente. Na sua comunicação ao Congresso norte-americano, o General Waldhauser sublinhou também que o papel principal das tropas norte-americanas em África é de formação e apoio.
Mudança além dos números
"Esta é uma abordagem estratégica que enfatiza as capacidades militares dos EUA aplicadas a um papel secundário, não como personagens principais do conflito. As operações de segurança pertencem quase exclusivamente às forças de segurança parceiras", explicou o general.
À DW, Candace Tresch adiantou que as forças no terreno passariam de "assessoria tática para uma estratégia abrangente onde partilhamos inteligência ou fornecemos treino".
As forças norte-americanas sofreram perdas em África, incluindo no Níger, em outubro de 2017, quando quatro soldados dos EUA foram mortos numa emboscada. O ataque lançou o envolvimento militar norte-americano para o centro do debate e da polémica nos Estados Unidos.
Os planos da administração Trump não são uma surpresa para analistas de segurança no continente. "Dada a estratégia ‘América primeiro', claro que os EUA iriam tomar a posição de mover as suas tropas para se focarem em ameaças que consideram mais importantes", considera Fonteh Akum, investigador do Instuto de Estudos de Segurança em Dakar.
Eficácia limitada
O envolvimento norte-americano em África tem tido uma eficácia irregular, diz Akum: "Se ouvirmos as autoridades de defesa norte-americanas, elas dizem que não tiveram sucesso, em alguns países, no treino de tropas para um nível em que poderiam avançar sozinhas para o campo de batalha. Apontam igualmente para o seu papel na Somália. Levaram a cabo ações contra a Al-Shabaab, mas a Al-Shabaab continua viva". Fonteh Akum considera que ainda é muito cedo para julgar os efeitos do plano dos EUA para reduzir as suas tropas, mas alerta para eventuais novas medidas. "Se pegarmos em 10% do pessoal norte-americano em África, cerca de 720 pessoas, e as realinharmos para a Rússia, a China, o Irão ou a Coreia do Norte, temos que nos questionar: será este número capaz de dar resposta ao tipo de ameaça que estes países podem significar? Não tenho a certeza. Portanto, se me perguntar, acho que nos podemos preparar para mais cortes no futuro".