Justiça: Será o fim da impunidade em Angola?
5 de julho de 2018Em março deste ano, um grupo de cidadãos nacionais e estrangeiros foi acusado de negociar uma linha de crédito fictícia. Entre os indiciados estavam o antigo Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, Geraldo Sachipengo Nunda, e Norberto Garcia, o atual porta-voz do MPLA, o partido no poder.
Segundo uma nota da Procuradoria-Geral da República, tornada pública na semana passada, os cidadãos Belarmino Van-Dúnem e Santinho Filipe Figueira, inicialmente indiciados no mesmo processo, deixaram de ser arguidos por "insuficiência de provas".
Contudo, mantém-se a acusação contra outros cinco cidadãos nacionais, quatro tailandeses, um canadiano e um eritreu. A Procuradoria não menciona, no entanto, os seus nomes. Os arguidos vão responder por associação criminosa, fabrico e falsificação de títulos de créditos, entre outras acusações. O processo já foi entregue ao Supremo angolano para a devida apreciação.
Mas, à DW África, o jornalista angolano Ilídio Manuel questiona a transparência do processo e explica o que a atitude da Procuradoria angolana pode significar.
"Isto significa que existem algumas dúvidas relativamente à transparência deste processo, porque isso pode revelar que a própria Procuradoria-geral da República ou ter-se-á precipitado em acusar as pessoas, por um lado, ou, por outro lado, estará a fazer determinados arranjos para que estas pessoas não cheguem a ser convertidas em réus. Isso não abona à imagem da própria Justiça. Nós já temos uma Justiça que sempre andou a reboque do poder político", explicou o jornalista.
Ainda assim, Ilídio Manuel afirma que há muita expectativa na sociedade em relação ao desfecho do "caso dos 50 mil milhões de dólares".
Por sua vez, Lindo Bernardo Tito, jurista e vice-presidente da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), espera que os tribunais façam o seu trabalho.
"Temos de apelar aos tribunais, no caso, o Tribunal Supremo, que realize de facto a justiça de acordo com os cânones do direito".
Outros processos em curso
Para além desse processo, há outro que envolve funcionários da Administração Geral Tributária, acusados de corrupção passiva, prejudicando o Estado no equivalente a 5,4 milhões de euros. Estão a ser julgados no tribunal provincial de Luanda desde o princípio deste mês, num caso referente a 2016.
Também está na Procuradoria-Geral da República, em investigação, o caso dos alegados 500 milhões de euros transferidos ilicitamente para Londres. José Filomeno dos Santos, filho do antigo Chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, e Walter Filipe, ex-governador do Banco Nacional de Angola (BNA), foram constituídos arguidos.
Alguns angolanos olham para estes casos como o início do fim da impunidade em Angola. O jornalista Ilídio Manuel mantém-se cético.
"Concreto significa a detenção de determinadas figuras do topo. Infelizmente, o que tem acontecido, é que só se denota a prisão de indivíduos de arraia-miúda. Isto quer dizer que os tubarões continuam impunemente a navegar nas águas da corrupção".
Cruzada contra corrupçãoNa passada quarta-feira (04.07), o Presidente angolano, reiterou no Parlamento Europeu que está a arrumar a casa e prometeu resultados em breve.
"Levamos a cabo uma verdadeira cruzada contra a corrupção em toda sociedade com destaque para os crimes de colarinho branco cujos resultados positivos, asseguramos, que começaremos todos a nos beneficiar", afirmou o Presidente angolano.
João Lourenço apelou ainda a quem tenha dinheiro no estrangeiro transferido de forma ilícita a repatriá-lo para Angola até dezembro, como prevê a Lei de Repatriamento de Capitais. Depois, segundo ele, o Estado "não só vai localizar e recuperar a totalidade destes recursos que são de todo povo angolano, como também levar às barras da justiça os seus responsáveis".
Lindo Bernardo Tito, da CASA-CE sublinha que o combate à corrupção diz respeito a todos.
"Não é uma questão de um único ator político ou de um partido político ou até do titular do poder executivo ou ainda o executivo em geral. É uma questão que envolve todos nós. E, por isso, cada um de nós vai contribuir na medida dos poderes que as leis lhe conferem", declarou à DW.