Manipulação do recenseamento eleitoral em Cabo Delgado?
9 de julho de 2019As críticas ao recenseamento eleitoral continuam em Moçambique. Enquanto a RENAMO trava uma batalha jurídica contra números que diz terem sido empolados, a sociedade civil exige agora a repetição do processo em Gaza, a prorrogação na Zambézia e uma auditoria aos dados de Cabo Delgado.
A província do norte do país é uma das que mais preocupam os grupos responsáveis pela monitorização do recenseamento. Mas a Comissão Provincial de Eleições garante que o processo respeitou a legislação laboral.
Reunidos em Pemba, representantes de cinco organizações da sociedade civil denunciaram irregularidades graves detectadas ao longo do recenseamento eleitoral em Moçambique, que decorreu entre 15 de abril e 30 de maio.
Na província de Gaza, por exemplo, afirmam que os números alcançados no processo superam em cerca de 100 por cento a projeção do Instituto Nacional de Estatísticas da população adulta, com idade eleitoral ativa. Na Zambézia, aconteceu o inverso: houve projeção em baixa da população com maioridade eleitoral, o que levou à exclusão de potenciais eleitores.
Ataques e ciclones contra meta atingida
Em Cabo Delgado, onde foi apresentado o relatório das organizações da sociedade civil, os resultados do recenseamento levantam igualmente muitas dúvidas. Desde 2017 que a província é palco de ataques armados. Em abril foi abalada pelo ciclone Kenneth – o que terá deixado um número considerável de eleitores fora do processo.
Mesmo assim, os números apresentados pelos órgãos eleitorais indicam uma realização positiva, o que eleva o número de assentos de 22 para 23 na Assembleia da República para a próxima legislatura. Um resultado que levanta muitas questões, diz Dom Luiz Fernando Lisboa, bispo da Diocese de Pemba e presidente da Comissão Episcopal de Justiça e Paz (CEJP) da igreja católica.
"Muita gente que gostaria de se recensear não só está fora de casa, mas também está preocupada com a sua própria vida. Muita gente perdeu tudo, perdeu casas que foram queimadas, perderam familiares. Isto teve um impacto sim no recenseamento. Se muita gente não pode recensear por causa dos ataques e do ciclone e o tempo foi muito pouco, como é que conseguimos atingir a meta? É importante que se responda essas perguntas que a sociedade faz".
Para Adriano Nuvunga, da Associação Desenvolvimento e Sociedade (ADS) e porta-voz do consórcio das organizações da sociedade civil, há fortes suspeitas de manipulação.
"Isto sugere claramente mais uma vez a manipulação estatística aqui na província de Cabo Delgado e isto não é adequado. A bem da transparência tem que se permitir que a sociedade civil tenha acesso aos documentos que geraram estes números para verificarmos e a partir daí darmos indicação do quão confiável eles são para a sociedade”.
Processo dentro da lei, diz Comissão de Eleições
Presente na sessão da apresentação do relatório, o presidente da Comissão Provincial de Eleições de Cabo Delgado, Albino Pariela garantiu que a inscrição de eleitores obedeceu a todos os pressupostos legais.
"A deslocação não é o sinónimo de o cidadão não se recensear. Apesar da deslocação, as brigadas do recenseamento estavam lá, a segurança estava lá, então foi garantido o recenseamento da população na zona onde era efetivamente necessário".
E sobre o pedido de acesso dados referentes a Cabo Delgado, apresentado pelas organizações, Albino Pariela diz que os documentos estão disponíveis para a consulta de quem quer que seja.
"Todos os dias fazia-se a desagregação dos resultados de todas as brigadas da província. Então, o controlo do recenseamento foi feito desde o primeiro dia até o último. Por isso os documentos existem. Portanto, não vejo nenhum problema, dependendo da questão que a sociedade civil coloca. Não há nenhum problema".