Samora Machel Júnior denuncia "mão obscura"
30 de novembro de 2018A DW África entrevistou Samora Machel Júnior, esta sexta-feira (30.11.), no dia em que teve lugar, em Lisboa, no ISCTE - Instituto Universiário de Lisboa uma homenagem ao seu pai, Samora Moisés Machel, primeiro Presidente da República Popular de Moçambique.
A iniciativa realizada por ocasião do 85º aniversário do nascimento de Samora Machel, envolveu a Câmara de Comércio Portugal-Moçambique, a Associação de Estudantes do e a Associação dos Estudantes Moçambicanos em Portugal .
Na entrevista, Samora Machel Junior critica "a mão obscura" no seio dos órgãos que tutelam o processo eleitoral em Moçambique de lhe terem impedido de concorrer às últimas eleições autárquicas pelo município de Maputo.
Samora Machel Júnior afirma que não está de costas voltadas à FRELIMO, do qual é militante, apesar de discordar com o método usado pelo partido no poder para que o seu nome fosse retirado entre os pré-candidatos à cabeça de lista nas recentes eleições municipais.Perante este facto, a DW África questionou o gestor e membro da FRELIMO que integra o Comité Central quais são os seus projetos políticos para as eleições gerais de 2019, já que ficou de fora da lista para as recentes eleições dos órgãos do poder local?
Samora Machel Júnior (SMJ): Não tenho projeto nenhum para 2019. O meu projeto era para 2018. Não foi possível realizá-lo e neste momento estou a olhar para outras oportunidades.
DW África: Portanto, uma eventual decisão sua para participar nas próximas eleições gerais em Moçambique dependeria muito do posicionamento do partido?
SMJ: Não diria que depende da FRELIMO. Como disse, não tenho planos. O partido vai tomar a decisão que achar a mais correta e eu respeitarei essa decisão do partido. Agora, o que é que eu vou fazer se a decisão não me agradar ou eu não concordar com a decisão isso veremos mais à frente.
DW África: Alguma razão justifica esta decisão? Vai virar as costas à FRELIMO?
SMJ: Eu continuo na atividade política como já estava antes das eleições de 2018. Como sabe, sou membro do partido FRELIMO, sou membro do Comité Central – orgão máximo do partido – e é lá onde eu pratico a atividade política. Portanto, em nenhum momento virei as costas. A FRELIMO é o meu partido. Simplesmente não concordei com a maneira como o meu nome foi afastado da lista dos pré-candidatos à cabeça de lista por parte do partido. Não tive explicações porquê que isso aconteceu e eu achei que não devia virar as costas aos meus apoiantes que muito deram para que o meu processo fosse em frente. E a convite da AJUDEM eu decidi concorrer pela sociedade civil.
DW África: Então, o movimento AJUDEM poderá apresentar candidatos nas eleições gerais de 2019?
SMJ: Eu não posso falar do Movimento AJUDEM porque não sou membro da associação. É um grupo da sociedade civil, de jovens, que tem muita ação no campo social e tem feito muitos trabalhos com a sociedade civil. Acho que a AJUDEM queria dar o seu contributo para o município de Maputo e esta foi a plataforma que me convidou para encabeçar a lista dos candidatos. Agora, o que é que a AJUDEM vai fazer não sei.
DW África: Não pôde concorrer às últimas eleições autárquicas como candidato à presidência do município de Maputo. Porquê exatamente?
SMJ: Eu acho que houve ali uma mão obscura que não permitiu que eu concorresse. Houve algumas artimanhas dos órgãos que tutelam o processo eleitoral.
DW África: Como é que pensa enfrentar a resistência no seio da FRELIMO, apesar de se manter fiel ao partido?
SMJ: O partido é um movimento dinâmico e acredito que os militantes do partido vão operar as mudanças necessárias para que o partido se torne mais aceitável junto do eleitorado, para que novas ideias possam ser aceites também internamente e permitam mais dinamismo e mais participação dos militantes.
DW África: Pode então descrever como é a sua relação com a FRELIMO?
SMJ: A relação com o partido, eu acredito que continua normal do meu ponto de vista. Como disse nunca abandonei o partido. Obviamente, é preciso que haja decisão. O partido tem que tomar alguma decisão em relação aos passos que tomei. Mas nunca vi essa relação cortada.
DW África: Quais são os militantes que, efetivamente, o apoiam dentro da FRELIMO?
SMJ: São muitos. Tenho apoio a nível das bases e se eu for agora a enumerar esses militantes acho que não acabaríamos hoje. Tenho um bom apoio, resultado da minha boa relação com os camaradas a todos os níveis e por onde passei e trabalhei nunca tive problemas de relacionamento. Portanto, eu acredito que estes são os camaradas que me apoiam e sempre me têm dado forças.
DW África: Tal como o seu pai, disse que Graça Machel é também uma referência para si. Tem contado com o apoio dela. Como encara o vosso relacionamento político?
SMJ: [risos]… É a minha mãe. E antes deste relacionamento político há uma relação familiar, sanguínea. É muito bom.
DW África: Ela é uma referência para Moçambique e para a África do Sul…
SMJ: Sim, ela é. Sabem o trabalho que ela tem afeito a nível dos dois países e a nível mundial… como ativista social. Obviamente que a veia política dela também tem muito impacto nas nossas sociedades. Mas, resumindo, temos muito boa relação.
DW África: E que significado tem para si esta homenagem ao seu pai aqui em Lisboa?
SMJ: Samora Machel é uma referência a nível nacional mas também a nível internacional. Ele sempre tratou o povo português com muito respeito. Ele sempre lutou para que as relações entre os dois países, entre os dois povos, fosse melhor; principalmente nos primeiros anos da independência era muito importante que o povo português estivesse envolvido naquele processo de transição e de afirmação do nosso Estado. E envolvimento também na ajuda para o desenvolvimento do próprio país. E estar aqui para falar de Samora Machel é um marco muito grande.
DW África: É uma pessoa ligada à vida política moçambicana. Como é que gostaria de honrar a figura de seu pai, fazendo algo mais por Moçambique, aquilo que ele não conseguiu concretizar?
SMJ: Continuar a lutar, a bater-me pela melhoria das condições de vida do povo. Continuar a lutar pelo desenvolvimento do país, contribuir para que Moçambique seja um país pacífico e democrático, estável, onde o cidadão pode intervir em qualquer área sem nenhum problema.