Médicos suspendem greve: "O lado humano falou mais alto"
26 de abril de 2022Profissionais de saúde angolanos, de todo o país, estavam em greve há mais de um mês. Exigem a melhoria das condições de trabalho, aumentos salariais, o pagamento de subsídios e segurança, entre outros pontos.
Até agora, o Sindicato Nacional dos Médicos de Angola (SINMEA) e o Governo angolano não chegaram a um entendimento. A organização sindical apresentou, entretanto, queixa-crime contra cinco altos dirigentes da saúde, incluindo o secretário de Estado da Saúde Pública e Hospitalar e diretores de hospitais por "violação da lei da greve".
Mas após cinco semanas de paralisação, o presidente do sindicato, Adriano Manuel, explica que os médicos tiveram de suspender o protesto devido ao alto índice de mortalidade nos hospitais. Segundo o sindicalista, foram contratados "médicos sem experiência" para substituir os que estavam em greve.
DW África: As reivindicações dos médicos foram ouvidas pelo Governo?
Adriano Manuel (AM): Não. Tivemos que levantar a greve porque observámos um silêncio e uma certa insensibilidade por parte do Governo de Angola, aliados ao facto de, com a greve, haver um elevado índice de mortalidade nos hospitais. O nosso lado humano falou mais alto e achámos que devíamos [suspender o protesto] para permitir que o Governo voltasse à mesa negocial e, desta forma, diminuirmos a mortalidade que estava a acontecer nos hospitais. Vale realçar que o Governo contratou novos médicos, médicos sem experiência absolutamente nenhuma, ou com pouca experiência, alguns sem médicos experientes ao seu lado, e estava a aumentar a mortalidade em quase todos hospitais de Angola.
DW África: Não foram feitas então quaisquer promessas relativamente à melhoria das condições dos hospitais públicos?
AM: Infelizmente, até agora, não nos foi dito absolutamente nada em relação à melhoria das condições de trabalho. O que temos estado a observar é que as condições vão piorando a cada dia que passa. O Governo ficou praticamente quatro meses sem dar dinheiro a nenhum hospital e, por essa, via também tivemos um elevado índice de mortalidade nos hospitais.
DW África: Há perspetivas de aumentos salariais?
AM: Por enquanto, não. Vamos continuar a discutir o aumento de 6%, que não satisfaz a classe médica.
DW África: Com as reivindicações, vários médicos, essencialmente ligados às clínicas privadas, foram proibidos de exercer. Como é que ficou esta situação?
AM: Sim, foram proibidos de voltar a fazer formação, e essa é uma situação que vamos conversar com a direção dos hospitais, onde temos colegas dessa natureza. Isso configura num quadro de crime. Infelizmente, o Governo de Angola não cumpre com as leis e nós temos um processo-crime já em tribunal. Agora vamos ver se o tribunal vai ou não responder.
DW África: Disse estar a ser alvo de perseguições e ameaças de morte. Apresentou queixa?
AM: Nós não apresentámos queixas porque vão fazendo telefonemas com números que não sabemos quais são. E vamos sendo seguidos por pessoas que não sabemos quem são, porque as nossas imagens vão aparecendo nas redes sociais e em locais em que nós estamos sozinhos. Por exemplo, foi feita uma montagem de uma fotografia minha com um provável general, no meio de muita gente, sendo que eu, normalmente, quando vou a um restaurante, fico sozinho ou acompanhado de um ou outro amigo. E essa fotografia foi tirada e foi espalhada nas redes sociais como se eu estivesse a ser financiado pelo partido maioritário, o que não é verdade.
DW África: As ameaças continuam?
AM: Não, nesta altura já não.