Pequenos agricultores têm os direitos humanos violados em Moçambique
19 de novembro de 2012
Durante o final de semana (17. - 18.11), em Berlim, especialistas estiveram reunidos no seminário organizado pelo Círculo de Coordenação Moçambique, sobre direitos humanos no país oriental africano. A exploração dos agricultores pelo mercado internacional esteve no centro do debate.
O seminário "Recursos Humanos – Direitos, Consequências da Extração de matéria-prima em Moçambique" debateu os direitos humanos sob diversas perspectivas. Um dos aspectos enfatizados foi o das violações dos direitos humanos dos camponeses moçambicanos em consequência do chamado landgrabbing (compra de vastas extensões de terra, usualmente em países em desenvolvimento).
"[Os camponeses] perdem a terra deles, perdem os direitos à vida familiar, à educação, à alimentação própria", explica Peter Steudtner, membro do conselho diretivo do Círculo de Coordenação Moçambique, que organizou o evento. "Quando querem produzir para o mercado internacional, quando não conseguem vender ou não conseguem vender ao preço prometido, não conseguem pagar a escolarização dos filhos deles. Eles não conseguem comprar os alimentos no mercado normal porque não ganharam o suficiente", acrescenta.
Assim, aqueles agricultores que optam pelo cultivo de produtos para a exportação, como o algodão e o tabaco, por exemplo, tornam-se reféns do mercado internacional. A safra é negociada antes de iniciar o cultivo, mas não é feito um contrato entre as partes que garanta a compra pelo preço anteriormente combinado, o que acaba prejudicando os pequenos produtores, segundo Peter Steudtner: "Tem a colheita e os intermediários podem dizer: 'há tanta afluência de algodão no mercado... vamos diminuir o preço de compra'", explica.
"E assim eles ficam sem o lucro que esperaram para devolver os créditos para as sementes. Ficam com menos que antes, ainda mais porque utilizaram 90% da sua força de trabalho para a produção de algodão e só 10% para a produção dos alimentos". Além disso, segundo Steudtner, a produção precisa atender aos restritivos padrões internacionais para ser competitiva, o que dificulta ainda mais a negociação.
As bananas, por exemplo, têm que ter um certo tamanho e uma certa curvatura, assim como o tabaco, disse Steudtner à DW África. "Isso significa que os pequenos produtores quase nem têm chance de vender o material deles, porque não têm as condições. Na maioria, eles produzem em pequenas plantações, que têm uma diversificação da forma do produto 'normal', mas para o mercado global isso 'não pode ser'. [Então] eles só conseguem vender uma parte da colheita e não podem usar [o algodão] no mercado interno porque não há produção de têxteis", constata o membro do Círculo de Coordenação Moçambique.
Cultivar alimentos para respeitar direitos humanos
Para Peter Steudtner, o primeiro passo para para diminuir as violações dos direitos humanos dos agricultores moçambicanos estaria numa mudanca de foco da produção. O especialista acredita que Moçambique deveria apostar no cultivo de alimentos para abastecer em primeiro lugar as demadas internas, nas pequenas machambas. A ideia é, no mínimo, não ter um "déficit alimentar". "Eles produzem e só têm alimentação por oito meses. Nos outros quatro meses [do ano], eles passam fome", afirma Steudtner, lembrando que "80% da população [moçambicana] vive no campo e depende da produção de alimentação".
A discussão dos direitos humanos dos camponeses moçambicaos ganhou novo fôlego em Berlim. Falou-se também da responsabilidade de quem adquire os produtos mundo afora.
Assim, os consumidores também teriam que estar atentos às condições de produção das matérias-primas usadas nas mercadorias que são adquiridas por eles, como explica Peter Steudtner, membro do conselho diretivo do Círculo de Coordenação Moçambique. "Temos que ver bem que produtos estamos a importar, de onde chegam e que consequências na raiz da produção, por assim dizer, isso pode ter. Se vamos comprar têxteis, quero saber de onde chega este algodão e se este algodão está produzido com preços com que os pequenos produtores conseguem financiar a própria vida através do cultivo", afirma.
Autora: Cristiane Vieira Teixeira (Berlim)
Edição: Renate Krieger/António Rocha