CIP afirma que “Moçambique não está melhor"
17 de julho de 2017O Presidente moçambicano Filipe Nyusi completou, este fim de semana, dois anos e meio do seu mandato e aproveitou a data para fazer um balanço do seu trabalho. Num documento distribuído à imprensa, Filipe Nyusi mostrou-se "orgulhoso" do trabalho desenvolvido, desde o dia em que tomou posse, a 15 de janeiro de 2015, e evidenciou os progressos do país em áreas como a agricultura, saúde, educação, turismo e acessibilidades. No entanto, nem todos parecem partilhar da visão otimista do Presidente Nyusi.
Em entrevista à DW África, Edson Cortez, do Centro de Integridade Pública (CIP), afirma que dizer que, nestes dois anos e meio de governação de Filipe Nyusi, "o país melhorou e voltou aos carris, constitui uma falácia". Segundo este responsável, o único ponto positivo a apontar à governação de Nyusi é o "calar das armas". "Os passos que foram dados ao nível das negociações entre o Presidente Nyusi e o presidente do partido RENAMO é um dos poucos aspectos positivos da sua governação porque, contrariamente ao seu antecessor, Nyusi mostrou maior proatividade para resolver este assunto", deu conta.
De resto, o CIP entende que "Moçambique não está melhor e está a atravessar uma crise profunda". E Edson Cortez dá exemplos de alguns dos problemas atuais do país: "o setor privado reclama, cada vez, mais da crise financeira que o país está a atravessar, há maior desemprego, a contestação social tem vindo a aumentar. Algo que há muito tempo não víamos, as greves por parte de funcionários públicos, [voltaram a aparecer]. A questão da tensão político-militar que, pese embora tenha dado alguns passos, ainda não está bem definida".
Discurso motivador
Já o analista político Egídio Vaz encara o discurso positivo do Presidente moçambicano como uma forma de motivar o seu povo."[O Presidente] quis apresentar um espírito um pouco mais positivo aos moçambicanos, que já sabem que estão em situações difíceis", constatando, no entanto, que "Moçambique cresceu claramente pouco, apenas 1%" e que a "divulgação do relatório da Kroll também adensou o ceticismo em relação à forma como os negócios são feitos" no país.
Ainda assim, acrescentou o analista, são notórios alguns progressos. Para Egídio Vaz, "o feito mais louvável não são aqueles quilómetros de estrada ou, eventualmente, aqueles números que [o Presidente Nyusi] citou. O feito mais importante é aquilo que, constitucionalmente, ele deve ao povo moçambicano, que é garantir a paz e a segurança, e isso ele tem estado a cumprir”. Destaca ainda "a forma como está a ser conduzido o diálogo com os seus parceiros internacionais".
E as dívidas ocultas?
No documento conhecido este fim de semana, para além de frisar ter assumido "funções num momento difícil" para o país, Filipe Nyusi admitiu também que "existe ainda trabalho a fazer" em Moçambique. No entanto, o Presidente não fez qualquer referência ao caso das dívidas ocultas. Um facto que, aos olhos do CIP, não pode ser ignorado, uma vez que é, segundo a instituição, o que marca este dois anos de governação de Nyusi. "Não sei qual era o propósito do Presidente ao ignorar esse passo, talvez dar essa imagem otimista sobre o país na sua liderança, mas a realidade prática de Moçambique demonstra que estamos muito longe de ter feito avanços ao longos dos últimos dois anos e meio", acrescenta Edson Cortez.
Egídio Vaz tem outra opinião. O analista considera que não "seria bom" para um Presidente da República pronunciar-se sobre um processo judicial ainda a decorrer. "Tratando-se de um documento que já tem contornos judiciários, não julgo que nem aqui em Moçambique, nem na América ou na Alemanha, seria aconselhável ao Presidente da República, que é intitulado de órgão de soberania, pronunciar-se sobre um processo que ainda está sob investigação", dá conta.
Próximos dois anos e meio
Para o CIP, são "enormes” os desafios que o Presidente tem pela frente. Primeiro, explica Edson Cortez, "tem que trazer uma paz efetiva para o país, porque sem ela o desenvolvimento económico não será alcançado". O segundo, "é conseguir ter um desfecho que ajude a explicar e a trazer transparência ao que realmente aconteceu no processo de contração das dívidas ocultas”. Para o CIP, "se não houver grandes mudanças, o Presidente corre o risco de fazer cinco anos de um mandato muito difícil".
Já para Egídio Vaz, a prioridade de Nuysi para o tempo restante do seu mandato deverá ser, não só a manutenção da paz, mas também o desbloqueio internacional. "Existe um problema imediato a resolver que é prosseguir um acordo de assistência pelo Fundo Monetário Internacional, por via do qual os demais Estados que apoiam o Orçamento Geral do Estado também se poderão pronunciar", dá conta este analista.
"Meta é paz efetiva", diz Nyusi
Para além de ter feito um balanço positivo da primeira metade do seu mandato, no documento divulgado na sexta-feira (14.07), Filipe Nyusi debruçou-se também sobre o futuro."Se na primeira metade do meu mandato me dediquei a trazer Moçambique de volta aos carris do progresso, na segunda metade deste mandato, em simultâneo, quero empenhar-me em assegurar que os benefícios do nosso crescimento tenham impacto direto e sejam sentidos por cada um dos moçambicanos. Continuaremos a investir na saúde, educação, infraestruturas, turismo e agricultura, ao mesmo tempo que combatemos vigorosamente a corrupção e todas as suas manifestações", garantiu.
O Presidente moçambicano afirmou que o seu Governo continuará "a encorajar os investidores estrangeiros e potenciais parceiros a apostarem em Moçambique".
Nyusi disse ainda que "através de um diálogo franco, aberto e sem preconceitos com todas as forças vivas da sociedade, incluindo a RENAMO, temos conseguido uma paz relativa, rumo à consolidação de um ambiente de concórdia e reconciliação entre os moçambicanos. A nossa meta é uma paz efetiva e duradoura".