Massacre de Outubro em Angola completa 20 anos
29 de outubro de 2012Nesta terça feira (30.10), completam-se 20 anos sobre o massacre iniciado a 30 de outubro de 1992 na capital angolana, Luanda. No espaço de três dias, foram assassinados milhares de apoiantes da União Nacional para Independência Total de Angola (UNITA) e da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA).
O massacre ocorreu depois de uma fase de paz que se seguiu aos acordos de Bicesse, celebrados em 1991. A guerra civil entra então numa nova fase e prolonga-se por mais dez anos.
A DW África recolheu algumas memórias sobre uma data que não foi esquecida, mesmo que o tema continue a ser tabu em Angola.
Assassinato surpresa
“Foi naturalmente um dia horrível. Estava-se a discutir a paz", começa Filomeno Vieira Lopes, atual líder do Bloco Democrático, partido da oposição angolana. Ele lembra-se bem da data que interrompeu o processo de paz em Angola.
Lopes estava fora de casa quando começaram os bombardeamentos. Foi apanhado de surpresa, sobretudo numa altura em que se tentava encontrar soluções políticas para o problema. “Matava-se tudo. Matavam-se todos os que tivessem alguma ligação com a oposição.”
Milhares de apoiantes e até dirigentes da União Nacional para Independência Total de Angola (UNITA) são assassinados em Luanda e em outras localidades do país. Também da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) há vítimas.
“É a primeira vez, na história da guerra civil angolana, que políticos morrem em combate”, escreve o jornalista Emídio Fernando no livro Jonas Savimbi: No Lado errado da História.
Perguntas sem respostas
Até hoje, permanece por esclarecer quem ordenou o massacre. O número de vítimas também nunca foi confirmado, mas estima-se que tenham morrido entre 10 mil e 50 mil pessoas. Números que Mário Pinto de Andrade, do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), contesta:
“Acho que, às vezes, a comunidade internacional empola. Houve uma manipulação desses resultados. Eventualmente fala-se das pessoas que morreram pela UNITA, mas também morreu muita gente pelo lado do governo. A UNITA quando ocupou o Uíge matou muita gente do MPLA e quando ocupou o Huambo, fez o mesmo.”
Os assassinatos ocorreram após as eleições presidenciais e legislativas de 1992, as primeiras na história do país. Nem o candidato do MPLA, José Eduardo dos Santos, até hoje no poder, nem o seu adversário, Jonas Savimbi, da UNITA, conseguiram maioria absoluta nas presidenciais.
Mas a segunda volta nunca se realizou. A guerra civil reacende-se com o massacre e prolonga-se até quatro de abril de 2002. O massacre também dizimou muitos membros dos grupos étnicos Ovimbundu e Bakongo, historicamente tidos como adversários do MPLA.
Fato desconhecido
O jornalista e analista político Orlando Castro afirma que, nessa altura, o MPLA tentou “neutralizar todos os que pensavam de maneira diferente do regime”.
“Foi uma tentativa de decapitar a UNITA. Tanto que fala-se em milhares de mortos, eventualmente até em cerca de 50 mil. É certo que também o próprio vice-presidente da UNITA, Jeremias Chitunda, tal como Mango Alicerces [secretário-geral da UNITA] e Elias Salupeto Pena [sobrinho do líder do partido, Jonas Savimbi] foram mortos nesse massacre", conta Orlando Castro. "Na história do MPLA, os massacres, ou as purgas, ou o que se lhe quiser chamar, são uma regra estratégica do regime, mesmo até para os próprios simpatizantes do MPLA.”
O tema ainda é tabu em Angola e desconhecido por muito jovens. Daí a importância de uma boa estratégia de reconciliação, desde que não se branqueie a verdade, defende Orlando Castro:
“Estes massacres são os mais visíveis, quer o de 27 de Maio de 1977, quer o de 1992, são os mais visíveis pelo número de vítimas, mas o MPLA tem muitas outras histórias porque ao longo da guerra – embora a UNITA obviamente também tenha cometido grandes erros – o MPLA, até pelo poder militar que tinha, massacrou muita gente inocente. Os jovens não conhecem esta história. A paz e reconciliação em Angola nunca se conseguirá com base na mentira.”
Mário Pinto de Andrade concorda: “ninguém pode negar a História, mas tem de se falar com realismo.