Hermínio Morais, o guerrilheiro que quer governar Maputo
8 de outubro de 2018"General Bob" - nome de guerra de Hermínio Morais - está de volta aos combates, agora nas urnas. Quer ser o próximo edil de Maputo. E o principal adversário deste major general na reserva da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) é Eneas Comiche, de 79 anos, que já foi presidente do município.
"A grande aposta da RENAMO é transformar o lixo em luxo nesta cidade", prometeu na sua primeira passeata na capital moçambicana, no arranque da campanha do principal partido da oposição. O candidato que veste a camisola da RENAMO para as eleições autárquicas de 10 de outubro diz que "é preciso olhar para o lixo como fonte de rendimento para criar mais empregos para as pessoas".
Natural do famoso bairro da Mafalala, na periferia da capital, o antigo comandante da guerrilha ocupava a segunda posição na lista da RENAMO em Maputo, mas com o afastamento de Venâncio Mondlane pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) ascendeu a número um. E Mondlane, que passou a porta-voz da campanha, tem ido com Hermínio Morais para todo o lado.
O apoio de Venâncio Mondlane durante as ações de campanha "foi uma estratégia que a RENAMO arranjou para emprestar a Hermínio Morais o carisma e a juventude que ele não tem", ao contrário de Mondlane, diz Francisco Carmona, editor do semanário Savana.
Hermínio Morais nem se preocupou em ter um manifesto eleitoral próprio: adotou o manifesto eleitoral de Mondlane, sublinha o jornalista analista político Fernando Lima. O diretor do "Savana" não tem dúvidas sobre o que acontecerá se o general na reserva for eleito: "Quem fará o município e desenhará os planos para Maputo será a direção colegial da RENAMO e a pessoa chave será Venâncio Mondlane."
Pensamento político?
Pouco se sabe sobre as ideias políticas de Hermínio Morais, que se juntou à RENAMO quando era ainda muito jovem e ganhou fama de ser um dos maiores especialistas em explosivos do maior partido da oposição. Mas uma coisa é certa: "Tudo o que a FRELIMO faz, ele está contra", diz o jornalista Fernando Lima.
"É muito discreto, não é dado a muita retórica política. Durante o tempo da campanha, não deu para perceber qual é o pensamento político dele, pelo menos para a cidade de Maputo", comenta Francisco Carmona. "É uma figura muito respeitada do ponto de vista militar, mas o grande público, até agora, não conhece o pensamento político dele. Só é conhecida a parte militar e o seu envolvimento na guerra dos 16 anos", acrescenta o editor.
Hermínio Morais esteve em Roma, a participar nas negociações que culminaram com a assinatura do Acordo Geral de Paz, em 1992, e também na formação do exército unificado. "Ele fez parte das principais comissões criadas no Acordo Geral de Paz e depois desapareceu misteriosamente", recorda o editor. O antigo guerrilheiro também foi um dos primeiros militares a chegar a Maputo, na época de 90, juntamente com Jerónimo Malagueta - outro comandante na guerrilha da RENAMO que depois dos acordos de paz integrou o exército unificado.
José Manteigas, porta-voz da RENAMO, lembra que esta "figura emblemática" do maior partido da oposição, "um general que esteve sempre no ativo", também tem experiência política, apesar de não ter muito destaque nos meios de comunicação social. Já esteve na Assembleia Municipal de Maputo e também fez parte do Conselho Nacional de Defesa e Segurança de Moçambique - órgão que aconselha o Presidente da República. Atualmente também é administrador não executivo da Empresa Estatal de Petróleos (Petromoc).
Famosos "ataques mortíferos"
Hermínio Morais é mais conhecido "como um grande comandante da RENAMO, provavelmente o mais famoso, e aquele que fez os ataques mais mortíferos e mais destrutivos durante a guerra", lembra Fernando Lima. "Mutarara, Alta Zambézia e Marromeu: todos os que se lembram da guerra talvez se lembrem dos ataques mais espetaculares que foram protagonizados por ele nessas zonas", concorda Francisco Carmona.
E exemplos não faltam, lembra o editor do Savana. Diz-se que foi ele o protagonista de um famoso ataque à fábrica de açúcar de Marromeu, no vale do rio Zambeze, província de Sofala, e que foi um dos principais sabotadores da linha ferroviária de Sena, liga o Porto da Beira ao Malawi. Também lhe atribuem o célebre derrube da Ponte Dona Ana, que liga as margens do rio Zambeze, entre a vila de Nhamayabwe, na província de Tete, e o distrito de Caia, na província de Sofala. "Sobre esta figura mítica e emblemática vamos ouvir sempre muita coisa", conclui Carmona.
Também se diz que Hermínio Morais esteve sempre lado a lado do líder da RENAMO Afonso Dhlakama, que morreu a 3 maio de 2017, de quem foi assessor para assuntos de defesa e segurança. "Consta que a perda de protagonismo que teve na RENAMO pouco depois do Acordo Geral de Paz ficou a dever-se a algumas clivagens que terá tido com Afonso Dhlakama. Há quem diga também que se Dhlakama fosse vivo, Hermínio Morais não seria o número dois na lista em Maputo", diz o jornalista.
Agora, o general Hermínio Morais parece estar pronto para mais uma batalha. "Encontro-me preparado desde o princípio", declarou no dia em que a RENAMO o anunciou como cabeça de lista. O vencedor do "combate autárquico de Maputo" será decidido esta quarta-feira.