12 casos de corrupção abalam rede diplomática de Angola
9 de dezembro de 2019As embaixadas de Angola em alguns países continuam a enfrentar várias dificuldades de ordem financeira. O Governo angolano diz que a falta de dinheiro nas missões diplomáticas não é novidade. Mas o problema não é apenas a crise que assola o país.
Segundo o ministro das Relações Exteriores, Manuel Augusto, em algumas embaixadas, a falta de verbas também se deve ao alegado desvio de fundos por parte de alguns chefes de missões diplomáticas.
Num encontro que manteve recentemente com os deputados, o governante revelou que o Ministério das Relações Exteriores de Angola (MIREX) está a ser abalado por vários casos de corrupção. Alguns já estão a ser investigados pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Um deles é o do cônsul de Angola no Congo Brazzaville. Segundo o Governo, o diplomata, cujo nome não foi revelado, desviou quase meio milhão de dólares do Estado e pôs-se em fuga. "O cônsul comunicou as autoridades em Luanda que o financeiro do consulado tinha desaparecido com o dinheiro do Estado, cerca 400 mil dólares, quando o mesmo dirigente tinha sido visto com o homem das finanças no banco congolês. O cônsul está desaparecido até agora. Há quem diga que foi para França", denunciou.
Queixas contra 12 diplomatas
No âmbito dos casos de corrupção, o MIREX apresentou cerca de 12 queixas contra diplomatas que delapidaram o erário. Entre os visados está também o ex-embaixador de Angola na Etiópia, Arcanjo Maria do Nascimento, exonerado do cargo no ano passado pelo Presidente da República, João Lourenço.
O antigo representante permanente do Estado angolano junto da União Africana (UA) chegou a ser detido este ano, preventivamente, depois de ter sido constituído arguido, por indícios de crimes de corrupção passiva. Agora, está em liberdade condicional.
O ministro fala também de um escândalo de corrupção registado na anterior gestão da embaixada de Angola no Quénia. "Era uma embaixada nova, acabada de abrir. E o embaixador arrendou literalmente a casa mais cara do Quénia. É a casa de um senador, um palacete a alguns quilómetros da cidade. Mas grave do que ser casa mais cara do Quénia, o embaixador não chegou a viver lá. O embaixador foi viver também num hotel mais caro do Quénia. Isso são factos, por isso, digo que é algo surreal."
De acordo com ministro, por causa das despesas com a casa e o hotel luxuoso, os funcionários ficaram oito meses sem salários. Entretanto, em função dos processos crime, muitos estão a devolver o dinheiro desviado das missões diplomáticas, segundo Manuel Augusto.
Angola "comprometida" perante investidores
Em declarações à DW África, o especialista em política internacional Nuno Agnelo afirmou que a denúncia do ministro representa rotura com a governação anterior.
O analista questiona o método de seleção dos diplomatas e afirma que os atos de corrupção nas embaixadas comprometem o país perante os investidores internacionais. "Nenhum investidor, com bom senso, investe num país onde os embaixadores, onde os diplomatas são corruptos. Se há corrupção nas embaixadas, é claro que o país internamente é também infestado pela corrupção. O que acontece nas embaixadas é puramente reflexo daquilo que acontece ao nível interno", critica.
Para o coordenador da Plataforma Cazenga em Ação (PLACA), Kambolo Tiaka Tiaka, já deviam estar detidos, uma vez que mancharam a imagem do Estado fora de Angola. "A Procuradoria-Geral da República já tem o trabalho facilitado. Os indiciados deviam ser chamados, deviam ser detidos e estar sob custodia da PGR. Não deviam estar em casa porque mancham a imagem do país no exterior", argumenta.
Fecho de embaixadas para reduzir gastos?
Anualmente, o Governo angolano gasta mais de 180 milhões dólares só com as missões diplomáticas. Nesta fase de dificuldades financeiras, a situação dos dinheiros para as despesas das embaixadas é um "fardo" pesado para o MIREX.
Kambolo Tiaka Tiaka defende o encerramento de algumas representações diplomáticas para reduzir os gastos. "É muito dinheiro. E é um país que hoje está a chorar, que hoje está a busca de mecanismos financeiros para poder minimizar a crise económica", diz.
O especialista em política internacional Nuno Agnelo também defende o encerramento de algumas representações, até por uma questão de interesse nacional. Situações como a do Quénia, por exemplo, onde os funcionários ficaram meses a fio sem salário, dão uma péssima imagem do país, afirma.
"Um funcionário diplomático sem salário, com fome, e sem condições para se manter lá fora, acaba por ser um alvo preferencial de outros interesses que queiram atingir os interesses angolanos e isso é muito delicado porque a diplomacia é o espelho do país lá fora, é o espelho da política externa", sublinha o analista. E se não há condições, defende ainda, "é mais seguro encerrar as embaixadas do que mantê-las com todas as carências e necessidades que se conhecem, colocando em risco o interesse nacional."