Interesse de investidores angolanos na RTP gera alerta
11 de outubro de 2012A alienação de um dos canais do grupo Rádio Televisão Portuguesa (RTP) é bastante contestada pelos trabalhadores e também por cidadãos anónimos que receiam a diminuição da presença do Estado na Comunicação Social e o fim do serviço público.
A Comissão dos Trabalhadores da estação está em alerta, uma vez que a RTP-África é o departamento mais cobiçado por investidores angolanos.
Modelo será definido por consultores
O gabinete de José Relvas, ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, que tutela o setor da Comunicação Social, tem um plano estratégico de privatização na RTP.
A nova administração já escolheu os consultores jurídicos para a alienação de um canal, tal deu a conhecer José Relvas numa recente sessão parlamentar.
“A escolha dos advisers, jurídico e estratégico, é que vai definir o modelo, o tempo e as circunstâncias da alienação”, revelou.
O cenário previsto pelo governo é de concessão da RTP-1 a privados e encerramento da RTP-2. O executivo quer, antes, reestruturar o grupo de modo a conter os custos operacionais já em 2012.
Investidores ávidos
A Ongoing, acionista da Portugal Telecom, com significativa presença na área dos media de Portugal, Brasil, Angola e agora Moçambique, é um dos interessados no dossier.
Há também notícias do interesse da NewsHold, grupo angolano detentor do Jornal Sol cuja estrutura acionista está ligada a uma sociedade anónima no Panamá.
Além de grupos económicos, também há interesses políticos na privatização da RTP.
Camilo Azevedo, da Comissão dos Trabalhadores da RTP, destaca a impotância geoestratégica dos canais, referindo-se à RTP-África, que tem uma grande importância para a África, e ao canal RTP-Internacional.
“Por isso, há aqui vários jogos que não estão claros neste momento”, avalia.
Ainda de acordo com Camilo Azevedo, a RTP está definhada e tem uma macro-estrutura gigantesca que deve ser revista. O plano do governo estaria em contraste com o modelo europeu, segundo o qual um bem público não pode ser negócio de alguns.
RTP-África na mira dos angolanos
Camilo Azevedo lembra ainda que a RTP-África tem seis vezes mais audiência que a RTP-1 e se diz em alerta por causa da cobiça dos investidores angolanos.
“A RTP-África faz jeito ao regime angolano para legitimar o seu poder em África inteira e a parecer com um grande regime”, considera.
O representante da Comissão dos Trabalhadores da RTP avança nas críticas. “Não é por acaso que a RTP-África transmitiu já a cerimônia de posse do presidente angolano, na íntegra, como um evento”, dispara.
Entre o receio e a aprovação
A decisão de privatização poderá ser conhecida no primeiro trimestre de 2013. Já no Parlamento, quando foi falar do processo, a oposição criticou José Relvas de querer liquidar o serviço público de televisão ao sabor do mercado.
Um grupo de cidadãos, do qual faz parte o antigo secretário de Estado Alberto Arons de Carvalho, lançou um manifesto para travar o processo.
“É um erro muito grande, que vai afetar irremediavelmente a qualidade, a diversidade e o pluralismo da televisão em Portugal”, avalia Arons de Carvalho.
O ex-secretário afirmou ainda não ter receio do capital angolano, mas sim “do desaparecimento de um operador público de capitais portugueses”.
Seja como for, a decisão final sobre a privatização na RTP terá de passar pelo crivo da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), presidida por Carlos Magno que defendeu a privatização.
“Os órgãos de Comunicação Social devem ter estatutos editoriais sólidos, visíveis e que preservem a sua independência independentemente dos detentores do capital”, disse.
Além da RTP, o Governo tenciona privatizar a Antena 1, 2 e 3, bem como alienar a sua participação acionista na agência Lusa.
Autor: João Carlos (Lisboa)
Edição: Cristiane Vieira Teixeira / Renate Krieger