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Gracinda, a primeira mulher a relatar futebol em Emakhuwa

3 de julho de 2024

Uma mulher a relatar futebol em Emakhuwa? Sim, é verdade! A moçambicana Gracinda Caramage conta a sua trajetória no mundo da bola e como ultrapassa os discriminação numa área tradicionalmente dominada por homens.

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Gracinda Caramage
Gracinda Caramage diz que é preciso muita coragem e determinação para se destacar num mundo tradicionalmente dominado por homensFoto: privat

Gracinda Caramage, moçambicana e muito experiente, é relatadora de futebol.

Afirma que só com muita coragem e determinação é possível destacar-se num mundo tradicionalmente dominado por homens.

Além da discriminação, Gracinda enfrenta o desafio de encontrar termos adequados em Emakhuwa, uma das línguas locais mais faladas em Moçambique.

Em conversa com a DW, conta como começou sua trajetória no mundo do futebol com um microfone nas mãos.

DW África: Como começou a sua trajetória no mundo do futebol?

Gracinda Caramage (GC): Começou numa brincadeira. Fomos no campo e dissemos ‘que tal ir relatar o jogo na nossa língua?’. Mas parecia piada. Mesmo assim pensei ‘vamos lá experimentar’. Estava com uma colega e pedimos ao nosso chefe e disse que havíamos de fazer entradas, além de descrever o que estava a acontecer e fazer o relato em Emakhuwa. Então fomos. Não dominávamos muito bem o futebol, era por brincadeira mesmo. Não sabíamos, por exemplo, quando era uma falta ou não. Estávamos a iniciar. Mas fizemos o relato naquele dia e as pessoas gostaram, nos parabeneziram. Com o tempo surgiu essa ideia de fazermos relatos também na zona norte, na nossa língua, Emakhuwa.

DW África: Há quanto tempo faz relatos?

GC: Já há cerca de 15 anos.

Gracinda Caramage e José Carlos Roldão
"É preciso lutar contra a discriminação e convencer de que somos capazes", sublinha Gracinda Caramage, aqui ao lado do conhecido relatador José Carlos RoldãoFoto: privat

DW África: Foi bem aceite pelos colegas homens?

GC: Bom, não foi fácil. Os colegas da redação não foram um problema. O problema foi fora da redação, no campo. Recordo uma vez que fui fazer um relato em Nacala. É uma cidade onde há muita agitação e há muitos conflitos quando uma equipa perde, lançam-se pedras, mas fui lá mesmo assim. Então surgiu um golo para uma das equipas, relatei o golo, o árbitro validou e foi motivo de confusão. Começou-se a comentar coisas como ‘onde que você já viu uma mulher a fazer relatos?’ e que iriam fazer ‘ajuste de contas’ comigo quando eu saísse. Consegui ser forte, fiz o relato, mas só pensava em como iria no fim do jogo fazer as entrevistas. Foi um pouco difícil, mas acabou por correr tudo bem.

DW África: Como é que lida com a discriminação no campo do futebol?

GC: É preciso ser determinada, ter coragem, não ter medo, não ter medo de falhar. Porque se tens medo de falhar, não vais fazer bem o relato, porque tens medo das pessoas. Ao mesmo tempo que fazes o relato, as pessoas também estão a seguir o jogo. Temos de ter a certeza daquilo que estamos a dizer. Não pode criar dúvidas nas pessoas. É importante mostrar que conhecemos a área. Só com coragem podemos fazer um bom trabalho. É preciso lutar contra a discriminação e convencer de que somos capazes.

Relatadora moçambicana Gracinda Caramage em entrevista à DW

DW África: Algum homem já tentou descredibilizar o seu trabalho?

GC: Já tentaram fazer-me entender que não sei nada, que não sei fazer a leitura do jogo, mas eu não me deixei levar nessas ideias. Antes pelo contrário. Tive força para aprender cada vez mais.

DW África: E nunca pensou em desistir?

GC: Não, não posso desistir.

DW África: Faz relatos de futebol em Emakhuwa. É a primeira mulher em Moçambique a fazer relatos numa língua local que não seja o português?

GC: Sim, sou a primeira mulher aqui em Moçambique a fazer relatos numa língua local.

DW África: E quais são os desafios de fazer relatos de futebol em Emakhuwa?

GC: Primeiramente é preciso conhecer bem a língua, os termos. Há termos técnicos que temos de saber interpretar para que o ouvinte perceba o que estamos a dizer. Ao mesmo tempo que estamos a fazer o relato, estamos a ensinar. Porque é algo novo. As pessoas não estavam habituadas a ouvir relatos na língua local, há outras pessoas que se calhar não dominam o futebol e assim vão se familiarizando os termos e vão aprendendo.

DW África: E para casos em que não existem palavras equivalentes em Emakhuwa como é que faz?

GC: Nesses casos emprestamos ao português.

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Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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