"As pessoas têm medo"
7 de novembro de 2016O concerto "Ikopongo" pretendia juntar em palco dois músicos críticos angolanos: Luaty Beirão (também conhecido como Ikonoklasta) e MCK. Mas foi cancelado.
Inicialmente, o espetáculo estava marcado para sábado (05.11), no centro cultural Chá de Caxinde, em Luanda, mas a gerência comunicou mais tarde que não autorizava a sua realização. Foi, depois, reagendado para domingo, para o Cine Tivoli, também na capital angolana, mas foi impedido pelas autoridades. Segundo Beirão, a polícia angolana retirou a licença de funcionamento do espaço.
O conteúdo crítico das músicas do 'rappers' Luaty Beirão e MCK não terá agradado: "Toda a gente que se posicione de forma clara e inequívoca contra o 'status quo' vai encontrar as portas fechadas. É claramente um recado para que os outros vejam como se devem comportar", afirma Beirão em entrevista à DW África.
"Penso que as pessoas têm medo de estarem associadas a esse tipo de expressão artística frontal. Não encontro outra justificação. São dois boicotes em dois dias; no segundo, depois de termos feito o pagamento, disseram-nos arbitrariamente que não podemos realizar o concerto. Com polícia envolvida e tudo mais, a explicação é essa, é medo. Medo de sofrerem represálias."
Amnistia Internacional condena bloqueio
A Amnistia Internacional condenou, esta segunda-feira, o cancelamento do espetáculo.
"As autoridades angolanas devem assegurar que o concerto dos 'rappers' decorre sem qualquer interferência da polícia, que o bloqueou durante o fim-de-semana", afirmou Tjiurimo Hengari, o diretor da organização para a África Austral, em comunicado.
"A intervenção inexplicada da polícia tem potencialmente consequências de longo alcance para a liberdade de reunião e de expressão artística no país e laivos de censura estatal a Luaty Beirão e a MCK, pelas suas críticas ao Governo de Angola."
Os "rappers" anunciaram, entretanto, que, na segunda-feira à noite, planeavam transmitir um concerto através da internet, a partir de um "lugar secreto".
Denúncia de perseguição
Luaty Beirão diz que está a ser alvo de perseguição por parte do regime liderado pelo Presidente José Eduardo dos Santos.
"Eu sei que [bloquear o concerto] não é a única maneira de tentar para asfixiar as nossas liberdades. Eles agora têm estado a raptar as nossas famílias. Começou com o rapto da minha mulher, depois da mãe da Rosa Conde, uma das ativistas condenadas no processo dos 17 [condenados por rebelião] e agora é o filho da ativista Elisabeth", denuncia Beirão.
"Esse é um regime opressivo. E, como estamos à porta das eleições, começa a evidenciar um nervosismo crescente – e não são só os artistas que são alvos disso, mas toda a sociedade. Mas é preciso não desistirmos."
O músico e ativista pondera processar as autoridades do país devido ao cancelamento do concerto no fim-de-semana.