Poderá África reverter a lógica da dependência farmacêutica?
3 de maio de 2021África depende fortemente das importações de produtos farmacêuticos e médicos especialmente da China e da Índia. O continente compra atualmente mais de 80% do que consome neste setor. Existem empresas farmacêuticas em países como a África do Sul, o Quénia e o Egito, ainda não têm um papel significativo.
Para a perita da União Africana, Janet Byaruhanga, o volume de produtos importados "não é sustentável”. A pandemia de Covid-19 revelou que isto é uma enorme desvantagem.
Desde o início da pandemia, as cadeias de abastecimento têm sofrido quebras. E mesmo antes da Covid-19, os políticos africanos já queriam reduzir a dependência das farmacêuticas internacionais.
Em 2007, os ministros da Saúde da União Africana encomendaram um estudo para melhorar a produção de medicamentos no continente, mas pouco aconteceu desde então.
Grande oportunidade
Para Arthur Minsat, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, a demanda por produtos farmacêuticos no continente dobrou na última década - um aumento muito acima dos padrões globais - e isso representaria uma enorme oportunidade para as empresas africanas acederem ao mercado do continente.
"Hoje, 57% das exportações vão para países africanos. É uma boa notícia, porque o enorme potencial de transformação local está a ser aproveitado e pode ser um catalisador para um maior desenvolvimento”, avalia Minsat.
Em 2017, a venda de produtos médicos no continente foi contabilizada em 29 mil milhões de dólares, quase seis vezes mais do que uma década antes, de acordo com um estudo da empresa Goldstein Research. Espera-se que a procura continue a aumentar até 2030.
Principais obstáculos
Mas as empresas africanas praticamente não beneficiam deste boom. Segundo Janet Byaruhanga, da União Africana, entre os desafios principais para o desenvolvimento do setor no continente estão falta de acesso a crédito e de tecnologia moderna para investigação, pequena dimensão dos mercados e falta de estabilidade das cadeias de abastecimento.
"O maior obstáculo para nós é a concorrência, porque as importações são muito mais baratas. Temos custos elevados que ditam o nosso trabalho. Incluem regulamentos, impostos e salários. É por isso que os nossos produtos são mais caros”, explica Beena Mahida, médica que trabalha na farmacêutica Cosmos Limited, no Quénia, a principal empresa do género na África Oriental.
A Comunidade dos Países da África Oriental, da qual o Quénia é membro, quer expandir a produção local até 2027. Mahide diz que há apoio e medidas para incentivar a produção local na África Oriental. "O registo foi simplificado. Podemos registar os nossos produtos em conjunto noutros países, depois fazer as inspeções e distribuir os medicamentos”, cita Mahida.
Ambição continental
Mais cooperação entre os países do continente seria o caminho certo a seguir também na opinião de Harald Zimmer, da Associação Alemã de Empresas Farmacêuticas Baseadas em Investigação.
A cooperação regional pode tornar a produção local de vacinas e medicamentos economicamente mais compensadora, porque quanto maiores forem os volumes de produção, mais barata será a produção da embalagem individual. A produção local deve compensar a longo prazo.
Em abril, o Centro Africano de Controlo de Prevenção de Doenças da União Africana anunciou que o continente quer reduzir a importação de vacinas dos atuais 99% para 40% nos próximos 20 anos. Para isso, diz o CDC, além do reforço da capacidade de produção local, será necessário um reforço dos centros de investigação africanos, bem como a definição de regulamentação e a criação da Agência Médica Africana.