1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Moçambique: Como ter campanhas eleitorais mais transparentes

António Cascais
26 de agosto de 2024

Membros da sociedade civil aconselham os partidos políticos moçambicanos a serem mais transparentes sobre o financiamento das suas campanhas. Porque não declarar as receitas mais avultadas, como se faz na África do Sul?

https://p.dw.com/p/4jwVd
Campanha eleitoral em Moçambique em 2019
Sociedade civil moçambicana está preocupada com origem do financiamento das campanhasFoto: Johannes Beck/DW

Em Moçambique, várias organizações não-governamentais, entre elas o Centro de Integridade Pública (CIP), defendem que os partidos políticos devem ser obrigados por lei a declarar a origem do financiamento para as campanhas eleitorais, alertando para o risco de proveniência ilícita de fundos.

"Fiscalizar a proveniência do dinheiro e/ou contas dos partidos políticos, reduz os riscos de o Estado ficar capturado pelas máfias", refere o CIP num relatório publicado na semana passada. "Repensar no financiamento político dos partidos políticos torna-se urgente, até porque já há indícios bastantes de uso de dinheiro público e privado, obtido lícita ou ilicitamente, para financiar certos partidos e candidatos, sobretudo para efeitos de campanha eleitoral."

Wilker Dias, porta-voz da "Plataforma Eleitoral Decide", organização financiada pela cooperação norte-americana USAID que monitoriza o processo eleitoral em Moçambique, admite que existe uma grande diferença entre os meios dos diferentes partidos disponíveis para usar na campanha. Em entrevista à DW África, diz ainda que é preciso controlar melhor os meios canalizados pelo Estado para o financiamento das campanhas partidárias.

Analista político moçambicano Wilker Dias
Wilker Dias: "Falar em 'fundos ilícitos' carece de uma investigação mais aprofundada"Foto: Arcénio Sebastião/DW

Por outro lado, Dias comenta que, nesta fase de arranque da campanha eleitoral, não seria sério falar em financiamento ilícito, sendo necessário investigar cada alegação antes de levantar suspeitas graves.

DW África: Tendo em conta as suas observações nestes primeiros dias de campanha, é justo falar em "financiamento ilícito" das campanhas eleitorais dos partidos em Moçambique?

Wilker Dias (WD): Falar de proveniência ilícita seria um pouco complicado numa altura destas. [Ao fazê-lo, estaríamos a generalizar] e a sugerir que o financiamento de todos os partidos tem proveniência ilícita.

DW África: O certo é que há diferenças enormes entre os partidos no que diz respeito ao seu financiamento. Uns têm muitos meios e outros têm muito poucos. Como olha para esta situação?

WD: Há, por exemplo, um défice de material de propaganda. Há um défice de recursos para que os partidos políticos possam fazer-se à rua, mas isto também se deve muito ao atraso na canalização de fundos por parte da Comissão Nacional de Eleições.

Já passei por três províncias – Nampula, Zambézia e Sofala – e constatei que a maior parte dos partidos políticos não conseguiu fazer-se à rua por conta de défices orçamentários. Os folhetos, as capulanas, as t-shirts, está tudo relacionado com os fundos internos de cada partido – e a [demora na] canalização dos fundos [influenciou a sua disponibilização].

Radar DW: Os ilícitos da "pré-campanha" em Moçambique

O partido no poder [a Frente de Libertação de Moçambique, a FRELIMO] está dentro do aparelho de Estado, tem um controlo maior, mas não podemos esquecer que é também um partido com [muitos membros ligados] ao empresariado local. Ao longo desse processo, há campanhas e jantares em que se consegue arrecadar cinco ou seis milhões de meticais [entre 70 mil e 84 mil euros], e isto dá para mover alguma coisa, para [cumprir os seus objetivos].

Portanto, falar em "fundos ilícitos" carece de uma investigação mais aprofundada, que possa sustentar [essa alegação].

DW África: Mas acha que seria preciso uma nova lei sobre o financiamento das campanhas eleitorais ou já há legislação suficiente sobre a matéria, bastando apenas aplicá-la bem?

WD: A questão que se coloca, a esta altura, é mesmo a fiscalização. Moçambique tem muitas leis, e o que é necessário neste [momento] é fiscalizar a legislação. Basta olhar, por exemplo, para a quantidade de ilícitos eleitorais [relatados] só nestes primeiros três dias de campanha – segundo a plataforma do CIP, já são mais de 100 ilícitos. Mas não há responsabilização; não há maior fiscalização por parte dos órgãos eleitorais. Tudo isto acaba matando este processo.

Mesmo o processo organizacional, nos órgãos eleitorais, acaba sendo um dos grandes entraves a um controlo cerrado, sobretudo no que diz respeito às receitas.

Seria de bom tom se implementássemos uma medida [semelhante] à da África do Sul, onde os partidos são obrigados a declarar [receitas] a partir de um determinado montante. Poderíamos adotar esse sistema para fiscalizar melhor [as fontes de financiamento], porque há sempre reclamações e acusações fortes.