O adeus a Mário Soares
10 de janeiro de 2017Aplausos, rosas amarelas e cravos vermelhos marcaram o cortejo fúnebre de Mário Soares. As cerimónias com honras de Estado do antigo Presidente da República Portuguesa culminaram no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, onde o armão com a urna de Soares chegou ao meio da tarde, debaixo de fortes aplausos.
No cemitério, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, entregou aos filhos de Mário Soares a bandeira nacional que cobria a urna.
Durante a tarde, o cortejo fúnebre passou em frente ao Palácio Nacional de Belém, à Assembleia da República e à Fundação Mário Soares, bem como em frente à sede do Partido Socialista, no Largo do Rato.
Foram muitos os portugueses que estiveram nas ruas de Lisboa para ver passar a urna de Soares. A Agência Lusa conta que um dos momentos mais emotivos foi no Largo do Rato, com a multidão a gritar “PS, PS”, “Soares é fixe, Soares é fixe" ou "Soares amigo, o povo está contigo".
A urna com os restos mortais do ex-Presidente socialista, falecido no passado sábado (07.01), esteve em câmara ardente no Mosteiro dos Jerónimos, onde decorreu uma sessão solene evocativa em sua homenagem.
Lusofonia no adeus a Soares
Políticos de todas as cores partidárias têm enaltecido o contributo de Soares para a conquista da liberdade e a afirmação da democracia em Portugal.
O Presidente angolano, Eduardo dos Santos, endereçou uma mensagem de pesar ao homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa, recordando a figura de Mário Soares como "uma referência incontornável". Luanda enviou a Lisboa o presidente da Assembleia Nacional de Angola, Fernando da Piedade Dias dos Santos, para participar no funeral.
Uma delegação do principal partido da oposição angolana, União Nacional para a Independência de Angola (UNITA), chefiada pelo seu líder, Isaías Samakuva, está igualmente em Lisboa desde segunda-feira (09.01), tendo-se associado às cerimónias. A comitiva, que integra Alcides Sakala, responsável pelas relações internacionais, esteve no Mosteiro dos Jerónimos a render tributo ao histórico socialista.
Os Presidentes José Mário Vaz, da Guiné-Bissau, e Carlos Fonseca, de Cabo Verde, foram algumas das personalidades dos países africanos de língua portuguesa que participaram nas cerimónias fúnebres do ex-chefe de Estado português.
Símbolo da democracia
Pelo Mosteiro dos Jerónimos, onde o corpo do antigo Presidente português esteve em câmara ardente, passaram vários cidadãos que quiseram prestar uma última homenagem a Mário Soares.Para Rui Santos, ouvido pela DW, o antigo governante português "foi responsável e ajudou imenso na democratização, na estabilidade económica e política do país". "Foi um símbolo que é reconhecido internacionalmente e penso que representa o fim de uma era. Ele vai ficar na História", acrescentou.
António Simões, que esteve em África, nomeadamente na Guiné-Bissau e em Moçambique, nota que Mário Soares "foi um contributo muito bom na medida em que a descolonização não devia ser feita de outra maneira, sem dúvida, devido às condições nas Forças Armadas que já estavam saturadas".
"É verdade que muitas vezes pode haver erros e há sempre pessoas prejudicadas, mas realmente nós fomos os últimos a descolonizar e tinha que ser mesmo assim, não podia ser de outra maneira. Mário Soares é uma referência para mim, é uma pessoa que realmente vai deixar muitas saudades", afirma António Simões.
Ricardo Mota, nascido no período da ditadura encabeçada por Salazar e que esteve na lista dos militares que rumaram em direção ao Ultramar para a guerra colonial, defende que Mário Soares "estava no sítio certo quando acontece o 25 de abril [de 1974]"."Na minha opinião, graças não sei a quem, era Mário Soares que estava naquela hora, naquele local, para decidir o que fazer com as ex-colónias [em África]. Portugal estava com meios económicos muito fragilizados". O português lembra que "com ajuda internacional, é evidente, conseguiu-se trazer aqueles portugueses, que se lá ficassem, em fogo cruzado, seria dramático". Para Ricardo Mota, Mário Soares foi o timoneiro da democracia portuguesa.
Anildo Monteiro, cabo-verdiano há mais de 40 anos em Portugal, foi uma das pessoas que quis também prestar uma última homenagem a Mário Soares que, considera, "foi um grande Presidente".
"Ele lutou muito para hoje termos voz ativa para expressar o que a gente sente. Há muitos que não concordam mas para mim foi um dos melhores homens para a nossa independência, de Cabo Verde e das outras colónias", conclui Monteiro, que saiu de Cabo Verde, em 1971, para escapar à guerra na Guiné-Bissau.
Singular humanista, diz Rebelo de Sousa
No final da cerimónia evocativa, o Presidente da República portuguesa recordou Mário Soares como um "singular humanista e construtor de portugalidade". Para Marcelo Rebelo de Sousa, como "um homem que fez história", Mário Soares merecia ser homenageado num lugar como o Mosteiro dos Jerónimos.
António Costa fez questão de se juntar à sessão evocativa de homenagem ao líder histórico socialista. De visita oficial à Índia, o primeiro-ministro português, através de uma mensagem em vídeo, recordou o antigo Presidente como "o rosto e a voz da liberdade" em Portugal.