Surto de ébola na RDC vai durar pelo menos mais seis meses
14 de novembro de 2018Peter Salama, médico-chefe dos serviços de emergência da Organização Mundial de Saúde (OMS), visitou as províncias de Kivu Norte e Ituri, na República Democrática do Congo (RDC), na semana passada. Esta terça-feira (13.11), em Genebra, na Suíça, o médico disse desconfiar que sejam os centros médicos improvisados na província de Kivu Norte o principal foco de contágio da doença.
Segundo este responsável, "existem em Beni várias centenas do que eles chamam de 'instalações de saúde tradicionalmente modernas' que não estão mapeadas, nem regulamentadas pelo Ministério da Saúde". Trata-se de instalações privadas que, acredita Peter Salama, "são um dos principais focos de transmissão da doença, podendo mais de 50% dos casos em Beni ter origem nestas instalações", diz. A agravar a situação, estão "as práticas de higiene e vacinação, "relativamente inseguras", entende este médico.
Beni, na província de Kivu do Norte, é a cidade congolesa mais afetada pela epidemia. O ébola é uma doença altamente contagiosa: transmite-se através do contacto com fluidos corporais.
Em três meses, o vírus já provocou a morte de 209 pessoas havendo, até agora, 333 casos confirmados. No fim de semana, o Governo congolês afirmou mesmo que a atual epidemia já ultrapassou, em número de contágios, o primeiro surto registado no país, em 1976.
Peter Salama disse ainda ser "muito difícil prever os prazos [para a extinção] de um surto tão complicado como este". "Existem várias "variáveis fora do nosso controlo", frisou o responsável da OMS. "Antevemos pelo menos mais seis meses antes de podermos declarar o fim desta epidemia. E isso pode mudar à medida que recebemos informações diariamente".
Diagnósticos errados
O médico considera ainda "muito provável" que alguns casos de ébola tenham sido mal diagnosticados e confundidos com malária, devido à semelhança dos sintomas iniciais. Por isso, a OMS tem investido na formação de grupos locais.
A organização tem estado a trabalhar "com todos os elementos dos membros da comunidade, tanto através de técnicas de mobilização em massa, como de técnicas individuais, de casa em casa", dá conta Peter Salama, acrescentando que o foco está cada vez mais em grupos de jovens e mulheres, pois "são figuras locais poderosas nos bairros" que ajudam a "formar a opinião pública". "Já vemos alguns sinais muito positivos", adianta.
Apesar de alguns congoleses suspeitarem dos estrangeiros e das organizações internacionais, muitos também acreditam na eficácia dos medicamentos. Entre os casos de contágio recentes encontram-se os de duas enfermeiras. São já 27 os agentes de saúde contaminados com o vírus. Três acabaram por morrer. Quase 27 mil pessoas já foram vacinadas na RDC, a maioria profissionais de saúde e crianças.
"Contexto díficil"
Ainda segundo Peter Salama, o atual surto de ébola na RDC é "possivelmente o contexto mais difícil" que a OMS encontrou, por causa das atividades de dois grupos armados de oposição no leste daquele país africano. A epidemia alastrou até perto da fronteira com o Uganda, para uma região que está sob controlo do grupo armado ADF. Os múltiplos ataques contra civis estão a dificultar a resposta sanitária. Para prevenir o alastramento da epidemia, o Uganda está a vacinar funcionários na fronteira.
Desde 1976, aquele país já foi atingida nove vezes pelo ébola.