Luaty Beirão e MCK apresentam "Ikopongo" (resistência)
3 de dezembro de 2016Os rappers e ativistas angolanos celebram 20 anos de amizade e sobem ao palco juntos para cantar versos e rimas que exaltam a atual realidade sócio-política de Angola, onde têm sido frequentes atos por parte do poder com o objetivo de limitar a liberdade de expressão e a participação cívica.
"Ikopongo” é o espetáculo que os dois músicos angolanos apresentam em Lisboa, o mesmo que as autoridades angolanas proibiram em Luanda, sem qualquer explicação, em novembro passado. MCK, uma das vozes críticas e discordantes do regime de Luanda, confirma em entrevista à DW África que, depois de três tentativas, foram proibidos os concertos que deveriam ter lugar na capital angolana.
Segundo o rapper, todas estas proibições têm algo em comum. "A primeira tentativa foi na Rádio Vial, a segunda no Chá de Caxinde e a terceira no Cine Tivoli. Em nenhuma dessas conseguimos, mas todas têm algo em comum: a violação de um direito, de um acordo contratual. E, na maior parte dos casos, por um ato arbitrário ou sem qualquer respaldo jurídico-legal, fomos impedidos sem uma justificação de lei como tal".
"Ikopongo" - Resistência
Mas, como "Ikopongo” significa resistência – explica o cantor – o grupo conseguiu realizar o concerto em Angola num sítio secreto, em sala fechada e sem público, com transmissão em direto via Internet. Foi a forma que os músicos encontraram para mostrar que a sua arte é de afirmação artístico-cultural.
"Infelizmente, por falta de liberdade, como acontece em quase tudo em Angola, não existem muitos espaços de abertura democrática para discussão e reflexão, para debate e reivindicação, e às vezes para apresentação de uma mera sugestão. E vamos realizar o concerto aqui em Lisboa, no Musicbox”.
O músico tem um olhar crítico sobre a vida política angolana. Hoje com "a liberdade excessiva” proporcionada pelas redes sociais, ele vê o futuro de outra maneira. MCK diz que o movimento de jovens ativistas como ele representa a geração que rompeu o ciclo do medo em Angola.
"Tal como nós, existem hoje vários jovens ousados em Angola que querem experimentar o sabor da liberdade. Entretanto, eu acho que, por força disso, vai ser difícil manter a atmosfera de medo [na sociedade angolana] que, na maior parte dos casos era mantida como uma violência silenciosa e tácita. Era a violência do dinheiro. Hoje, Angola tem menos dinheiro para corromper a consciência das pessoas. Tem menos dinheiro para silenciar as pessoas e para comprar até a opinião internacional. E na maior parte dos casos fazem muito isso com a imprensa portuguesa”.
Futuro
Entretanto, MCK antevê uma Angola mais aberta no futuro - principalmente no que toca às liberdades fundamentais consagradas na Constituição. E acredita que, com uma possível retirada do Presidente José Eduardo dos Santos, o seu sucessor não ficará no poder por mais de 30 anos."Do meu ponto de vista, para quem como eu que nunca experimentou outra coisa, José Eduardo dos Santos foi presidente dos meus avós, do meu pai, meu, da minha filha; entretanto, tudo o que vier depois vai ser menos grave do que isso. Terei a garantia que o próximo presidente já não vai ficar no poder, por exemplo, mais de 30 anos. Isso é um facto, é uma garantia”, diz o músico.
O concerto em Lisboa conta com a participação de Luaty Beirão, do grupo dos 17 jovens acusados pela justiça angolana por envolvimento em atos preparatórios de rebelião. Em conversa com a DW, o "rapper” luso-angolano – que faz nesta cidade o primeiro concerto após a sua prisão em Luanda –, exalta o papel da música na mobilização de mais consciências e admite que ela tem estado a contribuir para mudanças em Angola.