Funcionários denunciam abusos de multinacional em Moçambique
25 de novembro de 2017Depois de ter interrompido as atividades por um ano, a Jindal reabriu a área de mineração de carvão mineral, em 2015, na província de Tete, no centro de Moçambique, ressentindo-se da crise financeira mundial e da baixa do preço do carvão mineral de coque no mercado internacional.
Aquando da reabertura, a multinacional indiana decidiu acabar com a distribuição de leite de limpeza, de máscaras de proteção de poeiras e contra cheiros fortes e terminar com a assistência medicamentosa aos trabalhadores.
No entanto, este ano, estima-se que mais de 30 trabalhadores sofreram acidentes de trabalho e contraíram várias as doenças ocupacionais.
"Um dos nossos colegas teve hemorróides, a doença atacou-o no local de trabalho e ele foi levado de ambulância para Songo. Porém, a operação em Songo não deu certo e o desfecho não foi bom", explicou Edson Manuel, um dos funcionários da Jindal.
"Temos o caso de Samson, a quem foi retirado o pulmão. Já Nelson Cassamo até hoje, além de ter a junta médica, tem um processo nas instâncias judiciais que não teve ainda solução", apontou o funcionário.
Segundo Edson Manuel, quem fica ferido na empresa é transportado de ambulância para Songo, onde fica sem qualquer apoio. "E assim o doente fica lá "ao deus dará". Está a imaginar um doente ser transportado de ambulância e depois fica lá doente sozinho?", questionou, lembrando que muitos trabalhadores não têm família por perto, porque vêm da capital moçambicana, Maputo.
Os funcionários acusam a empresa de dar privilégio aos trabalhadores estrangeiros. "Há muita diferença a nível de tratamento entre os nacionais e os estrangeiros. Em termos de tratamento de saúde, com o mesmo escalão, um moçambicano não tem direito a passagens aéreas quando, por exemplo, precisa de ser tratado em Maputo ou noutra província. O seguro de saúde é muito restrito, não se tem direito há quase nada", criticou Edson Manuel.
Doentes e sem apoio
Funcionário na Jindal, Nelson Cassamo viu˗se obrigado a usar fundos próprios para custear as despensas da doença que tinha, visto que a empresa o teria abandonado em pleno tratamento na cidade do Maputo.
Depois da junta médica, o empregado contou que a Jindal não quis obedecer às recomendações médicas, tendo-o obrigado a continuar com o trabalho forçado que em boa saúde exercia.
"Eu tive uma recomendação de ter serviços moderados e fazer medicação. Depois da junta médica, apresentei-me à empresa, que me encaminhou para as entidades superiores, uma vez que o caso já havia dado entrada na Procuradoria e no tribunal", contou o trabalhador.
A 30 de outubro deste ano, Edson Cumbucane, outro trabalhador da multinacional, fraturou um dedo da mão direita e ficou internado durante cinco dias no Hospital Rural de Songo. A Jindal não pagou as despesas do tratamento, ainda está em curso. E, segundo o trabalhador, avançou que não irá efetuar o pagamento do salário referente ao mês de novembro. Cumbucane ameaça apresentar queixa à justiça, caso não sejam pagos os salários dos meses em está em tratamento.
População também sofre
Nos povoados de Chissica, Cassoca, Bairro Cinco, Chirodzi e Nhantsanga, nas redondezas da área mineira, residem 289 famílias. Segundo a Lei de Minas, em vigor em Moçambique, as famílias deviam ter sido transferidas para uma outra área antes do arranque das operações.
A população já se queixou várias vezes às entidades governamentais sobre o problema de poluição causado pela mineradora. "Estamos a sofrer com a poeira que sai da empresa" e com a poluição do Rio Chirodzi, queixou-se Regino Manejo, líder do povoado de Chirodzi.
"Respiramos a toda a hora cheiro de carvão", acrescentou Regino Manejo, que disse ter enviado diversos e-mails para as autoridades competentes relatando os problemas das comunidades.
Multinacional suaviza problemas
Em contacto com a DW África, o director geral da Jindal, Tiwari Rajendra, nega que haja qualquer problema na região. "Não recebi qualquer e-mail. De qualquer forma, está tudo bem", afirmou Tiwari Rajendra ao telefone, disponibilizando-se para ir com jornalistas às comunidades.
Mas Titos Sitoe, administrador do distrito de Marara, reconhece que há problemas. "Como a empresa ainda não conseguiu terminar com o reassentamento, o relacionamento com as comunidades não pode ser dos melhores. As populações circunvizinhas têm problemas de sofrer com a poluição, sobretudo a população que está na zona de extração mineira", apontou Titos Sitoe.
O reassentamento seria a solução, segundo o administrador de Marara: "A grande preocupação das populações e do Governo é o reassentamento", sublinhou Titos Sitoe.