Bissau: Marcação das eleições é "manobra" de Sissoco?
20 de janeiro de 2024A marcação de eleições das eleições na Guiné-Bissau é vista com suspeição pela sociedade e até como manobra de distração para a comunidade internacional, que já começa a estar atenta às inconstitucionalidades cometidas pelo Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló.
Após a destituição do Governo, em dezembro, o Presidente afirmou nesta sexta-feira (19.01) que pretende realizar consultas com a Comissão Nacional de Eleições para marcar as eleições, provavelmente em outubro/novembro, e disse também que não fechou o parlamento do país.
Mas a dissolução da Assembleia Nacional Popular e a destituição do Governo, no fim do ano passado, têm sido contestadas como inconstitucionais. Sissoco alega que a decisão foi tomada devido a tentativa de golpe e corrupção.
Em entrevista à DW, o analista político guineense Rui Jorge Semedo explicou se a marcação das novas eleições seria uma "tentativa de distração". E disse que, quanto à pressão interna pela reposição da constitucionalidade, o seu efeito é nulo.
Rui Jorge Semedo: [A marcação das eleições] não só é uma tentativa de distração. Com esta marcação, ainda não sei se são eleições legislativas ou presidenciais... porque, de acordo com o calendário eleitoral, está previsto para o ano de 2024 também eleições presidencias. Portanto, até se confirmar uma marcação de eleições , o Presidente continua a "navegar no mar das inconstitucionalidades". Portanto, é bom saber que a comunidade internacional está a acompanhar isso. A comunidade internacional sabe que a Guiné-Bissau tem este problema de cumprimento da constitucionalidade. Nós esperamos também que a comunidade internacional tome as devidas medidas para poder pressionar as autoridades nacionais a cumprirem com aquilo que está na nossa Constituição da República.
DW África: O alargamento do debate da crise guineense para um plano internacional preocuparia Umaro Sissoco Embaló?
RJS: Não sei se isso preocuparia, ou não. O que nós, guineenses, gostaríamos de ver é a comunidade internacional influenciar, talvez até obrigar, os atores nacionais a cumprir com as leis do país. Eu acho que é o mínimo que se espera e que se exige do Presidente. Nós esperamos também que a comunidade internacional possa fazer esta parte, de ajudar os guineenses.
DW África: Qual é o peso da contestação interna no contexto político atual?
RJS: Há um amordaçamento das contestações. As autoridades nacionais nunca permitiram que houvesse manifestação por parte da sociedade civil. Um dia antes de alguma manifestação anunciada, eles levam para a rua um aparato militar assustador, para desincentivar qualquer iniciativa de manifestação. Portanto, todo mudo está com medo. Poucas pessoas saem às ruas para exprimir o que pensam. Há um "medo" de enfrentamento democrático. E não há, até este momento, algum impacto que possa fazer o Presidente da República voltar atrás, mudando o seu decreto que dissolveu o parlamento e, com isso, permitindo que as instituições voltem a funcionar.
DW África: A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) debateu esta semana a situação política da Guiné-Bissau. Espera alguma ação concreta da CPLP?
RJS: Acho que seria bom, não é? Pois a CPLP, do ponto de vista cultural, é uma comunidade mais próxima da Guiné-Bissau. Do ponto de vista geográfico, é mais distante. Mas esperamos que a CPLP possa fazer o que está ao seu alcance, sobretudo levando este debate para as Nações Unidas - o que, talvez, possa vir a ter maior impacto.
DW África: Que desfecho antevê para a crise política guineense e até para a presidência de Umaro Sissoco Embaló?
RJS: O desfecho é o aprofundamendo da crise política institucional. Pelo menos é isso o que temos visto nos últimos tempos. A cada dia agrava-se, ainda mais, a fragilidade institucional na Guiné-Bissau, o risco de violência institucional e o aprofundamento da crise social, com o aumento da pobreza entre os cidadãos. Eu penso que isso será a consequência da luta pelo poder.