Angola: "Quem protesta dependerá da boa vontade do PR"
7 de janeiro de 2025Nesta segunda-feira (07.01), os quatro ativistas cívicos condenados por ultraje ao Presidente da República foram postos em liberdade, após a concessão do indulto presidencial. Apesar de trazer alívio aos detidos, o ato gera controvérsias e levanta questões sobre a liberdade de expressão e cidadania em Angola.
Adolfo Campos, Gelson Moreira "Tanaice Neutro", Hermenegildo André "Gildo das Ras" e Abrão Pedro Santos cumpriam uma pena de dois anos e seis meses por crimes de ultraje contra o Presidente da República. No último dia da primeira fase do cumprimento do indulto, eles foram libertados, mas não prestaram declarações à imprensa.
Impacto no movimento cívico
Em Angola, a decisão presidencial tem sido alvo de críticas por parte de ativistas e organizações da sociedade civil. Inocêncio de Brito, que foi preso no caso dos "15+2", comentou que o indulto transmite à sociedade a mensagem de que criticar ou brincar com o Presidente pode levar a consequências severas.
"Passa-se uma lição de que não se deve brincar com o Presidente porque poderão ter o mesmo destino", afirmou.
João Malavindele, diretor executivo da ONG Omunga, também expressou preocupação sobre os efeitos do indulto no exercício da cidadania. "Esse indulto tem um impacto muito negativo. Ele passa a ideia de que a manifestação de indignação com a governação pode levar à detenção, dependendo da boa vontade do Presidente da República", destacou.
Questionado sobre o impacto no movimento cívico, Inocêncio de Brito foi categórico: "Isto tudo cria um recuo na luta cívica". Para ele, o indulto não representa um avanço para a reconciliação nacional, uma visão compartilhada por Malavindele, que considera o processo "longe do que deveria ser a reconciliação nacional".
Indulto: liberdade ou repressão?
A libertação dos ativistas ocorre no âmbito das comemorações dos 50 anos da independência de Angola, a ser celebrada em 11 de novembro. Além dos quatro ativistas, outras 48 pessoas foram beneficiadas pelo indulto, incluindo José Filomeno dos Santos, filho do ex-presidente José Eduardo dos Santos, e a cantora e influenciadora digital Ana da Silva Miguel, conhecida como Neth Nhara.
No entanto, Malavindele sublinha que o indulto não deveria ser aplicado a cidadãos que exerceram sua consciência cívica. "Esse indulto não é e nunca deveria ser usado em casos de pessoas que simplesmente exerceram o direito à cidadania", declarou.
A iniciativa presidencial, vista por alguns como um gesto de clemência, é encarada por outros como um reforço do controle estatal sobre a dissidência. A questão que permanece é: o indulto representa uma verdadeira liberdade ou inaugura um novo ciclo de repressão?