Líder do MADEM-G15 "na mira" do regime de Sissoco Embaló
20 de junho de 2022O líder do segundo maior partido político na Guiné-Bissau, Braima Camará, afirmou, esta segunda-feira (20.06), que está a ser alvo de provocações e intimidações por parte do Ministério do Interior, que terá mandado afastar os elementos de segurança que o acompanham, retirando-lhe também as suas armas.
Camará é coordenador do MADEM-G15, partido que apoiou a candidatura de Umaro Sissoco Embaló à Presidência e um dos mentores do regime no poder. Mas no seu regresso a Bissau, no fim de semana, depois de 10 meses fora do país, Braima Camará foi impedido de usar o salão VIP do aeroporto e de proferir declarações aos jornalistas no interior do edifício, como era seu costume.
Correram denúncias de que os órgãos de comunicação social estatais também terão sido impedidos de cobrir a sua chegada, assim como o discurso que fez diante da sede do MADEM-G15. A direção-geral da Televisão da Guiné-Bissau (TGB) desmentiu a informação. Em comunicado, a estação frisou que "não recebe ordens da Presidência" e explicou que não cobriu o evento porque "na sua nova política de linha editorial, os eventos meramente políticos deixaram de ser prioridade".
Em declarações esta segunda-feira, antes de entrar para uma reunião, Braima Camará disse não ter dúvidas de quem esteja por detrás destes atos "intimidatórios".
"Tudo o que quero é ser parte da solução na Guiné-Bissau. Não quero problemas, porque tenho o povo e a verdade do meu lado. Fiquem descansados. Tudo o que se passa é provocação do Ministério do Interior, que não passa de intimidação. Mas a luta continua", afirmou o deputado, apelando aos militantes e simpatizantes do MADEM-G15 para não responderem às provocações para o bem do país.
Chamado a comentar o sucedido, o analista político Fransual Dias explicou à DW África que a "retirada da segurança pessoal" a Braima Camará constitui uma violação da lei de titulares de cargos públicos políticos. O jurista guineense considera ainda que a "tentativa de vulnerabilização de todos os que são opositores do atual regime" a que se assiste no país é motivo de preocupação.
DW África: Como podemos enquadrar a situação de Braima Camará?
Fransual Dias (FD): A ser verdade que ele foi alvo da retirada da sua segurança pessoal, estamos perante a violação da lei de titulares de cargos públicos políticos. Temos que ter em conta que Braima Camará é deputado da Nação.
DW África: Será que há restrições do exercício da atividade política na Guiné-Bissau, sobretudo limitação de exercício dos atores políticos, exercício da liberdade de imprensa, liberdade de expressão, como o próprio Braima Camará referiu quando chegou a Bissau?
FD: Nós temos assistido a uma tentativa de vulnerabilização de todos os que são opositores do atual regime, que vai desde a retirada de seguranças, raptos e espancamentos até a ataques com balas de fogo reais. Têm sido várias as denúncias neste sentido, tanto de deputados, como de ativistas. Somando mais este caso, não deixa de ser preocupante. O relatório do Índice de Democracia já tinha alertado para esta situação e, recentemente, também os Estados Unidos da América excluíram a Guiné-Bissau da lista de países da cimeira virtual sobre democracia, o que é muito preocupante. Braima Camará foi o mentor principal da candidatura do atual Presidente da República.
DW África: Nesse sentido, por que razão estará Braima Camará na mira do regime?
FD: Temos vindo a registar vários episódios de confrontação entre Braima Camará e o atual Presidente da República, que começaram o ano passado, aquando da remodelação governamental até [à polémica da revisão da] Constituição da República proposta pelo Presidente da República. Temos vindo a ver que, neste caso, há a constituição de duas agendas diferentes e, quando é assim, não pode deixar de haver conflito. E esse conflito de interesses chega ao ponto de antagonismos que constituem perigo para a integridade pessoal e moral de uma das partes - nesse caso, o Braima Camará.
DW África: Acha que o facto de o ministro do Interior, Botche Candé, ser líder de um partido político opositor do MADEM-G15 poderá condicionar a sua imparcialidade?
FD: Impondo a lei eleitoral o dever de imparcialidade e transparência eleitoral ao ministro do Interior que, neste caso, é um opositor e que tem tido um comportamento que cria bases a acontecimentos menos recomendáveis na democracia, de violação da integridade física e das liberdades fundamentais, são legítimas as opiniões que apelam à exoneração do ministro, que foi reconduzido nas suas funções. De facto, não deixa de ser uma preocupação.