Novo Governo na Alemanha: novas políticas para África?
14 de março de 2018Angela Merkel foi reconduzida, esta quarta-feira (14.03), no cargo de chanceler da Alemanha pela quarta vez, com o voto da maioria absoluta do Bundestag, o Parlamento alemão, após reeditar o acordo de grande coligação entre conservadores e social-democratas.
Quase seis meses depois das eleições gerais, Merkel recebeu o apoio de 364 deputados dos 692 presentes e o voto contra de 315.
A votação pôs termo a 171 dias de impasse governamental - mais do dobro do anterior recorde -, criado após as eleições de setembro, em que os principais partidos perderam força política.
O novo Governo de coligação envolve os conservadores da União Democrata Cristã (CDU) e da União Social Cristã (CSU), bem como o Partido Social-Democrata (SPD), de centro esquerda, após meses de negociações difíceis.
28 menções a África
O continente africano não fica de fora dos planos do novo Governo alemão: é mencionado 28 vezes no acordo de coligação.
"Comparando com os acordos anteriores, África surge desta vez com mais frequência", diz o especialista em África Andreas Mehler, diretor do Instituto Bergstraesser Arnold em Friburgo, em entrevista à DW.
O compromisso com África vem no seguimento do ano passado: durante a presidência do G20, o Governo alemão apresentou dois programas ambiciosos para uma nova cooperação com o continente: o "Compact With Africa" e o "Plano Marshall para África". Mas, até agora, pouco foi feito neste sentido. Para o político da CDU Frank Heinrich, o acordo de coligação de 179 páginas prova que, desta vez, o Governo alemão fala a sério: "Como África é enfatizada tantas vezes no novo acordo, não temo que a questão caia por terra", considera.
O Governo estabelece as mesmas prioridades prometidas em 2017: com uma nova Lei de Investimento para o Desenvolvimento, promete levar mais PMEs (Pequenas e Médias Empresas) para o continente africano. E os seguros de risco para as empresas alemãs tendem a ser melhorados. A ajuda ao desenvolvimento também deverá sofrer alterações: "Temos de aprender como potenciar o desenvolvimento económico com a nossa política de desenvolvimento", prometeu recentemente a chanceler Angela Merkel.
Empresas e sociedade civil não estão impressionadas
Há muito que as associações de empresários pedem mudanças, mas ainda não aplaudem. Stefan Liebing, presidente da "Afrika Verein" (a associação das empresas alemãs com negócios no continente africano), alerta para a repetição dos erros do passado.
"A nova política para África deve ser concretizada o mais rápido possível", sublinha. Muitos empresários estão cautelosos, porque os governos anteriores quiseram atrair o setor privado para o continente africano, mas os planos não se tornaram realidade.
Há "muitas receitas antigas" no acordo de coligação, diz também Andreas Mehler. "Não se espera que as empresas alemãs façam fila em África em breve". Uma melhor proteção, por si só, não é suficiente para as empresas, diz o especialista em África: "As oportunidades no continente são limitadas, uma vez que a oferta de alta-tecnologia alemã, que é o que muitas empresas pretendem exportar, não correspondem às necessidades africanas".
A sociedade civil e a oposição também estão cautelosas - embora o Governo queira também aumentar a ajuda ao desenvolvimento -, uma vez que investir mais em África pode significar o aumento da despesa com a Defesa. Para já, estão previstos mais dois mil milhões de euros para as duas áreas e, segundo Uwe Kekeritz, porta-voz para a política de desenvolvimento dos Verdes, "não é claro o que é que vai acontecer".
"Não podemos seguir um crescimento na proporção de um para um, isso significa que a política de desenvolvimento vai aumentar tanto como os gastos militares. E não concordo com isso", sublinha.
Ministério do Desenvolvimento tem pouca influência
Também ainda não é claro se muitas outras promessas poderão ser cumpridas. Muitos dos planos para África têm o cunho do ministro do Desenvolvimento, Gerd Müller (CSU), que se mantém no cargo.
Müller já prometeu que o "Plano Marshall para África" será o ponto principal da nova "ofensiva africana" da Alemanha. O foco deverá estar nos programas para start-ups e PMEs, formação profissional e energias renováveis. O comércio entre África e Alemanha também deverá ser feito de forma mais justa – algo que os críticos pedem há muito.
Mesmo que Gerd Müller seja considerado "um fã" de África, planos como o "Plano Marshall para África" só podem ser implementados com outros ministérios, como o dos Assuntos Económicos e o do Ambiente. Algo que também está previsto no acordo de coligação.
"Acho que os grupos de trabalho inter-ministeriais são bons, mas no passado houve muitas divergências e confrontos entre grupos dos diferentes ministérios e isso é um problema", alerta Uwe Kekeritz.
Para além disso, o Ministério de Müller ocupa uma das últimas posições na hierarquia interna do Governo. No passado, outros ministérios adiaram ou bloquearam propostas do ministro do Desenvolvimento.
Nem uma palavra sobre o genocídio na Namíbia
Em termos de política externa, nos próximos anos, o foco alemão deve ser a África Ocidental. A Alemanha quer estar mais envolvida na região do Sahel, palco de instabilidade há vários anos devido ao extremismo islâmico e ao crime organizado. Nesta região estão algumas das principais rotas de trânsito de migrantes para a Europa.
No entanto, não se fala num outro aspeto da política alemã para África: o Governo está empenhado em trabalhar em conjunto com parceiros locais para lidar com os efeitos do colonialismo, mas não há uma indicação clara de que a Alemanha está disposta, tal como planeado, a pedir desculpa pelo genocídio na Namíbia, antiga colónia alemã. As negociações entre os dois governos, iniciadas em 2015, ainda não deram resultados. Na Namíbia, cresce a frustração perante a demora. Se o novo Governo alemão não conseguir concluir com êxito as negociações, poderá ver a sua imagem ameaçada, pelo menos na região.