Investimento chinês no Quénia reativa Rota da Seda
22 de março de 2018A China está a investir em massa na expansão de uma nova Rota da Seda - rotas de transporte que passam pela Ásia em direção à Europa e a África. No dia 16 de março, Pequim anunciou a criação de uma agência encarregada de supervisionar a ajuda que o país presta além-fronteiras, para garantir que o apoio financeiro cumpra os objetivos diplomáticos da China.
Foi um dia histórico o dia em que o Presidente do Quénia, Uhuru Kenyatta, inaugurou a nova linha ferroviária que liga o porto de Mombaça à capital, Nairobi, em maio de 2017. "Hoje celebramos a colocação da primeira pedra para a transformação do Quénia num país industrializado e próspero", declarou na altura. E fez também questão de agradecer o Presidente Xi Jinping e ao povo da China por terem possibilitado a construção da nova linha ferroviária, por onde circulam agora comboios modernos de mercadorias em um trajeto que dura quatro horas e meia. Os comboios nem se comparam aos camiões em mau estado que transportavam as mercadorias anteriormente.
A linha ferroviária, orçada em mais de 3 mil milhões de dólares, foi construída e financiada pela China. É uma pequena parte dos milhares de milhões investidos por Pequim em África nos últimos anos. Só em 2016 foram mais de 36 mil milhões de dólares. Mais do que a União Europeia e os Estados Unidos em conjunto, segundo a economista Dambisa Moyo. "A China é atualmente o país que mais investe em África", afirma.
E as formas de investimento são muito variadas, pois a China concentra-se, antes de tudo, na construção de infraestruturas: linhas férreas, portos e estradas. "Claro que há empresas ocidentais a atuar na região, mas há uma grande diferença entre o que as empresas ocidentais fazem aqui e o que a China está a fazer agora", explica. Moyo.
De olho no mercado
O encurtamento de trajetos, como aconteceu em Nairobi, está integrado na Nova Rota da Seda, um megaprojeto chinês lançado em 2013 pelo Presidente chinês, Xi Jinping. A iniciativa prevê a construção de uma malha ferroviária intercontinental, novos portos, aeroportos, centrais elétricas e zonas de comércio livre, para reativar as antigas vias comerciais entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e sudeste Asiático.
Nos próximos 15 anos, mais de mil milhões de pessoas viverão em Nairobi, todos potenciais consumidores de produtos chineses. Por isso, Pequim dedica-se à construção em tempo recorde de novas rotas de transporte na região, que atendam o mercado africano em expansão.
Os investidores chineses querem ganhar espaço exclusivo no cenário económico africano. "Eles querem fazer parte disso. Por outro lado, querem manter todos os outros fora. Este é um jogo geopolítico", explica Ganesh Rasagam do Banco Mundial. Preocupações humanitárias também não fazem parte da agenda dos investidores chineses. "O costume é dizerem: 'só nos interessam os negócios, não fazemos perguntas sobre corrupção ou direitos humanos", afirma Rasagam
Lucro: o único interesse
Isso torna os investidores chineses atrativos aos olhos de muitos países, que aceitam de bom grado a ajuda e os empréstimos milionários. No entanto, isso pode acarretar riscos, alerta o economista Ali Khan Satchu. "A China posiciona-se no centro de uma nova era na infraestrutura global. Os chefes de Estado africanos acreditam muitas vezes que a China é uma espécie de Pai Natal, o que não é verdade. A China quer lucrar com os seus investimentos", esclarece.
Isso pode significar que Pequim queira transportar os produtos chineses pelo Quénia até ao interior do continente através das novas linhas férreas e que matérias-primas retornem pelo mesmo caminho. Além disso, pode haver a expetativa por parte dos chineses de que os comboios e vagões utilizados pelo Quénia sejam comprados na China.
Até o momento, os quenianos estão satisfeitos, porque as estradas melhoraram e há uma nova linha férrea. "Eu acho bom. Temos menos engarrafamentos, as estradas estão em melhores condições e temos menos acidentes", relata um cidadão.
Em África, ninguém se surpreende que investidores estrangeiros estejam apenas atrás do próprio lucro. Não foi só o Quénia a abrir as portas à China. Desde o fim da guerra civil, em 2002, Angola, por exemplo, recebeu mais de 11 mil milhões de euros em empréstimos e doações de Pequim, o que torna a China num dos países que mais financiou a reconstrução de Angola.