Riscos da personalização dos assuntos nacionais
3 de maio de 2018O líder do maior partido da oposição em Moçambique morre num momento político delicado no país, em que o seu partido RENAMO e o Governo da FRELIMO estão a alcançar consensos no contexto das negociações de paz que opõe as duas partes. O processo negocial estava a ser liderado pessoalmente por Dhlakama e o Presidente moçambicano Filipe Nyusi. A DW África conversou com especialista moçambicano em boa governação Silvestre Baessa sobre o assunto.
DW África: O que pode representar a morte do líder da RENAMO no contexto das negociações de paz?
Silvestre Baessa (SB): Essa morte tem implicações profundas em todo o processo político nacional. Primeiro perde-se um ator fundamental. Penso que nos outros anos ficou claro que o esforço do presidente da RENAMO em busca de uma paz efetiva e o Acordo que se assinou resulta muito do seu empenho. As condições em que se encontrava extremamente difíceis que um líder, um ator principal num processo tenha conseguido em certa medida controlar esse processo e fazer o encaminhamento do qual hoje celebramos, com todas as críticas que se podem fazer em relação à essa proposta.
Por outro lado, este ator saindo de cena e conhecendo a história da RENAMO não estou em crer que o presidente tenha pensado num substituto, que possa facilmente e rapidamente dar seguimento a isto. Penso que isso há-de ser um grande desafio, o próprio Presidente da República vai sentir muito a ausência do líder, até porque Afonso Dhlakama era o seu maior aliado neste projeto de paz ambicioso dentro do próprio partido e da sociedade para a realização deste Acordo. Sem esta figura naturalmente instala-se um clima de incerteza no país. Penso que a reação mais imediata vai ser a suspensão de todo este processo negocial. Acho que a RENAMO vai precisar de ter o seu tempo para alinhar as suas ideias, apesar do assunto já estar na mesa de negociações e no Parlamento e tudo indicar que nos próximos tempos teríamos uma decisão final do Parlamento. Creio que a morte abre duas possibilidades: tanto uma RENAMO fragilizada agora, mas também perigosa sem líder que tenha capacidade de estabelecer o seu controlo.
DW África: Podemos considerar que este é o risco de se personalizarem assuntos de interesse nacional?
SB: Sem dúvida. Todo esse processo negocial foi feito a partir, por um lado, pelo Presidnete da República na cidade com toda uma equipa de contacto, de diálogo, de apoio, e depois tínhamos o líder da RENAMO isolado nas matas com dificuldades de comunicação com a parte política da RENAMO, mas estou em crer que os termos como se chegaram aos acordos foram muito personalizados, então é natural que dentro da RENAMO neste momento não haja muita gente com o conhecimento suficiente para perceber como é que se chegou [ao Acordo] e o que é que está implicíto dentro de cada um dos pontos do Acordo. Então, é um risco que se corre com a personalização do poder, mas era o Acordo possível dentro das condições existentes. Ele continuava a explorar o seu maior trunfo que era manter uma força armada e que para tal tinha de estar fora do contacto mais urbano, onde ele teria todo o contacto, onde a RENAMO política teria um contacto maior e estar melhor informada sobre os avanços nesse Acordo.